Os acontecimentos dos últimos dias mostram à
saciedade que a UE/Euro é incompatível com a democracia, a soberania e o
bem-estar dos povos. É uma ditadura ao serviço do grande capital financeiro e
uma autêntica prisão de povos. Como o PCP tem afirmado, esta UE não é
reformável. Apenas sobre os seus escombros poderá haver futuro para os
povos.
Os empréstimos ao abrigo dos programas das troikas
são obra de agentes do grande capital financeiro (como o presidente do BCE,
Draghi, homem da Goldman Sachs) para benefício do grande capital financeiro. A
banca privada era credora de boa parte da dívida grega em 2010 e prosperava com
os respectivos juros, mas decidiu pôr-se a salvo quando a crise estoirou. Tal
como cá, o dinheiro das troikas nem entrou na Grécia: foi parar directamente aos
credores – o capital financeiro parasitário – transferindo as dívidas para o
BCE, o FMI e os bancos centrais nacionais. A «ajuda» foi para a banca. Para os
povos ficaram as dívidas públicas, que explodiram nos anos das troikas. São
impagáveis, mas servem de pretexto para levar os povos à miséria, aumentar a
exploração e impor relações de tipo colonial aos países endividados.
As tão badaladas «obrigações dos devedores» são à
la carte. O principal jornal do grande capital inglês, o Financial Times, dedica
um editorial (11.6.15) a outro país europeu que está na falência: a Ucrânia.
Titula o FT: «Os credores da Ucrânia têm de partilhar a dor do país» e «têm de
aceitar um haircut [perdão de dívida]». Informa que há um «pacote de apoios
internacional […] que admite a reestruturação da dívida e cortará os juros a
pagar em 15,3 mil milhões de dólares nos próximos quatro anos» para que «sejam
geríveis em relação à produção económica» do país. Acrescenta que há credores
privados que «resistem a um perdão da dívida», mas sentencia: «terão de ceder.
Têm uma obrigação moral em concordar com a reestruturação que permitirá reduzir
a dívida para níveis sustentáveis». E defende «a utilização de mecanismos de
indexação ao PIB», solução que considera «a melhor para todas as partes», até
porque «a História mostra que, mesmo após um incumprimento [default], os
investidores privados regressam rapidamente quando a economia recomeça a
crescer». Remata o FT: «em matérias de tal importância geopolítica, não se pode
permitir que os interesses financeiros privados ditem as políticas públicas». A
adulta directora do FMI, Lagarde, já «assegurou à Ucrânia que os fundos [do FMI]
continuarão disponíveis, mesmo que o país falhe nos pagamentos aos seus credores
privados» (Deutsche Welle, 13.6.15). Esta duplicidade gritante de critérios é
explicada pelo FT: a Ucrânia «tem o governo mais reformista desde a
independência […] que está a concretizar grandes cortes nos subsídios estatais».
Se o combativo povo grego tem de ser castigado e humilhado pela sua ousadia de
resistir, já os golpistas e fascistas ucranianos, que impõem políticas
troikeiras do imperialismo pela violência, o terror e a guerra, merecem apoio e
perdões de dívida. Medite-se ainda sobre uma terceira dívida, afastada destas
considerações políticas. O FMI acaba de recusar qualquer perdão de dívida ao
Nepal, país devastado em Abril deste ano por um enorme terramoto que matou 8600
pessoas e destruiu mais de 500 mil casas. A destruição não foi considerada
suficiente (catholicireland.net, 30.6.15).
Os acontecimentos dos últimos dias são portadores
de importantíssimos ensinamentos sobre a verdadeira natureza da dominação de
classe, do imperialismo, da União Europeia e da social-democracia (nas suas
várias expressões). A humilhação do governo grego mostra que se paga caro as
ilusões de que é possível reformar esta UE.
*Este artigo foi publicado
no “Avante!” nº 2172, 16.07.2015.