IMPACTOS CAUSADOS A
SAÚDE DO TRABALHADOR RURAL QUE MANIPULA AGROTÓXICOS
NA REGIÃO CACAUEIRA
DO SUL DA BAHIA
Elizabeth de Sousa
Soares
Resumo
O cultivo do cacau foi uma das principais atividades desenvolvidas
na Microrregião Sul da Bahia, a qual compreende os municípios de Ilhéus e
Itabuna. O plantio desse fruto contribuiu para o desenvolvimento dessas duas
cidades e as demais que estavam em seu entorno, bem como para colocar o Brasil
entre os maiores exportadores de cacau em nível internacional. Como a
monocultura do cacau foi uma das principais atividades agrícolas dos municípios
já mencionados, acreditamos que foi nessa lavoura que os trabalhadores rurais
começaram a utilizar agrotóxicos. Assim sendo, esta pesquisa de natureza
exploratória, se propõe a discutir a relação entre desenvolvimento territorial e
uso de agrotóxicos, pontuando o impacto causado na saúde do trabalhador rural da
região cacaueira, com a aplicação de agrotóxicos na cultura do cacau.
Fundamentam esta pesquisa os constructos teóricos de Bastos (1987), Asmar e
Andrade (1977), Flexor (2010), Santos (1955), Silva e Silva (2006); Silva, Silva
e Leão (1987), entre outros. Espera-se com a discussão aqui tecidas contribuir
para uma maior compreensão dos problemas econômicos e sociais enfrentados pela
região cacaueira, contribuindo para prevenção de agravos nas condições de
saúde dos trabalhadores rurais por
meio da mudança de comportamento, devido a conscientização dos riscos
ocupacionais ao manipular os agrotóxicos.
Palavras-chave: Territorialização.
Desenvolvimento. Região Cacaueira. Trabalhadores Rurais. Agrotóxicos.
Abstract
The cultivation of cocoa was
one of the main activities of micro-region in southern Bahia, which includes the cities of
Ilheus and Itabuna. The planting of fruit contributed to the
development of these two cities
and others that were around them, and placing Brazil among the largest exporters of
cocoa on the international level.
As the cocoa monoculture was one of the
main agricultural activities of
the municipalities mentioned above, we believe
that this crop was that rural workers began to use pesticides. Therefore, this exploratory research, is aimed at discussing the relationship between territorial
development and use of pesticides, scoring the impact on the health of rural workers of the cocoa region,
with the application of pesticides in the
cultivation of cocoa. Support
this research, the theoretical
constructs of Bastos (1987), Andrade and Asmar (1977),
Curl (2010), Santos (1955), Silva and Silva (2006), Silva, Silva and Leon (1987), among others. It is hoped that the discussion here
woven contribute to a better understanding of the economic and social problems faced by
the cocoa region, contributing to disease
prevention in health conditions of
rural workers through changes in
behavior due to awareness
of occupational hazards when
handling pesticides.
Keywords: Territorialization. Development. Cocoa Region Rural Workers. Pesticides.
Resumen
El
cultivo
del cacao
es
una de las
principales
actividades
de
la
micro-región
del
sur de Bahía,
que
incluye las ciudades
de
Ilhéus y de
Itabuna.
La
plantación de
frutales
ha
contribuido al desarrollo
de
estas dos ciudades
y
otros que fueron
alrededor
de ellos,
y
colocando
a
Brasil entre los
mayores
exportadores de
cacao
a
nivel internacional.
A
medida que el
monocultivo
del
cacao
fue
una de las
principales
actividades agrícolas de
los
municipios
mencionados
anteriormente,
creemos que este
cultivo
es
que los trabajadores
rurales
comenzaron
a utilizar
pesticidas.
Por
lo tanto,
esta
investigación exploratoria,
tiene
como objetivo discutir
la
relación
entre
el desarrollo
territorial
y
uso de plaguicidas,
anotando el
impacto en la
salud
de los trabajadores
rurales
de la región
de
cacao,
con la aplicación de
plaguicidas en
el
cultivo del cacao.
