QUESTÕES METROPOLITANAS E O CENTRO METROPOLOTANO NOS PLANOS
DIRETORES DE TAGUATINGA, CEILÂNDIA E SAMAMBAIA/DF
Agnes de França
Serrano
Universidade de
Brasília
RESUMO
A questão metropolitana está muito presente nas recentes
discussões sobre Brasília, e são inúmeros os questionamentos que emergem:
afinal, a capital do Brasil pode ser considerada uma região metropolitana, mesmo
que ainda não instituída legalmente? Seria o Distrito Federal uma área
metropolitana ou aglomeração urbana? A metrópole de Brasília pode se restringir
às delimitações territoriais do Plano Piloto? Apesar da utilização de diferentes
conceitos e das diversas concepções existentes sobre Brasília, é inegável o fato
de que a metropolização é um processo que se fortalece cada vez mais na capital
federal, cujo espaço urbano se torna mais complexo conforme a (re)organização
das dinâmicas políticas, econômicas e sociais. A evidência de que a
metropolização é um processo vivo no Distrito Federal é reforçada pelo fato de o
Governo do DF estar implementando atualmente um Centro Metropolitano em uma área
que abrange três importantes Regiões Administrativas – RA’s: Taguatinga,
Ceilândia e Samambaia, as quais exercem forte centralidade espaço-regional. O
objetivo desse trabalho é investigar como e se o Plano Diretor de cada uma
dessas RA’s considera aspectos tanto da complexidade metropolitana na qual estão
inseridos esses aglomerados urbanos quanto da implementação do Centro
Metropolitano em seu tríplice limítrofe.
Palavras-chave: Brasília, Centro
Metropolitano, Taguatinga, Ceilândia, Samambaia, Plano
Diretor.
ABSTRACT:
The metropolitan point is very present in recent
discussions about Brasilia, and the questions that emerge about it are
innumerable: after all, could the capital of Brazil be considered a metropolitan
region, even not being founded legally? Would Distrito Federal be a metropolitan
area or an urban agglomeration? Could Brasilia restrict itself to the
territorial delimitations of Plano Piloto? Although the utilization of different
concepts and of the most diverse conceptions existent about Brasília, it is undeniable the fact that metropolization
is a process which gets stronger more and more in the federal capital, whose
urban space gets more complex according to
the (re)organization of political, economic and social dynamics. The
evidence that metropolization is a live process in Distrito Federal is
reinforced by the fact that the government of DF is currently implementing the
Metropolitan Center in an area which covers three important Administrative
Regions(Regiões Administrativas)- RA’s: Taguatinga, Ceilândia e Samambaia, which
exert strong regional-space centrality. The goal of this essay is to investigate
how and whether the Director Plan of each one of these RA’s consider aspects
viewing the metropolitan complexity in which these urban agglomerates are
inserted and the implementation of the Metropolitan Center in its
proximity.
Key-Words: Brasília, Metropolitan Center, Taguatinga, Ceilândia,
Samambaia, Director Plan
INTRODUÇÃO
A metropolização está indiscutivelmente presente na dinâmica do
Distrito Federal, extrapolando os limites do Plano Piloto de Brasília, e mesmo
do quadrilátero distrital. Entender esse processo é um desafio para aqueles que
se engajam em estudos sobre questões metropolitanas presentes em aglomerações
urbanas. É conhecido que uma região ou área de caráter metropolitano possui um
núcleo centralizador de atividades e serviços, mas, no Distrito Federal está
ocorrendo um forte processo de descentralização do Plano Piloto – principal
região central – e fortalecimento de outras centralidades, fato ocasionado por
novas dinâmicas cotidianas estabelecidas regional e mesmo nacionalmente.
Prova de que a metropolização e a descentralização são fatos no
território do Distrito Federal é a criação de um Centro Metropolitano fora do
Plano Piloto de Brasília. Esse empreendimento estará localizado na área de
confluência de três importantes Regiões Administrativas do DF – Taguatinga,
Ceilândia e Samambaia –, e abrigará, dentre outros equipamentos públicos, um
Centro Administrativo distrital, um dos campi da Universidade de Brasília,
praças de convivência coletiva, museus e teatros. O objetivo desse trabalho é investigar
se e como a questão metropolitana e a implementação do Centro Metropolitano são
tratados nos Planos Diretores das Regiões Administrativas de Taguatinga,
Ceilândia e Samambaia.
