AGRICULTURA FAMILIAR, PLURIATIVIDADE E TURISMO
RURAL: REFLEXÕES A PARTIR DA REGIÃO SERRANA FLUMINENSE
Gláucio José
Marafon
Professor do
Departamento de Geografia/UERJ
glauciomarafon@hotmail.com
Miguel Ângelo
Ribeiro
Professor do
Departamento de Geografia/UERJ
mikisi@globo.com
Resumo
A agricultura familiar se afirma como uma categoria expressiva no meio
rural brasileiro. Na busca de sua reprodução e sobrevivência tem apresentado
características como trabalho em tempo parcial, em face de diminuição da jornada
de trabalho favorecida pela incorporação de tecnologias de produção, e a
liberação de membros da família para exercerem outras atividades, agrícolas e
não agrícolas, complementando a renda familiar, fenômeno esse denominado de
pluriatividade e que se expandiu, entre outros fatores, pela revalorização do
mundo rural e nas atividades associadas aos setores industriais e de serviços,
que passaram a absorver, em suas atividades, trabalhadores oriundos de unidades
de produção familiar.
Posto isto, o objetivo dessa pesquisa é o de apresentar algumas
características sobre as abordagens da produção familiar e suas estratégias de
sobrevivência, seja através de empregos agrícolas ou não agrícolas, e papel que
o turismo rural vem desempenhando nesse processo. Nossa reflexão está centrada a
partir da Região Serrana Fluminense, resultado de nossas investigações sobre
transformações que estão ocorrendo em seu espaço rural.
A metodologia empregada para atingir o objetivo proposto consistiu na
leitura de autores que tratam da análise da produção familiar, a exemplo de
Chaynov, Mendras, Caio Prado Junior, Abramoway, Lamarche e Fernandes, entre
outros; da pluriatividade como estratégia de sobrevivência no meio rural a
partir de unidades familiares de produção, tendo por autores entre outros: Arf,
Carneiro, Kageyama, Scheneider, Anjos, Graziano da Silva e Del Grosssi; e das
atividades turísticas, mais precisamente o turismo rural, tendo como estudiosos
entre outros: Silva, Portuguez, Rodriguez e Mendonça. Quanto à operacionalização
da pesquisa foram realizados trabalhos de campo na Região Serrana Fluminense,
mais precisamente na Rodovia Teresópolis-Nova Friburgo (RJ-130), conhecida como
circuito Terê-Fri, na qual identificamos o fenômeno da pluriatividade.
A Região Serrana destaca-se no território fluminense com o predomínio da
produção de hortigranjeiros em pequenas propriedades, na qual a pluriatividade é
adotada como alternativa de fonte de renda pelos agricultores. Muitos, além de
realizarem suas funções na propriedade agrícola, exercem atividades
não-agrícolas, como caseiros, motoristas, empregados domésticos, etc. Destarte,
o espaço rural fluminense se transforma em decorrência da valorização de seus
aspectos naturais, e a manutenção da produção agrícola familiar se torna
importante para a disseminação da imagem do espaço rural e natural vendido ao
turista.
Introdução
A agricultura familiar se
afirma como uma categoria expressiva no meio rural brasileiro. Na busca de sua
reprodução e sobrevivência tem apresentado características como trabalho em
tempo parcial, em face de diminuição da jornada de trabalho favorecida pela
incorporação de tecnologias de produção, e a liberação de membros da família
para exercerem outras atividades, agrícolas e não agrícolas, complementando a
renda familiar, fenômeno esse denominado de pluriatividade e que se expandiu,
entre outros fatores, pela
revalorização do mundo rural e nas atividades associadas aos setores
industriais e de serviços, que passaram a absorver, em suas atividades,
trabalhadores oriundos de unidades de produção familiar.
Posto isto, o objetivo dessa pesquisa é o de apresentar algumas
características sobre as abordagens da produção familiar e suas estratégias de
sobrevivência, seja através de empregos agrícolas ou não agrícolas, e papel que
o turismo rural vem desempenhando nesse processo. Nossa reflexão está centrada a
partir da Região Serrana Fluminense, resultado de nossas investigações sobre
transformações que estão ocorrendo em seu espaço rural.
I. O debate sobre a produção
familiar
A reflexão sobre a produção familiar remonta a autores clássicos como
Chayanov (1974), Mendras (1976), Caio Prado Junior (1979), Guimarães (1979),
entre outros e, retomada nos anos 1990 com contribuições de Abramovay (1992),
Wanderley (1994, 2000), Lamarche (1998), Fernandes (2002), entre
outros.
Existe consenso que a produção familiar se caracteriza pelo trabalho
familiar na exploração agropecuária e pela propriedade dos meios de produção e
para Wanderley (1999) a agricultura familiar se constitui na atualidade em um
conceito genérico, que incorpora uma diversidade de situações específicas e
particulares e nas quais o campesinato corresponde a uma dessas formas
particulares dessa agricultura.
Assim, a agricultura de propriedade familiar é caracterizada por
estabelecimentos em que a gestão e o trabalho estão intimamente ligados, ou
seja, os meios de produção pertencem à família, e o trabalho é exercido por
esses mesmos proprietários em uma área relativamente pequena ou média.
