NCeHu 265/06
Brasil
A manutenção da mediocridade
Palocci cai; Guido Mantega
assume, mas política econômica que provoca recessão continuará a
mesma
Igor Ojeda
Braço-direito do presidente Lula, homem
forte do governo. Insubstituível. Nenhum desses adjetivos foram suficientes para
impedir a saída de Antonio Palocci do comando do Ministério da Fazenda, no dia
27 de março, após uma série de denúncias que o comprometiam.
Poupado até certo ponto da crise que
atingiu o governo Lula no ano passado, sua situação ficou insustentável após um
amontoado de acusações sobre sua atuação no esquema de caixa dois do PT na
prefeitura de Ribeirão Preto (SP), entre 2001 e 2002, onde foi acusado de
receber “mesada” de uma empreiteira, que seria repassada ao
partido.
A gota d'água foi seu suposto
envolvimento na quebra ilegal do sigilo bancário de Francenildo Santos Costa, um
dos que afirmaram ter visto o ex-ministro da Fazenda freqüentar a chamada “casa
do lobby”, onde era caseiro. No local, Palocci repartiria os recursos advindos
de doações ilegais ao PT.
Sem alterações à vista
No dia seguinte a seu pedido de
demissão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu posse a Guido Mantega como
novo titular do Ministério da Fazenda. Na ocasião, o novo ministro afirmou que
irá trabalhar para que o Brasil alcance em 2006 um crescimento de 4% na economia
e que seguirá a política econômica atual: “o desenvolvimento que defendo é
responsável, avesso às aventuras e ao entusiasmo infantil”. Em relação às taxas
de juros, disse que poderá haver alguma queda. Em outras palavras, nenhuma
mudança de fundo à vista: apesar de seu perfil mais desenvolvimentista, Mantega
manterá os mesmos fundamentos econômicos que seu antecessor. Ou melhor:
antecessores, visto que é a mesma política adotada nos dois mandatos tucanos de
Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), baseada no trinômio superávit primário,
juros altos e câmbio flutuante e que tanto contribuiu para a estagnação da
economia brasileira e a conseqüente manutenção das altas taxas de desemprego e
da precarização dos escassos postos de trabalho existentes.
Em discurso no dia 28, o próprio Lula
garantiu a manutenção desse tripé. Apesar disso, o jornalista e economista José
Carlos de Assis não acredita que essa máxima seja insuperável. “É do ritual
dizer que o Lula é o fiador da política econômica, mas o que ele entende de
economia para dizer que é dele? O mercado é quem dita essa política. O Lula
garante que as determinações do mercado sejam cumpridas. Mas isso pode mudar
dentro de dois ou três meses por pressão da própria opinião pública”,
afirma.
Mãos atadas
Para Assis, se houver alterações de
rumos, estas não serão radicais. “A macroeconomia estava blindada, como está
agora e como acho que vai ficar. É possível que, daqui a alguns meses, o Mantega
possa acelerar a queda da taxa de juros e utilizar um superávit menor. Mas a
essência não vai mudar”, avalia. Segundo ele, o novo ministro não tomará nenhuma
medida que a longo prazo represente a queda dos índices de desemprego. “Só se
retoma o emprego com uma pauta pesada de investimento
público”.
Para Nalu Faria, coordenadora-geral da
Sempreviva Organização Feminista (SOF), um dos motivos para a manutenção da
política econômica é a antecipação da disputa eleitoral. “Lula está acuado
frente aos ataques e às denúncias. Tem que manter a estabilidade, pois os
mercados não podem ficar nervosos. É uma armadilha em que ele e o Palocci
caíram”. Segundo ela, os petistas estão confiando no impacto positivo de algumas
medidas pontuais de aquecimento da economia, como o aumento do salário-mínimo e
o impulso à construção civil, que vai gerar alguns empregos. “Esse ano vai
parecer com 2004. Vão aumentar um pouco os índices, só que comparado com o ano
anterior fraco. É muito aquém do que queremos. E na situação atual em que se
encontra o povo, já vai ser bom para ele”.
Desenvolvimentista
Já para Décio
Munhoz, economista e professor da Universidade de Brasília (UNB) e para o
sociólogo Emir Sader, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ), a queda de Palocci e a escolha de Guido Mantega significarão alterações
na política econômica. Segundo Munhoz, isso pode ocorrer pela mediocridade de
seu antecessor. “É impossível você manter a liberdade de atuação do Banco
Central e que você tenha um ministro tão acuado, tão acomodado, tão sem presença
como o Palocci. O Guido Mantega é um economista experimentado. Então, eu acho
que vai haver alguma mudança”, diz.
Fuente: www.brasildefato.com.br , 4 de abril
de 2006.