Para viabilizar essa pesquisa, optou-se primeiramente por uma
revisão histórico-bibliográfica e conceitual a respeito da construção de
Brasília enquanto nova capital do Brasil e do processo de metropolização pelo
qual o Distrito Federal vem passando. Posteriormente, foram realizadas
investigações documentais com relação à implementação do Centro Metropolitano,
de modo a compreender a justificativa política desse importante projeto
urbanístico. Para alcançar o objetivo primeiro desse trabalho, investigou-se os
Planos Diretores das Regiões Administrativas de Ceilândia, Taguatinga e
Samambaia, que juntas representam uma das principais centralidades do DF.
1.
UMA BREVE REVISÃO HISTÓRICA E O PROCESSO DE METROPOLIZAÇÃO DE
BRASÍLIA
A construção de Brasília na década de 1950 para servir como sede
política federal atraiu para o Centro-Oeste do Brasil um grande contingente
populacional, que migrou em busca de empregos como trabalhadores da construção
civil, principalmente. Esse expressivo número de migrantes passou a ocupar áreas
que rodeavam o Plano Piloto principalmente para fins de moradia. Essas áreas,
com o tempo, se consolidaram e começaram a serem chamadas “Cidades Satélites”.
Mas o rápido processo de urbanização de Brasília que consolidou uma malha urbana
polinucleada é extensa e ricamente caracterizado nas bibliografias atuais, o que
justifica o fato de este trabalho não pretender adensar ainda mais o catálogo de
bibliografias que retratam essa questão do ponto de vista histórico. Apesar
disso, foi imprescindível para o desenvolvimento desta pesquisa destacar
primeiramente a característica dispersa, “polinucleada” da morfologia urbana do
DF, para, enfim, prosseguir refletindo acerca do tema central sobre o qual o
presente trabalho objetiva retratar.
Em um momento primeiro, essas cidades satélites eram consideradas
“cidades dormitório”, tendo em vista que não comportavam significativas
atividades políticas, econômicas, tampouco ofertavam suficientemente serviços
relacionados, por exemplo, à saúde e à educação. Aliás, todos esses serviços
e/ou atividades estavam realmente concentrados, em sua maioria, no Plano Piloto
de Brasília. Era essa mesma porção do DF que reunia em seus limites a maior
oferta de empregos de todo o território distrital e regional. Todo esse contexto
justifica o fato de as cidades satélites serem consideradas cidades dormitório.
Contudo, essa realidade já não é a mesma, pois as dinâmicas
urbanas sofreram significativas transformações após os mais de 50 anos da
inauguração de Brasília. Hoje, os núcleos urbanos que rodeiam o Plano Piloto são
denominados “Regiões Administrativas”, que se refuncionalizaram e passaram a
requerer expressivos estudos e investimentos públicos frente ao cenário no qual
estão inseridas. As Regiões Administrativas – RA’s – começaram a ganhar maior
importância não apenas local, mas regionalmente. Ademais, elas se multiplicaram.
Em 1990, eram apenas 16, e hoje são 31. Tanto o
rápido e intenso crescimento populacional quanto a dinamização econômica e de
serviços das RA’s proporcionaram uma reconfiguração urbana das mesmas em se
tratando do DF e de seu entorno.
Qual foi a implicação desses acontecimentos? Que cenário urbano
eles desencadearam? São inúmeros os pesquisadores que respondem esses
questionamentos indicando ou afirmando clara e explicitamente a existência de
intensos processos na região geográfica central do país que caracterizariam e
configurariam a metropolização de Brasília, cuja consolidação teria se iniciado
antes mesmo dos anos 90.
A complexidade da realidade urbana que se formou ao longo do tempo
no DF devido à existência de Brasília proporcionou o surgimento de um forte e
rápido processo de metropolização em uma região cuja principal cidade teria
menos de 50 anos. Conforme Ferreira,
Ao longo
do tempo, depois da implantação da cidade, as funções capital federal e polo
foram colocando no território objetos interconectados, que formam um sistema, o
qual está em permanente interação com os processos formadores do espaço da
cidade, internos ou externos a ela. Assim, cria-se um espaço urbano com
complexidade metropolitana por suas funções e processos, o qual se expande pelo
território extrapolando as fronteiras do DF e assumindo a forma de Região
Metropolitana (2010. p. 48).