A concepção que prioriza a agricultura familiar como unidade de análise
centra-se nos estudos da FAO/INCRA (1994), que divide a exploração agrícola em
modelo patronal e familiar (Quadro 1)
e do estabelecimento do Programa Nacional de Produção Familiar – PRONAF.
Objetiva-se estabelecer diretrizes e ações que levem ao desenvolvimento rural e
a integração dos produtores familiares ao mercado e para tanto realiza uma
classificação dos agricultores familiares brasileiros (Quadro 2), distinguindo
três categorias a saber: consolidados, em transição e periféricos ou de
subsistência, segundo Molina Filho (1979) e FAO/INCRA
(2000).
Quadro
1: Diferença entre propriedades Patronais e Familiares.
Patronal |
Familiar |
• Completa separação entre
gestão e
trabalho.
• Organização
centralizada.
• Ênfase na
especialização.
• Ênfase nas práticas
padronizáveis.
• Predomínio do trabalho
assalariado.
• Tecnologias dirigidas à
eliminação das
decisões “de terreno” e “de
momento”. |
• Trabalho e gestão
intimamente
relacionados.
• Direção do processo
produtivo diretamente
assegurada pelos proprietários
ou
arrendatários.
• Ênfase na
diversificação.
• Ênfase na durabilidade dos
recursos e na
qualidade de
vida.
• Trabalho assalariado
complementar.
• Decisões imediatas,
adequadas ao alto
grau de imprevisibilidade do
processo
produtivo. |
Fonte: Veiga,
2001.
Quadro 2: Classificação dos Agricultores
Familiares.
Consolidados |
São produtores considerados empresários do setor,
com boa liderança nas comunidades, buscam assistência técnica e
creditícia, possuindo bom poder de análise e gerenciamento. São
propriedades geralmente menores de 100 ha com concentração próximo a 50
ha. |
Em Transição |
São produtores de menor esclarecimento que os
consolidados, buscam em menor intensidade a assistência técnica e
creditícia, possuindo médio poder de análise e gerenciamento. São
propriedades geralmente menores de 100 ha com concentração próximo a 20
ha. |
Periféricos ou de
Subsistência |
A utilização do crédito rural é nula ou
incipiente, pois não possuem viabilidade econômica para ter acesso a ele.
Geralmente tem dificuldades quanto ao gerenciamento da propriedade. Também
considerado agricultor que mais se aproxima do camponês tradicional, onde
a luta pela terra e contra as perversidades do capitalismo se faz
presente. São propriedades geralmente menores de 50 ha com concentração
abaixo de 20 ha. |
Fonte: FAO/ INCRA
2000
Os dois primeiros são produtores com maiores desenvolturas no mercado,
onde a busca por assistência técnica e crédito ocorrem com maior freqüência.
Neste caso, o uso de média/alta tecnologia (máquinas, insumos, defensivos etc) é
inevitável, sendo considerada uma agricultura dinâmica e de trabalhadores
“qualificados” de acordo com o padrão capitalista. Esses agricultores também
obtêm bons rendimentos de produtividade e lucro, sendo os modelos mais próximos
de uma empresa rural familiar, contudo, inseridos em todos os padrões de
agricultura familiar seguido pelo PRONAF.
O terceiro grupo, de agricultores periféricos ou de subsistência, são
aqueles onde a utilização do crédito é praticamente nula, sendo propriedades de
baixa tecnologia e produtividade. Ressaltamos assim que este modelo de
agricultor é o que mais se aproxima do camponês tradicional, visto que não
mantém uma “dependência externa” e utiliza métodos tradicionais, com sua
produção voltada para satisfazer as necessidades da família. A luta pela terra
também é uma preocupação constante desse produtor rural, que sobrevivendo muitas
vezes como trabalhador sem-terra, é obrigado a ocupar as terras pertencentes ao
outro extremo da sociedade rural, o latifúndio.
Para compreender a problemática que envolve a questão da luta pela terra
no século XX, devemos considerar que durante os anos de 1960 a 1980 predominou
no Brasil um modelo de desenvolvimento econômico baseado na substituição de
importações, no qual o objetivo era desenvolver a indústria e eliminar as
relações “arcaicas” da agricultura. Esse processo ficou conhecido como
“modernização da agricultura” e nele ocorreram modificações significativas na
forma de produzir. Estas transformações, sobretudo as ligadas a alteração da
base técnica de produção, estão inseridas em um movimento de mudanças
significativas em nível econômico e territorial (MARAFON, 1998).
A corrente que centra sua análise na concepção da existência do
campesinato tem em Fernandes (2002) um defensor e em sua pesquisa Agricultura Camponesa e/ou Agricultura
Familiar resgata o conceito de camponês e explica que o uso do conceito de
agricultura familiar muitas vezes é
supérfluo e de grande força teórico-política. Neste sentido, o autor
argumenta:
Em uma leitura atenta dos trabalhos acadêmicos pode-se observar que os
pesquisadores que utilizam o conceito de agricultura familiar com consistência
teórica, não usam o conceito de camponês. Já os pesquisadores que usam o
conceito de camponês, podem chamá-los de agricultores familiares, não como
conceito, mas como condição de organização do trabalho. Da mesma forma, ao se
trabalhar com o conceito de camponês, pode-se utilizar as palavras: pequeno
produtor e pequeno agricultor. Todavia, como existem muitos trabalhos que
utilizam essas palavras como equivalentes do conceito de agricultura familiar, é
necessário demarcar bem o território teórico.
e acrescenta que:
A organização do trabalho familiar no campo
existe desde os primórdios da história da humanidade. Em seu processo de
formação, a organização do trabalho camponês realizou-se em diferentes tipos de
sociedade: escravista, feudal, capitalista e socialista. No capitalismo, a sua
destruição não se efetivou conforme prognosticado, porque sua recriação acontece
na produção capitalista das relações não capitalistas de produção e por meio da
luta pela terra e pela reforma agrária. Assim, na não realização da destruição
efetiva do camponês, tenta-se refutar o conceito.
