Ernesto Zedillo, no banco dos réus
Familiares de vítimas do massacre de Acteal responsabilizam o
ex-presidente mexicano por praticar crimes contra a humanidade e apoiar a
formação dos grupos paramilitares que, no dia 22 de dezembro de 1997,
assassinaram em uma capela do município de Chanalhó, Chiapas, 45 homens,
mulheres e crianças que rezavam pela paz. As acusações contra Zedillo não são
novas. Desde 1997, os zapatistas apontam sua responsabilidade pelo massacre.
Continuam fazendo agora.
Luis
Hernández Navarro
La
Jornada/Carta
Maior
30/12/11
Ernesto Zedillo sentou novamente
no banco dos réus. Os familiares de vítimas do massacre de Acteal o
responsabilizam por praticar crimes contra a humanidade e apoiar a formação dos
grupos paramilitares que, no dia 22 de dezembro de 1997, assassinaram em uma
capela do município de Chanalhó, Chiapas, 45 homens, mulheres e crianças que
rezavam pela paz.
No dia 16 de setembro passado, 10 pessoas,
presumivelmente uma dissidência da associação civil Las Abejas,
processaram o ex presidente mexicano Ernesto Zedillo na corte distrital de
Connecticut, Estados Unidos (caso Jane Doe et al versus Ernesto Zedillo). Eles o
acusaram de responsabilidade de mando por ordenar, participar e conspirar em
associação delituosa para executar o massacre de Acteal, e por seu posterior
encobrimento. Pediram à corte que o declarasse responsável pela comissão e
tentativa de assassinatos extrajudiciais; por danos e tratos cruéis e desumanos;
pelo uso do terror e da violência contra a liberdade de associação, pensamento,
opinião pública e exercício político; por crimes contra a humanidade e por
crimes de guerra.
A demanda civil foi um duro golpe à reputação do
ex-mandatário mexicano. Meios de comunicação estadunidenses, como The Washington
Post, CNN e Yale Daily News, difundiram a noticia. A Universidade de Yale, da
qual Ernesto Zedillo é diretor do Centro de Estudos sobre a Globalização e
responsável pelo seminário Debatendo a globalização, se localiza em Connecticut,
onde foi apresentado o requerimento judicial.
Como explicam Víctor Emilio
Corzo e Ernesto Eduardo Corzo no ensaio Enseñanzas de la demanda a Ernesto
Zedillo, o fundamento jurídico da solicitação de processo está na Alien
Tort Claims Act (lei de demanda judicial por ofensa contra estrangeiros,
ATCA, na sigla em inglês) e na Torture Victim Protection Act (lei para a
proteção de vítimas da tortura, TVPA, na sigla em inglês), que justificam a
jurisdição universal dos Estados Unidos em matéria civil para processar os
responsáveis de cometer crimes contra o direito das nações. A ATCA, promulgada
pelo Congresso norte-americano em 1789, estipula que as cortes federais desse
país têm jurisdição para conhecer todas as causas nas que algum estrangeiro
demande por danos somente em violação à lei das nações ou a um tratado do qual
faça parte os Estados Unidos.
Segundo o jornal La Razón, para impedir o
julgamento do ex-presidente em Connecticut, no dia 12 de dezembro passado sua
equipe de advogados defensores teria alegado sua imunidade como ex-governante de
uma nação soberana.
No México, Ernesto Zedillo guardou silêncio. Não nos
Estados Unidos. Em uma mensagem dirigida ao jornal Yale Daily News, disse
que as acusações são infames, carecem de sustentação e são obviamente falsas. E
acrescentou: “Esta é uma calúnia inventada por razões que ignoro.”
Não é
a primeira ocasião na qual o ex-mandatário é apontado nos Estados Unidos como
responsável pela matança de Acteal. Quando, no dia 18 de fevereiro de 2005, o
Centro de Direitos Humanos Frey Bartolomé de las Casas e a organização civil
Las Abejas apresentaram ante a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos (CIDH) uma petição contra o Estado mexicano pelo assassinato de 45
tzotziles, por considerar que as instâncias internas se esgotaram, o
assunto repercutiu na imprensa estadunidense.
Naquela ocasião, como
agora, Zedillo se negou a esclarecer no México sua responsabilidade no crime.
“Nunca respondi os insultos ou calúnias quando estive na política. Eu não
acredito que deva fazê-lo agora ou nunca”, disse em 2005. No entanto, fez
declarações nos Estados Unidos. O professor de Yale negou as acusações que o
envolviam e ironizou: “É muito revelador que não possa encontrar nenhuma notícia
a respeito nos meios de comunicação mexicanos, como o jornal Reforma da cidade
do México”.
Efetivamente, naquela época, poucos periódicos, além do La
Jornada, divulgaram a notícia. Não é raro. É sabido que o ex-mandatário mexicano
tem importantes defensores nos meios de comunicação mexicanos. Depois de salvar
as empresas de televisão, colocou em seus postos de comando pessoas de sua
absoluta confiança, consolidou uma rede de influentes articulistas nos meios
escritos e controlou boa parte das empresas de pesquisa. Através deles tem
influído na política mexicana e defendido seus interesses.
Este ano,
diferente de 2005, o professor de Yale teve que enfrentar as acusações contra si
sem expressões relevantes de apoio público. Em 2005 seus aliados puseram a cara
por ele. Richard Levin, presidente da Universidade de Yale, disse que Zedillo
era uma pessoa com uma grande integridade e que estava fazendo um grande
trabalho em Yale. Nesta ocasião, quase ninguém o defendeu.
As acusações
contra Zedillo não são novas. Desde 1997, os zapatistas acusam a
responsabilidade do mandatário no massacre. Continuam fazendo agora. Na
recentemente publicada Quarta carta sobre ética e política que o
subcomandante Marcos escreveu a Don Luis Villoro, o dirigente do EZLN lembrou
como o comandante Moisés, falecido no dia 26 de setembro passado, recolheu
informação vital para esclarecer a matança de Acteal, no dia 22 de dezembro
desse ano, perpetrada por paramilitares sob a direção do general do Exército
Mario Renán Castillo e com Ernesto Zedillo Ponce de León, Emilio Chuayffet e
Julio César Ruiz Ferro como autores intelectuais.
É evidente que por trás
da demanda apresentada contra Zedillo em Connecticut há interesses políticos que
vão além do requerimento de um grupo de vítimas de que se repare uma ofensa. Mas
também é obvio que isto não é uma prova de inocência do ex-mandatário mexicano,
o ex-secretario de Governo Emilio Chuayffet e seus sócios. Eles são responsáveis
por perpetrar um crime de Estado. Por isso devem ser julgados, moral e
juridicamente.
Tradução: Libório Junior