São muitas as denominações que o conjunto de Regiões
Administrativas do DF e os municípios adjacentes a esse território recebem,
devido aos processos pelos quais vêm passando. Na década de 1980, Aldo Paviani
afirmou que “Brasília preenche todos os requisitos para ser considerada como
metrópole, quais sejam: complexidade funcional; massa ou volume populacional e
inter-relação/integração espacial” (1989, p. 51. Grifos nossos). Quando o autor
faz essa afirmação, infere-se que ele esteja considerando Brasília para além dos
limites territoriais do Plano Piloto, ou seja, que esteja englobando em sua
análise todas as RA’s do DF e o entorno deste.
Como visto anteriormente, Ferreira admite a formação de uma Região
Metropolitana, constituída a partir de uma área central, a qual seria Brasília –
enquanto Plano Piloto. Mas ainda em 1985 a autora já fazia colocações bastante
esclarecedoras a esse respeito, afirmando que:
Decorridos
25 anos de sua implementação, a cidade já tem delineada a sua área
metropolitana, à semelhança das demais metrópoles brasileiras [...]. Brasília
hoje não pode ser considerada apenas como o Plano Piloto de Lúcio Costa, como
era nos anos cinquenta. Tampouco pode ser apenas a cidade com seus núcleos
periféricos dispersos, dos anos sessenta. Ela é agora a metrópole, que envolve
além desses espaços os municípios vizinhos do entorno do DF (FERREIRA,
Apud SCHVASBERG, 2010. p. 257)
Contudo, outros autores preferem não utilizar a denominação
“região metropolitana”, substituindo por “área metropolitana” (ibidem. p. 255),
ou “aglomerado urbano de Brasília” – devido a implicações políticas, conceituais
e mesmo governamentais –. Conforme explica Steinberger, esse aglomerado também
não se explicaria pelos limites territoriais do DF, tampouco por dinâmicas
estabelecidas internamente. Sobre a terminologia que utiliza, a autora esclarece
que:
Estamos,
propositalmente, utilizando o termo “aglomerado urbano” para não entrar no
mérito da discussão se Brasília já é metrópole, área e/ou região metropolitana,
embora muitos autores que a estudam partam do princípio que essa é uma questão
vencida. Entendemos por “aglomerado urbano” a denominação genérica de uma
categoria espacial composta por duas ou mais cidades que possuem relações de
interdependência. Dessa forma, um aglomerado urbano pode já ser ou vir a ser uma
região metropolitana, microrregião ou aglomeração metropolitana [...].
Entretanto, no nosso entender, essa decisão deve ser tomada de uma maneira
madura, quer dizer, conjunta pelos atores envolvidos, e não apenas com um
viés
institucionalista (STEINBERGER,1999. p.26).
De acordo com o capítulo 25 da Constituição Brasileira de 1988,
cabe aos estados instituir, a partir de leis complementares, “regiões metropolitanas,
aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de
municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução
de funções públicas de interesse comum” (BRASIL, 1988). De fato, e em termos
legais, não há a implantação de uma Região Metropolitana de Brasília, e sim de
uma RIDE-DF – Região
Integrada de Desenvolvimento –, criada pela Lei Complementar nº 94, de 19 de
fevereiro de 1998 e regulamentada pelo Decreto
nº 2.710, de 04 de agosto de 1998, e que
se constitui como uma aglomeração de caráter metropolitano, como indicado por
Shvasberg e Lopes (2011.p. 223). Esse esclarecimento não elimina a possibilidade
futura de ser instituída uma Região Metropolitana de Brasília, tampouco anula o
fato de o Distrito Federal estar enfrentando um forte e crescente processo de
metropolização ou de Brasília ser uma metrópole que extrapola os limites
territoriais do Plano Piloto. Essas evidências são
reforçadas pelo fato de o governo do DF estar implementando atualmente um Centro
Metropolitano fora do Plano Piloto.
2.
CARACTERIZAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DO CENTRO METROPOLITANO
Apesar de se reconhecer a existência do processo de
metropolização, é necessário ressaltar que o núcleo central da RIDE-DF continua
sendo o Plano Piloto de Brasília, o qual concentra a maior oferta de empregos,
serviços, e atividades recreativas e de lazer no território distrital. O Plano
Piloto de Brasília reúne não apenas as instituições políticas da esfera Federal,
mas também local, tais como a sede do Governo do Distrito Federal – denominado
palácio do Buriti –, além de todos os órgãos públicos secretarias
governamentais.