Em suas obras, Fernandes (2002) demonstra que
a figura do camponês caminhou por alguns sistemas de organização da vida social
e sobrevive até os dias de hoje – com relações capitalistas e não-capitalistas
de produção – principalmente dentro dos movimentos sociais, como é o caso do MST
– Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. O autor opõe-se assim à idéia de
que os agricultores familiares representam o novo, o moderno e o progresso; e os
camponeses, o velho, o arcaico e o atrasado.
O autor considera ainda que o campesinato se
reproduz no interior do capitalismo e se constitui como uma classe social deste
modo de produção. Segundo Marques (2002), o campesinato não é apenas um setor da
economia, uma forma de organização da produção ou um modo de vida. Este pode ser
entendido como uma classe social que ora serve aos interesses capitalistas, ora
lhes é contraditória. Dessa maneira, se por um lado o mercado domina o
campesinato, por outro, ele não o organiza.
Para Wanderley (1999), a agricultura familiar é um conceito genérico, que
inclui uma diversidade de situações específicas e particulares; ao campesinato
corresponde uma dessas formas particulares da agricultura familiar, que se
constitui enquanto um modo específico de produzir e de viver em
sociedade.
A autora considera que o campesinato tradicional “tem particularidades
que o especificam no interior do conjunto maior da agricultura familiar e que
dizem respeito aos objetivos da atividade econômica, as experiências de
sociabilidade e à forma de sua inserção na sociedade global” (WANDERLEY, 1999,
p. 23).
O debate entre essas duas concepções foi sintetizado por Germer (2002) em
interessante artigo denominado “A irrelevância prática da agricultura “familiar”
para o emprego agrícola”, no qual sinaliza que a denominação de agricultura
familiar deriva da concepção norte americana de produção familiar, na qual “ o
chamado produtor “familiar” representava o pequeno produtor ousado, o homem da
fronteira, o pequeno industrial inovador e assim por diante, representado na
agricultura pelo farmer” ( p. 48), e
a de campesinato deriva da concepção européia de produção familiar baseado em
Chayanov, no qual a produção familiar é vista como “ dotada de uma lógica
própria e por isso capaz de resistir “a transformação capitalista” (p.47). Ainda
de acordo com Germer (2002) a
concepção norte americana passa a prevalecer a partir dos anos noventa,
no Brasil, enquanto a concepção
européia predominou nos anos setenta e oitenta.
Sobre esse debate concordamos com Wanderley (1999) quando afirma que a
agricultura familiar é um conceito genérico e que o campesinato corresponde a
uma das formas da agricultura familiar.
A valorização do mundo rural e as transformações que têm ocorrido nas
unidades familiares de produção, como a diminuição do tempo destinado às
atividades agrícolas, a diminuição da renda agrícola e a busca de outras
atividades para complementação da renda, o retorno para as áreas rurais de
pessoas oriundas do urbano, sobretudo aposentados, que passam a se dedicar não
somente a atividades agrícolas, tem levado a uma busca de caracterização desses
fenômenos, e que genericamente tem sido denominados de unidades familiares de
produção pluriativas. Inúmeros estudos sobre esse fenômeno, podem ser
mencionados, entre outros, destacamos Lamarche (1984), ARF (1984), Shucksmith et al (1991), Carneiro
(1998), Kageyama (1998) Teixeira (1998) , Schneider (1999, 2003) e Anjos
(2003).
II. A pluriativiade como estratégia de
sobrevivência no meio rural.
A pluriatividade remete a um fenômeno no qual os componentes de uma
unidade familiar executam diversas atividades com o objetivo de obter uma
remuneração pelas mesmas, que tanto podem se desenvolver no interior como no
exterior da própria exploração, através da venda da força de trabalho familiar,
da prestação de serviços a outros agricultores ou de iniciativas centradas na
própria exploração – industrialização em nível da propriedade, turismo rural,
agroturismo, artesanato e diversificação produtiva – que conjuntamente impliquem
no aproveitamento das potencialidades existentes na propriedade e/ ou em seu
entorno (ANJOS, 2003). A pluriatividade, portanto, não se trata de um fenômeno
conjuntural, mas o resultado de um amplo processo de transformação da
agricultura, em correspondente sincronia com a dinâmica da economia em geral e
no marco da profunda reestruturação que atravessa o modo de produção capitalista
(ANJOS, 2003).
Este fenômeno não representa uma situação inteiramente nova no modo de
funcionamento das formações sociais e econômicas agrárias. Podemos lembrar os
estudos de Kautsky e Chayanov que se referem aos “trabalhos acessórios” e às
“outras atividades não-agrícolas” como formas complementares de obtenção de
renda e inserção econômica de pequenos proprietários.