Apoyar
esta investigación,
los
constructos teóricos
de
Bastos
(1987),
Andrade
y
Asmar
(1977),
Curl
(2010),
Santos
(1955),
Silva
y
Silva
(2006),
Silva,
Silva
y
León
(1987),
entre otros. Se
espera que
la
discusión de este
tejido
de
contribuir
a
una
mejor comprensión de
los
problemas económicos y
sociales
que
enfrenta la región
de
cacao,
lo que contribuye a
la
prevención de enfermedades
en
las condiciones de
salud
de los trabajadores
rurales
a través de
cambios
en el comportamiento
debido
a la conciencia
de
los riesgos laborales
cuando
se manejan
pesticidas.
Palabras clave:
Territorialización.
Desarrollo. Región del
Cacao. Trabajadores rurales. Pesticidas.
1.
Introdução
As
primeiras lavouras de grande porte no Sul da Bahia foram de cacau, fruto que,
segundo Bastos (1987) e Cuenca e Nazário
(2004), é nativo das florestas tropicais da América Central. O nome da planta
“cacahuati” e da bebida “chocoatl”, segundo declaram Cuenca e Nazario (2004) foi
dado pelos antigos maias e astecas, povos que usavam a polpa dessa fruta para
preparar um suco muito parecido com o de cupuaçu e utilizavam as sementes
torradas para preparar uma pasta comestível que, desidratada podia ser
armazenada para uso posterior. A planta era tão valiosa para esses povos que era
usada como Acredita-se que a origem desse fruto seja a cabeceira da Bacia
Amazônica e que deste local tenha se dispersado ao longo do Rio Amazonas dando
origem ao cacau do tipo “Forasteiro” ou “Amelonado”e para a região norte e
nordeste, chegando aos Andes, América Central até o sul do México, dando origem
ao tipo conhecido como “crioulo” (BASTOS, 1987).
De acordo com Bastos (1987), oficialmente, o
cultivo do cacau no Brasil começou em 1679, através da Carta Régia que
autorizava os colonizadores a plantá-lo em suas terras. Em 1746, o colono
francês Luiz Frederico Warneau deu algumas sementes de cacau, do tipo
Amelonado-Forastero, ao fazendeiro Antônio Dias Ribeiro, o qual fez o primeiro
plantio na Fazenda Cubículo, atual Município de Canavieiras. Em 1752 foram
feitos os primeiros plantios no Município de Ilhéus, onde alcançou resultados
muito bons, posto que o fruto se adaptou muito bem ao clima e ao solo do Sul da
Bahia (CEPLAC, s.d) contribuindo para o povoamento da região, por atrair pessoas
que buscavam enriquecer. De fato a cultura do cacau enriqueceu a muitas famílias
e se tornou o pilar econômico da região, contribuindo para o crescimento desta
(CUENCA;NAZÁRIO, 2004).
Asmar e Andrade (1977) compartilham dessa mesma
opinião quando discutem o povoamento da região Sul da Bahia. Para esses
pesquisadores, apesar da grande quantidade de terras devolutas, a região era
carente de elemento humano. É com a exploração do cacau, produto agrícola de
valor internacional, que a região veio a tornar-se de fato atrativa. O cacau
tornou-se o “fruto de ouro” como denomina Bastos (1987) e pôs em queda outros
produtos agrícolas cultivados em pequena escala, como a mandioca, por exemplo,
tornando-se monocultura. Pensamento similar apresentam Moreira e Trevizzan
(2005) quando declaram que até o final dos anos 80, a lavoura cacaueira se
constituía a base da economia regional. A primeira atividade econômica da região
foi à extração do pau-brasil, seguida da cana-de-açúcar. Com a decadência da
monocultura da cana-de-açúcar, iniciou-se o plantio do cacau. As condições de
solo e clima foram determinantes no cultivo da lavoura cacaueira, cujas
plantações foram se estendendo a tal ponto que, já nos fins do século XIX,
constituíam-se no motor de engrenagem da econômica do sul baiano. Como a
monocultura do cacau foi o pilar econômico da microrregião cacaueira do Sul da
Bahia, também foi com essa lavoura que os trabalhadores rurais começaram a
utilizar agrotóxicos visando proteger o fruto do ataque de diversas pragas, em
especial, a vassoura-de-bruxa.
Assim sendo, esta pesquisa tem como objetivo
discutir a relação entre desenvolvimento territorial e uso de agrotóxicos,
pontuando o impacto causado na saúde do trabalhador rural da região cacaueira,
com a aplicação de agrotóxicos na cultura do cacau. Espera-se também identificar
dados relevantes registrados nos prontuários dos trabalhadores rurais, quando
atendidos nas Unidades de Saúde.