Todas essas características reforçam o fluxo de veículos daqueles
que residem em torno da área central de Brasília e que diariamente se dirige ao
Plano Piloto. Dessa maneira, os engarrafamentos se agravam, e os
congestionamentos se tornam inevitavelmente parte do cotidiano do brasiliense.
Os problemas de trânsito pioram a cada dia por conta da falta de políticas
públicas locais eficientes com relação à mobilidade urbana.
Tendo em vista este quadro, nos últimos cinco anos o Governo do
Distrito Federal – GDF – reavivou um projeto que estava esquecido: a criação do
Centro Metropolitano, a ser implementado em uma área que abrange Ceilândia,
Taguatinga e Samambaia – respectivamente, IX, III e XII Regiões Administrativas
do DF. Em declaração disponível no “Portal Oficial de Taguatinga”, o atual
governador do DF, Agnelo Queiroz, afirmou que cerca de 60% dos trabalhadores do
GDF residem nessas três RA’s. Dessa maneira, o projeto do Centro Metropolitano
traria também o benefício de diminuir problemas de trânsito, tais como os longos
engarrafamentos que diariamente se fazem presentes nas avenidas de acesso ao
Plano Piloto de Brasília.
As obras do Centro Metropolitano se iniciaram em 2011. Este se
caracteriza como o primeiro empreendimento do DF em que fora estabelecida a
parceria público-privada para sua implementação. O referido centro está sendo
erguido em uma área de 195 mil m², localizada justamente entre Ceilândia,
Taguatinga e Samambaia. No Centro Metropolitano estará localizada a nova Sede
Administrativa do Governo Distrital, a qual contará com 14 edifícios - de
gabarito variando entre 10 e 15 andares – e um centro de convenções de 2.500
lugares. Além da própria governadoria, toda essa nova estrutura administrativa
deverá abrigar as secretarias de estado e empresas públicas.

Figura 1 – Restrições à ocupação na área do Centro Metropolitano. Fonte:
TERRACAP
Além da sede administrativa do governo distrital, a área destinada
à implementação do Centro Metropolitano comportará o campus da Universidade de
Brasília em Ceilândia – cuja construção se encontra atualmente em fase de
finalização, o Ceilambódromo, uma praça de uso coletivo, projetada pelo
arquiteto Oscar Niemeyer e uma área destinada para o uso residencial. Além
disso, e conforme o projeto em vigor, nas áreas adjacentes a esse Centro
Metropolitano serão implantados bibliotecas públicas, museus, centros
artístico-culturais, dentre outros (TERRACAP, 2010. p. 74 ).O projeto em vigor
do Centro Metropolitano indica que:
da
área total do
Centro Metropolitano[...],
170ha, aproximadamente 71ha foram destinados à
implantação dos lotes de
zoneamento residencial,
comercial, de uso misto e
Institucional (EPC –
Equipamento Público
Comunitário, e EPU – Equipamento Público Urbano). Os 99 ha restantes são constituídos pelo
sistema viário, áreas verdes e áreas públicas. A predominância de uso no
Centro Metropolitano de
Taguatinga é o
Institucional com
Equipamentos Públicos Comunitários, incluindo o Centro Administrativo do GDF,
Complexo Serejão, Ceilambódromo, campus da UnB, e o Parque Urbano, totalizando
cerca de 70% da área total dos lotes. O projeto então está compatível com as
principais atividades previstas na área, estabelecidas no PDOT/2009, como as
atividades econômicas, sociais e culturais. (TERRACAP, 2010.
p.74)
O GDF defende que a efetivação desse projeto descentralizará a
governança distrital, totalmente concentrada no Plano Piloto de Brasília,
fortalecerá a centralidade que a região que abarca as 3 RA’s acima mencionadas
representa e, com isso, minimizará o denso fluxo de veículos que se dirigem
diariamente para o centro da capital federal. O GDF se justifica por meio do
próprio Plano Diretor de Ordenamento Territorial do DF – PDOT-DF/2009, e afirma
que:
No que tange à estratégia de dinamização de
espaços públicos do PDOT/2009, o Centro Metropolitano [...] faz parte da Área de
Dinamização D02 – Eixo Taguatinga, onde se
objetiva estruturar atividades que consolidem a
função da área como segundo Centro Regional do
Distrito Federal, com usos residenciais, comerciais,
institucionais/coletivas e industriais. Essa estratégia de dinamização está
voltada à configuração da nova centralidade, visando o desenvolvimento urbano,
econômico e social, e a indução do crescimento local e regional (TERRACAP, 2010.
p. 44)
Figura 2 - Perspectiva do Centro Metropolitano
| |

3.