Dessa forma, a noção de pluriatividade vem sendo utilizada para descrever
o processo de diversificação que ocorre dentro e fora da propriedade, bem como
para apontar a emergência de um conjunto de novas atividades que tomam lugar no
meio rural. De acordo com Fuller apud Schneider (1999,
p.367),
A pluriatividade permite reconceituar a
propriedade como uma unidade de produção e reprodução, não exclusivamente
baseada em atividades agrícolas. As propriedades pluriativas são unidades que
alocam trabalho em diferentes atividades, além da agricultura familiar
[...].
Muitas propriedades possuem mais fontes de renda do que locais de
trabalho, obtendo diferentes tipos de remuneração. A pluriatividade, portanto,
refere-se a uma unidade produtiva multidimensional, onde se pratica a
agricultura e outras atividades, tanto dentro como fora da propriedade, pelas
quais são recebidos diferentes tipos de remuneração.
Alentejano (1999) afirma que a pluriatividade é mais adequada como
instrumento de análise da dinâmica agrícola, pois como a agropecuária não exige
um tempo integral de trabalho, a sazonalidade do trabalho agrícola permite a
combinação de atividades fora das propriedades rurais.
Na concepção de Graziano da Silva & Del Grossi (2002) o conceito de
pluriatividade permite juntar as atividades agrícolas com outras atividades que
gerem ganhos monetários e não monetários, independentemente de serem internos ou
externos à exploração agropecuária.
Ainda de acordo com estes dois autores, a pluriatividade incorpora os
conceitos de diversificação produtiva e de agricultura em tempo parcial, sendo
consideradas todas as atividades exercidas por todos os membros dos domicílios,
inclusive as ocupações por conta própria, o trabalho assalariado e não
assalariado, realizado dentro e/ou fora das explorações agropecuárias. Desse
modo, a renda agrícola vem sendo cada vez mais insuficiente para a manutenção
das famílias. A agricultura está se
convertendo cada vez mais em uma atividade de tempo parcial, o que corresponde
cada vez menos pela renda e pelo tempo de ocupação da família na
agricultura.
A diversificação das fontes de renda e a combinação de atividades
agrícolas e não-agrícolas tem possibilitado à população do meio rural, elevar
seu poder aquisitivo, "passando a demandar uma variada gama de bens de
consumo”
(SCHENEIDER ,1999, p.174).
Entre as diversas possibilidades que se manifestam no espaço rural e que
possibilitam a complementação de renda nas unidades familiares de produção
encontramos as atividades associadas à prática do turismo rural, que vem se
expandindo cada vez mais no território brasileiro, e que tem sido estudadas
entre outros por, Silva et al. ( 1998),
Portuguez (1998), Almeida e
Riedl (2000), Rodrigues et al. (2001),
Riedl et al (2002), Mendonça
et al. (2002) e Silva e Almeida ( 2004).
III. O turismo rural como possibilidade de
complementação de renda para as unidades familiares de
produção.
O desenvolvimento de atividades turísticas no espaço rural está associado
ao processo de urbanização que ocorre na sociedade e no transbordamento do
espaço urbano para o espaço rural (GRAZIANO DA SILVA, 1997), e para esse autor
“novas” formas de ocupação passaram a proliferar no campo. Entre elas são destacadas: conjunto de
profissões tidas como urbanas (trabalhadores domésticos, mecânicos, secretárias
etc); moradias de segunda residência; atividades de conservação; áreas de lazer
(hotéis-fazenda, fazenda hotéis, pesque-pague etc). Essas “novas” atividades
demandaram um numero crescente de pessoas para dar sustentação à expansão das
atividades turísticas no espaço rural, o que possibilitou que os membros das
famílias, liberados das atividades rotineiras da exploração agrícola, pudessem
ocupar as vagas geradas na expansão do turismo rural.
Na literatura encontramos os anos 1980 como sendo o marco inicial da
exploração do turismo rural no Brasil. Nos anos 1990, com a
intensificação das atividades no espaço rural e com a crescente valorização da
natureza, tivemos a expansão dessas práticas no meio
rural.
As atividades associadas ao turismo rural têm contribuído para a
complementação da renda familiar das unidades de produção, familiar ou não, pois
o seu incremento gera a demanda por novos postos de trabalho, além de contribuir
na melhoria da logística que proporciona suporte ao fluxo de turistas. A
EMBRATUR (1994) considera que o turismo rural inclui todas as atividades –
alternativos, doméstico, agroturismo, turismo - organizado para e pelos
habitantes do país e é “compreendido como sendo toda maneira turística de
visitar e conhecer o ambiente rural, enquanto se resgata e valoriza a cultura
regional” (MENDONÇA et al. 2002). O turismo rural designa atividades diversas
como, hotéis-fazenda, fazenda hotéis, agroturismo, turismo de aventura, e que
Rodrigues et al. (2001) classifica como tradicional (de origem agrícola,
pecuária e colonização) e contemporâneo (hotéis fazendas, spas rurais, segunda
residência). Cavaco (2001) faz uma
importante observação ao afirmar que o turismo em “espaço rural tem pouco
significado em termos de turismo e seus efeitos econômicos”
(p.28,29).
A constatação da referida autora é um item importante para reflexão uma
vez que nos leva a indagar até que ponto os agricultores familiares se
beneficiam dos resultados dessas atividades de turismo no espaço rural na
atualidade? As suas atividades são somente uma possibilidade de uma “nova”
ocupação, que permite sua inserção no mercado de trabalho, através de ocupações
como diaristas, caseiros, jardineiros etc? São atividades que complementam a
renda familiar, mas efetuadas fora de sua propriedade em hotéis-fazenda,
fazenda-hoteis e nas áreas que proliferam as casas de segunda residência, e que
caracteriza o turismo rural contemporâneo e de modo diferente do que ocorre com
o turismo rural tradicional, no qual o turista vivencia as atividades
desenvolvidas na propriedade rural.
No entanto, o turismo rural no Brasil não está livre de problemas como
apontam Mendonça et al. (2002) e entre eles está a falta de planejamento e
gestão, baixa capacidade econômica da população, dificuldade de acesso a
informações. É necessário uma melhor capacitação profissional e políticas de
estímulo a essa prática no território brasileiro. Acrescentaríamos ainda a
necessidade de inclusão de forma mais efetiva dos agricultores familiares, além
da capacitação efetuada pelos técnicos da EMATER, como do estado do Rio de
Janeiro, na orientação de desenvolvimento de artesanato e doces
caseiros.
Destarte, no nosso entendimento, o turismo rural se afirma como mais uma
alternativa que se coloca para os agricultores familiares venderem sua força de
trabalho e complementar sua renda reforçando o caráter pluriativo das unidades
familiares de produção e inseridos no processo de produção do espaço, no qual,
de acordo com Lefebvre (1999), estaríamos sob o signo de uma sociedade urbana, e
que essa urbanização estruturaria o território, e que Santos (1993) aponta como
passagem da urbanização da sociedade para a urbanização do território. A prática
do turismo rural contemporâneo reflete essa prática, uma vez que os hotéis
fazenda, spas rurais e casas de segunda residência se localizam,
preferencialmente, próximas às grandes concentrações
urbanas.
À guisa de exemplo da atividade turística, no espaço rural, contribuindo
para a geração de emprego e renda para as unidades familiares de produção, no
recorte espacial selecionado, constatamos a presença de 14 meios de hospedagem,
entre hotéis-fazenda e pousadas, dentre eles: Hotel Village Le Canton (Vargem
Grande), Rosa dos Ventos (Campinho), São Moritz (Viera), Hotel Fazenda Vrindávna
(Prata dos Arredes), Pousada Albuquerque (Albuquerque), Pousada Savognin
(Vieira). Em decorrência desses meios de hospedagem, verificou-se em pesquisa de
campo, que os mesmos possibilitam empregos associados aos serviços de camareira,
garçom, atendente, vigia etc, o que contribui para a alternativa de emprego e
complementação de renda.
Cabe ainda mencionar, que ao longo da RJ-130, atividades terciárias,
voltadas para o comércio e serviços são encontradas, dentre elas podemos
destacar, a Queijaria Suíça, na qual emprega mão-de-obra originária dos
agricultores familiares, além de estabelecimentos de decoração, material de
construção, restaurantes, imobiliárias entre outros.
Essas atividades atreladas turismo e ao veraneio tem contribuído
para impactar e modificar o espaço serrano fluminense possibilitando um processo
de urbanização, que Rua (2002) identifica como urbanidades no rural, ao longo da
Terefri e em suas imediações, como
também contribuído para a mudança de hábitos de parte da população local, em sua
maioria agricultores.
Cabe destacar, como complemento a atividade turística, na RJ-130 e
imediações, a presença crescente de sítios e residências de final-de-semana
(segunda residência) que também são oportunidades de oferta de empregado, como
diaristas, caseiros, jardineiros,
vigias etc, complementando a renda familiar e revalorizando o espaço
rural.
Tais ocupações, de forma alguma, eliminam as atividades agrícolas no
espaço em questão, mas contribuem como já mencionado, para a complementação da
renda familiar, ao possibilitar as famílias de agricultores sua inserção em
atividades não-agrícolas. Essas atividades associadas a pluriatividade, na
Terefri, são em sua maioria recentes, mais precisamente da década de 90 do
século XX, e conseqüentemente, carecem de informações estatísticas. As
informações quanto à geração de emprego e renda ficam prejudicadas do ponto de
vista quantitativo em decorrência da ausência de informações, sendo apenas
analisadas de forma qualitativa a partir de investigações em
campo.
Assim entendemos, que a pluriatividade é um fenômeno que tem se
aprofundado em função da diminuição da renda agrícola e se torna um caminho a
ser percorrido pelos membros das unidades familiares de produção, sobretudo em
áreas próximas aos grandes centros urbanos, onde o fluxo de turistas em direção
ao espaço rural tem sido mais intenso, com a revalorização do espaço rural e da
natureza. Nesse sentido, essas atividades complementares podem ser vistas como
oportunidades que se colocam para complementação da renda familiar. E esse
fenômeno pode estar associado em áreas de colonização e de industrialização como
muito bem analisado por Schneider (1999), ou antigas áreas de exploração de café
e cana de açúcar como no estado do Rio de Janeiro, ou ainda em áreas próximas as
metrópoles onde proliferam hotéis e pousadas e casas de segunda residência, como
na Região Serrana Fluminense, e estudado por Teixeira
(1998).
Neste contexto, a partir das análises realizadas sobre a agricultura
familiar, a pluriatividade e o turismo rural, vamos exemplificar nesta última
parte, como esses processos se manifestam em território fluminense, nosso
recorte espacial.