A LOCALIZAÇÃO DO CENTRO METROPOLITANO -
DF
Como indicado anteriormente, o Centro Metropolitano será
construído em uma área entre três importantes RA’s do Distrito Federal:
Ceilândia, Taguatinga e Samambaia. Esses aglomerados urbanos se distanciam
apenas 26 km do Plano Piloto de Brasília, e exercem forte centralidade no
cenário distrital, concentrando quase um milhão de moradores, o que representa,
de acordo com o portal eletrônico do GDF, cerca de 43%
da população total do DF. Em entrevista ao jornal local “Correio Braziliense”, o
atual governador do Distrito Federal declarou que a instalação do Centro
Metropolitano – e consequentemente do Centro Administrativo, com viés político –
na área determinada se caracteriza como “uma oportunidade de ver essa área
crescendo economicamente” . A esse
respeito, Cidade (1999), ao discorrer sobre as centralidades existentes na
dinâmica urbana do Distrito Federal para além do Plano Piloto, afirma
que:
O novo centro, localizado na área de confluência
de Taguatinga, Ceilândia e Samambaia, já se mostra capaz de representar uma
alternativa de crescimento da cidade, reduzindo a dependência do Plano Piloto
para atividades econômicas e geração de empregos e começando a mudar a
tradicional estrutura polinucleada (p. 247).

Figura 3 –Delimitação territorial de Taguatinga, Ceilândia e
Samambaia. Fonte: Terracap
A área em que o Centro Metropolitano será implementado está
inserida em uma região de dinamização, que recebe a denominação de “eixo de
oportunidades Ceilândia-Taguatinga” É estabelecido justamente na área mais
populosa do DF, principal polo atrativo para além do Plano Piloto. O objetivo
com o a criação desse eixo é justamente promover uma maior integração distrital,
do entorno e macrorregional, principalmente com relação ao ponto de vista
urbano. Ou seja, não é uma iniciativa cujos benefícios dela resultantes se
restrinjam aos limites territoriais do Distrito Federal, mas que favoreçam
também os municípios limítrofes às delimitações deste e que possam promover uma
maior e melhor articulação com toda a rede urbana do Centro-Oeste. A prioridade
não é investir apenas em escala local, mas fazer com que esse investimento tenha
rebatimento regional, principalmente.
O projeto desse empreendimento prevê investimentos em questões que
envolvem melhorias da mobilidade intra e interurbana, preservação ambiental,
investimentos em prol de uma maior dinamização econômica. A proposta é promover
um melhor desenvolvimento urbano que extrapole a escala local, e que seja
integrado, e não desarticulado, como ocorre geralmente, mas que tenha como
núcleo central a região que engloba as RA’s Ceilândia e Taguatinga.
Taguatinga, Ceilândia e Samambaia passam por um forte e rápido
processo de conurbação, fato que tem ocasionado o surgimento de uma crescente
mancha urbana no território do Distrito Federal:
[na capital federal] o processo de conurbação foi
rápido[...]. As localidades, assim, emendam umas nas outras, como aconteceu
entre Ceilândia e Taguatinga [...]. Além da conurbação entre Taguatinga e
Ceilândia, outras regiões se unem a essas duas cidades, como Guará, Vicente
Pires, Águas Claras e Samambaia. Elas se uniram em uma única mancha urbana sobre
o quadrilátero do Distrito Federal.

Figura 4 – Ilustração da mancha urbana existente na região que
abrange Taguatinga, Ceilândia e Samambaia. Fonte: Terracap
A centralidade que essas três RA’s em questão exercem atraem
inúmeros olhares do governo e também do setor imobiliário, que tem provocado o
crescimento da especulação na área em análise. Os agentes imobiliários têm
atuado com força principalmente após a aprovação e consequente início das obras
do Centro Metropolitano. Tendo em vista esse cenário, é compreensível o
interesse de investigar as colocações que a política urbana de cada uma dessas
RA’s discorre sobre a metropolização, dos processos dela decorrentes, e mesmo
sobre o próprio Centro Metropolitano, enquanto empreendimento de grande impacto
para o espaço urbano do Distrito Federal.
4.
QUESTÕES METROPOLITANAS E O CENTRO METROPOLITANO NOS PLANOS DIRETORES
DA III, IX e XII RA’s-DF
A questão aqui proposta foi verificar o que o PD das RA’s de
Ceilândia, Taguatinga Samambaia explicitam a respeito de questões metropolitanas
e da própria implementação do Centro Metropolitano, empreendimento de grande
importância para o espaço urbano distrital e regional. Contudo, antes de iniciar
uma análise propriamente dita do conteúdo dos principais instrumentos das
políticas urbanas indicadas, é necessário justificá-la.
O Estatuto da Cidade - Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001 –
estabelece que os municípios integrantes de Regiões Metropolitanas ou
aglomerações urbanas têm obrigatoriedade de formular Planos Diretores. Essa
mesma obrigatoriedade também é atribuída a todas as Regiões Administrativas do
DF, devido ao fato de comporem a RIDE-DF. A partir dessas informações, pode-se
inferir que PD’s de municípios pertencentes a Regiões Metropolitanas devam
incluir em suas diretrizes não apenas disposições acerca do planejamento urbano
em escala local, mas também sobre a dinâmica metropolitana na qual as cidades se
inserem. Contudo, poucos são os instrumentos básicos de políticas urbanas que
consideram explicitamente em seus conteúdos aspectos relacionados às questões de
caráter metropolitano, pois se limitam a análises intramunicipais. Sobre esse
aspecto, Shvasberg e Lopes reconhecem as limitações dos Planos Diretores, em
geral, quanto às considerações em relação à realidade metropolitana em que se
inserem, mas afirmam que a ênfase dada pelos PD’s para o ordenamento territorial
e urbano municipal não significa “que suas disposições possam ser desassociadas
e isentas com relação às dinâmicas sociais e econômicas que agem sobre o mesmo
território sobre o qual buscam incidir” (2011, p. 248). Incluímos às colocações
realizadas por esses autores o fato de que os PD’s deveriam também considerar
interferências de natureza espacial ao desenvolvimento urbano dos municípios,
tais como a instalação de empreendimentos de significativa importância regional
– como, por exemplo, a implementação do Centro Metropolitano, no caso da RIDE.
Por isso, é pertinente a realização de uma investigação a respeito de como essas
questões são tratadas nos Planos Diretores de Taguatinga, Ceilândia e Samambaia,
sendo estas importantes RA’s do cenário metropolitano do qual fazem parte.
Cronologicamente, o primeiro Plano Diretor que fez referência ao
Centro Metropolitano foi o de Taguatinga, aprovado pela Lei Complementar nº 90,
em 11 de março de 1998. De acordo com o Artigo 3º, caracterizam-se como alguns
dos objetivos deste instrumento de política urbana:
I – promover a dinamização territorial de
Taguatinga, em articulação com as Regiões Administrativas de Ceilândia e
Samambaia, localizadas na área central do eixo oeste-sudeste do Distrito
Federal, definido como Zona Urbana de Dinamização pelo PDOT;
III –
promover a integração físico-funcional entre Taguatinga, Ceilândia e
Samambaia.
Ainda relacionado aos objetivos do PD de Taguatinga, ganham
destaque as afirmações contidas no Artigo 4º, inciso I, que explicita “a criação
do Centro Regional como marco simbólico de dinamização e referência espacial de
uma Brasília contemporânea, o qual equilibre e compartilhe com o Plano Piloto as
funções de centralidade regional” como estratégia estabelecida pela lei. A
partir dessa afirmação, é possível inferir algumas questões. Primeiro: o termo
adotado para nomear o Centro Metropolitano é diferente, caracterizando-se como
“Centro Regional”, apesar de que a função deste não se diferenciaria daquela já
prevista para o empreendimento. Segundo: é reconhecido que as III, IX e XII
RA’s-DF representam uma área que exerce inegável centralidade em uma “Brasília
contemporânea”, qual seria, infere-se, uma Brasília metropolitana, considerada
assim para além dos limites do Plano Piloto.