IV. Agricultura Familiar, Pluriatividade
e Turismo Rural: reflexões a partir da rodovia Teresópolis – Nova Friburgo
(TEREFRI).
O estado do Rio de Janeiro é o segundo pólo
industrial do Brasil, produz cerca de 71,0% do petróleo nacional sendo também o
maior produtor de gás natural do país. Além disso, sua produção de pescado é
significativa assim como a olericultura, horticultura e produção de leite. A sua
paisagem natural é bastante diversificada, mas também bastante degradada devido
às atividades socioeconômicas vivenciadas em seu território. Corresponde ao
estado mais urbanizado do país, com 95,0% de sua população vivendo em áreas
urbanas, e de acordo com Rua (2002), o território fluminense é marcado por eixos
de urbanização, nos quais ocorre uma urbanização mais densa. Limonad (1996) e Santos (2003) mencionam
que no espaço fluminense há uma redistribuição populacional em consonância com
as atividades produtivas.
O estado apresenta muitos problemas em
relação ao meio rural. A vasta concentração de população, de renda, de poupança,
de condições de desenvolvimento na Região Metropolitana do Rio de Janeiro gerou
um forte desequilíbrio inter-regional, com exclusão política e social de parte
da população do interior (MOREIRA, 2001). Segundo os resultados do Censo
Demográfico 2000 (IBGE), aproximadamente 10.871.960 indivíduos residem nos
limites da área metropolitana, correspondendo a 75,6% da população estadual.
Constituída por dezessete municípios, a Região Metropolitana ainda se mantêm
como um marco polarizador de recursos (RIBEIRO, 2002), de população e de bens e
serviços.
Apesar da ainda enorme concentração da
população fluminense em sua região metropolitana, surgem nos anos 1990 algumas
alterações em relação à dinâmica demográfica do estado do Rio de Janeiro. A mais
importante refere-se à simultaneidade de um movimento tendente à despolarização
espacial, com a emergência de novos centros de porte médio no interior do
estado, e de outro, em sentido inverso, de consolidação dos centros urbanos
metropolitanos (SANTOS, 2003). Apesar da expansão demográfica nas bordas
metropolitanas manifestar-se desde, pelo menos, a década de 1950, esse movimento
não implicou numa desconcentração da população em direção ao interior, o que
resulta no aumento do número das cidades médias, que eram 10 em 1980 para 17 em
2000. Destas, 10 localizam-se fora da região metropolitana (SANTOS,
2003).
Rua (2002, p. 47-48) assinala que no estado
do Rio de Janeiro “prevalece à projeção da metrópole carioca que intensifica o
processo de urbanização” e esse intenso processo marca intensamente o território
fluminense nas “dimensões política, cultural, comportamental, econômica, onde o
significado dessa área urbana torna-se esmagador”. Na verdade assiste-se a um
espraiamento da metrópole, a partir da expansão do mercado imobiliário, seguindo
quatro vetores bem nítidos, como já apontados e indicados no mapa 2, em direção
ao interior do estado.
O interior fluminense vem se destacando, não
somente em termos de crescimento demográfico (ainda pequeno), mas no
abastecimento de produtos agropecuários (hortigranjeiros, leite e produtos com
nicho de mercado especializado como, orgânicos, ervas-fina, leite de cabra,
trutas etc), além de estar servindo como área de lazer para a prática de turismo
rural, de ordem contemporânea, com a proliferação de hotéis-fazenda, pousadas,
spas e casas de segunda residência. A prática desse turismo rural é uma
alternativa ao turismo intenso que ocorre na costa Verde e do Sol, voltado para
o segmento do turismo de praia (RIBEIRO, 2003).
Quadro 3:
Estado do Rio de Janeiro. Área dos estabelecimentos (Ha), Número de
estabelecimentos agropecuários (Unidade) e Pessoal ocupado (Pessoas) por Grupos
de área total.
Grupos de área
total |
Hectare |
% |
Unidades |
% |
Pessoas |
% |
Menos de 1 ha |
2.540,090 |
0,13 |
3.657 |
8,66 |
14.399 |
8,30 |
1
a menos de 10 ha |
95.515,270 |
3,95 |
15.499 |
36,71 |
55.852 |
32,05 |
10
a menos de 50 ha |
376.853,451 |
15,59 |
14.229 |
33,70 |
48.662 |
27,93 |
50
a menos de 100 ha |
305.116,586 |
12,62 |
3.962 |
9,38 |
16.861 |
9,67 |
100
a menos de 500 ha |
935.189,563 |
38,70 |
4.221 |
9,99 |
27.993 |
16,06 |
500
a menos de 1.000 ha |
326.783,917 |
13,52 |
456 |
1,08 |
5.955 |
3,41 |
1.000
menos de 10.000 ha |
362.207,182 |
14,99 |
191 |
0,45 |
4.482 |
2,57 |
10.000
a menos de 100.000 ha |
12.098,548 |
0,50 |
1 |
0,002 |
23 |
0,01 |
Total |
2.416304,607 |
100 |
42.216 |
100 |
174.227 |
100 |
Fonte: IBGE, Censo
Agropecuário de 1996/Fundação CIDE, 2001.