Na primeira sessão do capítulo II do Título “Ordenamento
Territorial”, há diretrizes exclusivas para o que é denominado como “Área do
Centro Regional”, o qual estaria localizado na confluência de Ceilândia,
Taguatinga e Samambaia. Conforme estabelecido no Artigo
11:
O centro regional será objeto de projeto urbanístico especial e
atenderá às seguintes diretrizes:
I – integração entre Taguatinga, Ceilândia e
Samambaia;
II – criação de áreas com porte e características adequados à
implantação de atividades regionais diversificadas;
III – valorização dos espaços públicos destinados ao encontro
social, dando prioridade ao pedestre; [...]
X – integração entre as diversas áreas localizadas no interior do
Centro regional;
XI – compatibilização das características de centro Regional às
condicionantes ambientais, em especial Àquelas referentes
a)
à ARIE
Parque Juscelino Kubitschek;
b)
ao Estudo
Prévio de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto ao Meio Ambiente – EIA-RIMA
[...];
XIII – proposição de instrumentos de política urbana que
viabilizem a implantação do Centro Regional, por meio de parcerias entre o
governo e a iniciativa privada;
XIV – definição de diretrizes complementares para o entorno do
Centro Regional.
Ainda relacionado à integração entre as RA’s de
Ceilândia, Samambaia e Taguatinga, o artigo 17 do PD desta última afirma a
necessidade de se criar, por meio de um projeto urbanístico especial, a criação
de um Corredor de Atividades, que ligaria essas três RA’s através da construção
de um anel viário, “e da alteração do uso do solo, prolongando as
características de centralidade ao longo de seu
percurso”.
Por sua vez, o Plano Diretor – PD – de Ceilândia – RA IX- DF – foi
aprovado como lei complementar nº 314 no dia 1º de setembro de 2001. Assim como
todos os outros planos Diretores das Regiões Administrativas do DF, articula-se
com o próprio Plano Diretor de Ordenamento Territorial – PDOT/DF. Ao analisá-lo,
é possível verificar que algumas determinações são realizadas para que se
reconheça a cidade de Ceilândia como parte de uma área que engloba outras RA’s,
as quais se caracterizam como um dos principais polos centralizadores da
RIDE/DF. De maneira semelhante ao estabelecido no Plano Diretor de Taguatinga,
também se caracterizam como alguns dos objetivos do PD de Ceilândia a promoção
da dinamização territorial entre as RA’s adjacentes e a integração
físico-funcional das mesmas.
Ainda semelhantemente ao explicitado no Plano Diretor de
Taguatinga, inclusive apresentando redação idêntica a este, no capítulo II do PD
de Ceilândia, há uma seção com diretrizes exclusivas para o que é denominado
como “Área do Centro Regional”, o qual estaria localizado na confluência de
Ceilândia, Taguatinga e Samambaia. Conforme estabelecido no Artigo 10, que traz
atribuições para Ceilândia:
O Centro Regional será objeto de projeto urbanístico especial, e
atenderá às seguintes diretrizes, no que concerne à
Ceilândia:
I – integração urbana entre as cidades de Ceilândia, Taguatinga e
Samambaia;
II – criação de áreas com porte e características adequadas à
implantação de atividades regionais diversificadas;
III – dinamização das áreas localizadas às margens da Avenida
Centro-Norte;
IV – criação de área destinada à universidade pública, biblioteca
pública, museu e teatro;
V – valorização dos espaços públicos destinados ao encontro
social, dando prioridade ao pedestre e, em especial, à pessoa portadora de
necessidades especiais;
VI – compatibilização das características de centro regional às
condicionantes ambientais existentes [principalmente pelo fato de a construção
do centro ter sido designada para uma área de Relevante Interesse Ecológico –
ARIE Juscelino Kubitschek];
VII – dinamização das áreas de influência do
metrô;
VIII – proposição de instrumentos de política urbana que viabilizem a
implantação do Centro Regional, por meio de parcerias entre o Governo e a
iniciativa privada.
A partir de análises anteriormente expostas sobre o projeto em
vigor do Centro Metropolitano, elaborado pela Terracap, é possível afirmar que
ele considerou muitos dos aspectos previstos tanto no PD de Ceilândia quanto no
PD de Taguatinga que estivessem relacionados ao empreendimento de parceria
público-privada, em processo de construção no DF, principalmente no que se
refere à inclusão dos equipamentos urbanos de uso coletivo.