De acordo com Ribeiro (2002) apesar do Estado
do Rio de Janeiro apresentar baixos totais, em relação aos totais nacionais,
quanto às variáveis: pessoal ocupado, valor da produção, quantidade colhida e
modernização, o seu quadro agrário apresenta relevância e contrastes no âmbito
estadual. Estes contrastes são decorrentes, de uma agropecuária tradicional, que
domina a maior porção do território fluminense, diante de outra de caráter
moderno. De um lado, produtos tradicionais, exemplificados pela cana-de-açúcar,
além de cultivos de subsistência; do outro, culturas que requerem técnicas
aprimoradas, como o tomate, a horticultura, a fruticultura e a olericultura,
marcando o Cinturão Verde da metrópole, ocupando municípios integrantes das
regiões Serrana, Centro-Sul, e Noroeste Fluminense.
À guisa de exemplo, no quadro 3 temos uma
radiografia da distribuição dos
estabelecimentos agrícolas no estado do Rio de Janeiro e constata-se que mais de
80,0% dos mesmos apresentam menos de 100 ha, o que imprime uma significativa
importância a produção familiar e as estratégias que esses agricultores
encontram para fazer frente à queda na renda agrícola e intenso processo de
urbanização.
Os agricultores familiares, como grande
maioria, passam por uma grave crise devido à concentração de renda e a falta de
políticas agrícolas efetivas. As grandes propriedades sempre ocuparam uma
parcela considerável do Estado do Rio de Janeiro (representam 11,5% dos
estabelecimentos e ocupam uma área de 67,7% dos mesmos), tendo desempenhado
papel relevante nas exportações agrícolas do País. Entretanto, após encerrar as
atividades econômicas de exportação de exportação do açúcar, e do café
(respectivamente 1900-30 e 1970-80), em seu território, a maioria das grandes
propriedades voltadas para a comercialização desses produtos passou a se
caracterizar pela falta de dinamismo das atividades agrárias nelas
desenvolvidas, devido à descapitalização decorrente da decadência das grandes
lavouras comerciais. Isso contribuiu para que extensas áreas do Estado
apresentem um nível de aproveitamento agrícola muito inferior ao potencial
produtivo das terras, podendo-se mencionar o Vale do Paraíba, no qual predomina
a pecuária bovina caracterizada por índices muito baixos de
produtividade.
Por outro lado,
verifica-se que os pequenos proprietários – bastante numerosos no Estado do Rio
de Janeiro – têm poucas possibilidades de realizar investimentos em suas terras,
uma vez que operam com retornos muito reduzidos para permitir a capitalização de
suas unidades de produção. Esse é o caso daqueles fornecedores de leite às
Cooperativas do Noroeste Fluminense, do Médio Vale do Paraíba e Centro Sul
Fluminense, os quais embora detenham a propriedade da terra, têm uma forma de
inserção na produção regional que implica reduzida autonomia na condução do
processo produtivo, e limitações quanto à possibilidade de investir em suas
unidades de exploração. Em outros casos, como na Região Serrana, onde há o
predomínio da produção de hortigranjeiros em pequenas propriedades, a
pluriatividade é adotada como alternativa de fonte de renda pelos agricultores.
Muitos, além de realizarem suas funções na propriedade agrícola, exercem
atividades não-agrícolas (como caseiros, motoristas, empregados domésticos,
fiscais de rodovia etc), nas casas de veraneio, nos hotéis e para as Prefeituras
da região.
Constata-se que, em
território fluminense, as transformações no espaço rural, como a prática do
turismo rural e a disseminação de empregos não-agrícolas encontram-se associadas
ao intenso processo de urbanização, e que pode ser exemplificado com o rcorte
espacial selecionado: a rodovia Teresópolis – Nova Friburgo, denominada TEREFRI.
A TEREFRI é uma das áreas
incluídas no eixo de urbanização que ocorre no “topo da serra” (RUA,
2002), estando localizada nos
municípios de Nova Friburgo e Teresópolis. Essa área é marcada pela
produção de hortigranjeiros e flores, e que abastece a RMRJ, apresenta também um
tradicional e significativo pólo industrial (com destaque para a moda íntima),
além da presença de inúmeros sitos de veraneio, casas de segunda residência,
hotéis-fazenda, pousadas, spas, que associam seus estabelecimentos aos aspectos
naturais da região. Corresponde a uma área de turismo alternativo ao de praia da
Costa Verde e do Sol. Nessa área ocorre uma intensa produção agrícola em bases
familiar, centrado em pequenos estabelecimentos, na mão-de-obra-familiar e na
baixa tecnificação da lavoura.
Esses produtores, na grande maioria das vezes, ficam a mercê dos
atravessadores que controlam o processo de comercialização da produção. Produzem
alface, brócolis, couve-flor, tomate etc e acabam tendo uma baixa remuneração
pela suas atividades agrícolas. Na complementação da renda familiar, se inserem
no mercado de trabalho não agrícola, exercendo atividades de jardineiros,
caseiros, domésticos, ou trabalhando em empresas sediadas nos municípios da
região. Essa área também produz produtos como, orgânicos e hidropônicos, para um
mercado consumidor restrito à zona sul da cidade do Rio de Janeiro. Na Região Serrana Fluminense nota-se a
presença marcante de atividades relacionadas ao turismo rural contemporâneo e em
sintonia com a produção familiar.
Destarte e a guisa de
exemplo da atividade turística, no espaço rural, contribuindo para a geração de
emprego e renda para as unidades familiares de produção, no recorte espacial
selecionado, constatamos a presença de onze meios de hospedagem, entre
hotéis-fazenda e pousadas, dentre eles: Hotel Village Le Canton (Vargem Grande),
Rosa dos Ventos (Campinho), São Moritz (Viera), Hotel Fazenda Vrindávna (Prata
dos Arredes), Pousada Albuquerque (Albuquerque), Pousada Savognin (Vieira). Em
decorrência desses meios de hospedagem, verificou-se em pesquisa de campo, que
os mesmos possibilitam empregos associados aos serviços de camareira, garçom,
atendente, vigia etc, o que contribui para a alternativa de emprego e
complementação de renda.
Cabe ainda mencionar, que ao
longo da RJ-130, atividades terciárias são encontradas, voltadas para o comércio
e serviços, dentre elas podemos destacar, um total de seis restaurantes, de
vinte e cinco estabelecimentos comerciais, além de dezenove espaços culturais
(www.clikfriburgo.com.br), os
quais empregam mão-de-obra originária dos agricultores familiares, além de
estabelecimentos de decoração, material de construção, restaurantes,
imobiliárias entre outros.
Essas atividades atreladas turismo e ao veraneio tem contribuído para
impactar e modificar o espaço serrano fluminense possibilitando um processo de
urbanização, que Rua (2002) identifica como urbanidades no rural, ao longo da
TEREFRI e em suas imediações, como
também contribuído para a mudança de hábitos de parte da população local, em sua
maioria agricultores.
Cabe destacar, como complemento a atividade turística, na RJ-130 e
imediações, a presença crescente de sítios e residências de final-de-semana
(segunda residência) que também são oportunidades de oferta de empregado, como
diaristas, caseiros, jardineiros,
vigias etc, complementando a renda
familiar e revalorizando o espaço rural.
Tais ocupações, de forma alguma, eliminam as atividades agrícolas no
espaço em questão, mas contribuem como já mencionado, para a complementação da
renda familiar, ao possibilitar as famílias de agricultores sua inserção em
atividades não-agrícolas. Essas atividades associadas a pluriatividade, na
Terefri, são em sua maioria recentes, mais precisamente da década de 90 do
século XX, e conseqüentemente, carecem de informações estatísticas. As
informações quanto à geração de emprego e renda ficam prejudicadas do ponto de
vista quantitativo em decorrência da ausência de informações, sendo apenas
analisadas de forma qualitativa a partir de investigações em
campo.
Assim entendemos, que a pluriatividade é um fenômeno que tem se
aprofundado em função da diminuição da renda agrícola e se torna um caminho a
ser percorrido pelos membros das unidades familiares de produção, sobretudo
em áreas próximas aos grandes
centros urbanos, onde o fluxo de turistas em direção ao espaço rural, tem sido
mais intenso, com a revalorização do espaço rural e da natureza. Nesse sentido,
essas atividades complementares podem ser vistas como oportunidades que se
colocam para complementação da renda familiar. E esse fenômeno pode estar
associado em áreas de colonização e de industrialização como muito bem analisado
por Schneider (1999), ou antigas áreas de exploração de café e cana de açúcar
como no estado do Rio de Janeiro, ou ainda em áreas próximas as metrópoles onde
proliferam hotéis e pousadas e casas de segunda residência, como na Região
Serrana Fluminense, e estudado por Teixeira (1998).
Para não
concluir
O
território fluminense encontra-se marcado por um intenso processo de urbanização
(Ribeiro, 2002; Rua, 2002; Santos, 2003), e que tem provocado profundas
transformações sócioespaciais. Entre elas destacamos as atividades associadas ao
turismo rural contemporâneo, com a proliferação de hotéis fazenda, spas,
pousadas, e casas de segunda residência, e a manutenção e até mesmo o aumento da
produção familiar, conforme constatou Seabra (2004), em que o estado do Rio de
Janeiro apresenta participação expressiva na comercialização agrícola a partia
da CEASA-RJ, especialmente as hortaliças, cuja produção tem aumentado nos
últimos anos, como verificado na Região Serrana Fluminense. A proliferação dessas atividades
possibilitou aos produtores familiares a inserção em atividades não-agrícolas e
conseqüentemente o aumento da renda familiar. Porém esse processo ocorre nas
áreas dos eixos de urbanização e próximo a RMRJ. Nas áreas mais distantes, os
produtores familiares continuam na dependência da renda agrícola e enfrentando
inúmeros problemas para a realização de suas atividades.
Neste contexto, o espaço rural fluminense se transforma em decorrência da
valorização de seus aspectos naturais e a manutenção da produção agrícola
familiar se torna importante para a disseminação da imagem do espaço rural e
natural vendido ao turista. Sendo assim, cabe a indagar: até que ponto as
atividades do turismo rural contemporâneo (RODRIGUES et al., 2001) beneficiam os
produtores familiares, com a oferta de empregos não-agrícolas? Não seria mais
uma forma de exploração da força de trabalho familiar?
Isto posto, as evidências observadas no estado do Rio de Janeiro nos
permitem a indicar a exploração dos produtores familiares, porém novas
investigações e reflexões devem ser conduzidas, para uma melhor reflexão a cerca
da agricultura familiar, da pluriatividade e do turismo
rural.
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