Após essa exposição sobre parte do conteúdo dos principais
instrumentos da política urbana de Ceilândia e de Taguatinga, é necessário
ressaltar que, para além de colocações diretamente referentes à implantação do
Centro Metropolitano ou Centro Regional, não foi possível verificar nos Planos
Diretores até agora analisados quaisquer menções sobre metropolização e questões
metropolitanas decorrentes desse processo.
Comparando o PD de Samambaia ao de Ceilândia e Taguatinga,
verificou-se que o conteúdo da política urbana dessa RA – Lei Complementar n°
370, de 02 de março de 2001 – não fez nenhuma referência ao Centro Metropolitano
(ou Centro Regional), tampouco discorreu acerca de questões metropolitanas tão
latentes no território do Distrito Federal, tais como a mobilidade, a promoção
de melhores equipamentos urbanos de benefício não apenas regional, mas que
supere os limites geográficos do quadrilátero do DF, dentre outras. De fato, as
únicas disposições contidas no Plano Diretor de Samambaia que interessaram a
essa investigação foi o fato de ser reconhecida a necessidade de repensar o
planejamento urbano não apenas local, mas em parceria com Taguatinga e
Ceilândia. Portanto, definiu como seus objetivos investir na integração
físico-territorial com as RA’s limítrofes, além de atuar para promover a
articulação e dinamização das mesmas (2001. p. 2), apesar de não explicitar como
quaisquer desses objetivos seriam alcançados.
De maneira geral, foi possível verificar que os Planos Diretores
em análise fizeram colocações referentes ou à implantação do Centro
Metropolitano ou à necessidade de planejar o território dos quais se referiam de
maneira conjunta, de modo a promover a integração física e funcional da região
que abrange Taguatinga, Ceilândia e Samambaia. Contudo, nada foi colocado sobre
questões metropolitanas, apesar de as RA’s do Distrito Federal comporem a RIDE,
a qual, como foi indicado anteriormente, é uma aglomeração urbana de caráter
metropolitano, o que justificaria a formulação inicial da hipótese de que os
planos diretores analisados nessa pesquisa pudessem considerar explicita e
claramente em seu conteúdo questões dessa natureza. Conforme verificaram
Shvasberg e Lopes,
Pode-se afirmar que o processo de metropolização
[no DF] se aprofunda [..]. Contudo, esse processo não encontra diálogo nem
respostas eficazes no planejamento e nas políticas públicas praticadas, tampouco
nos instrumentos legais aprovados ou em elaboração na legislação urbana do DF e
dos municípios que compõem a RIDE. Daí poder-se afirmar o paradoxo do caráter de
a metropolização ser ao mesmo tempo um processo concreto e complexo e a sua
institucionalidade primária, na forma da RIDE-DF [...] e o COARIDE – Conselho da
RIDE –, uma virtualidade (2011. p. 245).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em geral, pôde-se perceber que os PD’s de Samambaia, Ceilândia e
Taguatinga reconheceram que o território sobre os quais incidem consiste em uma
região de indiscutível importância para o desenvolvimento urbano do DF. Por
isso, o principal instrumento de política urbana dessas duas últimas RA’s fez
colocações explícitas com relação à implementação do que denominaram de “Centro
Regional”, que se refere ao Centro Metropolitano, como hoje é denominado.
Contudo, e apesar de essas três RA’s comporem a aglomeração de caráter
metropolitano denominada RIDE-DF, seus PD’s não expuseram quaisquer diretrizes
para um planejamento urbano que considerasse o próprio processo de
metropolização.
De acordo com o
Estatuto da Cidade, além da obrigatoriedade de terem PD’s, os municípios
brasileiros e as RA’s do DF também precisam revisar seus instrumentos básicos de
política urbana no mínimo a cada 10 anos, de modo que o planejamento urbano
local se adéque às novas dinâmicas espaciais, políticas e econômicas
estabelecidas cotidianamente. Por esse motivo, propõe-se que a revisão dos PD’s
de Taguatinga, Ceilândia e Samambaia – que já deveria ter ocorrido, tendo em
vista que as leis que os instituíram foram aprovadas há 14, 10 e 11 anos,
respectivamente – considere não apenas a implementação do Centro Metropolitano
nos conteúdos dos PD’s, mas também estabeleça novas diretrizes relacionadas ao
processo de metropolização do qual aqueles territórios participam
ativamente.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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314, de 1º de setembro de 2001. aprova
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