2. Territorizalição e desenvolvimento da região
cacaueira do Sul da Bahia
A palavra território, segundo estabelece Albagli (2004), designa o
espaço apropriado por um ator e que se define e se delimita por suas relações de
poder. É um espaço que se constrói
historicamente e remete a diferentes escalas. Assim sendo, a palavra território
abarca um espaço geográfico em sua dimensão física, isto é, diz respeito às
características geológicas do local; envolve a dimensão econômica, ou seja, as
formas de organização dos processos de produção, comercialização e consumo que
se realiza nesse local; uma dimensão simbólica, isto é, valores e crenças que
formam a identidade do povo que o habita; e, por fim, uma dimensão de caráter
político. Posição similar adota Theis (2008, p.13) ao afirmar que o termo
território alude a um “espaço delimitado por um dado conjunto de relações de
poder”. Diante do exposto, percebe-se que a noção de território é muito mais
ampla que a de espaço. Este último designa apenas um local de coordenadas
geográficas bem delimitadas, enquanto o primeiro corresponde a uma área
geográfica e todas as relações geológicas, econômicas, simbólicas e políticas
que se estabelecem nesse lugar. Diniz e
Duarte (1983) trabalham a noção de região de modo similar ao que nesta pesquisa
define-se como território. Para esses pesquisadores, o que se chama de região
cacaueira, é um espaço que foi construído através do tempo à medida que sua
economia foi se estabelecendo. Desse modo, comportamentos que se observam no
presente, trazem marcas profundas de um passado histórico.
Segundo discorrem Silva et al (1987), antes do
“boom” causado pelo cultivo do cacau, todos os núcleos urbanos costeiros
ligavam-se diretamente a Salvador. Contudo, a necessidade de coletar a produção
do cacau e concentrá-la em determinado ponto do espaço para facilitar a
exportação fez de ilhéus o centro urbano da cacauicultura durante a primeira
fase do apogeu. Isso foi decorrente da
localização geográfica da cidade de Ilhéus, a qual favoreceu a construção
do porto para escoar o material cultivado nas cidades de seu entorno.Marinho
(2005), ao estudar a relação do cacau e o desenvolvimento da região cacaueira,
comenta que este processo pode ser agrupado em duas etapas: a primeira fase, que
correspondeu à comercialização interna, em que o cacau era transferido das fontes
produtoras para os agentes exportadores e a segunda fase, que foi a da
exportação efetivada pelas casas exportadoras visando ao mercado consumidor, na
quase totalidade representado por países estrangeiros, no período de
1965-1980.
Marinho (2005) comenta ainda que as dificuldades
resultante dos problemas de transporte, por conta da falta de estradas, fizeram
emergir a figura dos intermediários que uniam produtores e exportadores, o que
reduzia os lucros dos produtores.
Entretanto, com a criação do Instituto de
Cacau da Bahia (ICB) em 1931 o problema de transporte na comercialização foram
resolvidos em cerca de cinco anos (1932-1936) já havia providenciado a
construção de uma rede rodoviária na zona do cacau, “constituída
de 531 Km, da qual já tinha construído 290 Km e reconstruído 82 Km de
antigas rodovias interiormente quase que intrafegáveis como, por exemplo, a
rodovia Ilhéus-Itabuna, ligando os dois principais centros urbanos da região”. O
pesquisador declara que o ICB teve um desempenho excepcional em relação ao
problema do transporte, considerando-se que em um período curto de tempo
integrou a região ao sistema viário do Estado da Bahia, assim como criou
condições satisfatórias “para o escoamento da safra, uma das questões mais urgentes da
região”.
Cuenca e Nazário (2004) ao tratar desse assunto,
declaram que o cacau adaptou-se muito bem ao clima e solos do Sul da Bahia,
trazendo muita prosperidade para a região de Ilhéus, constituindo-se num dos
pilares fundamentais para o enriquecimento de muitas famílias de cacauicultores,
cooperando singularmente para o desenvolvimento regional. Lemos e Trevizzan
(2005), compartilham do mesmo pensamento comentam que o cultivo do cacau
contribuiu para o processo de urbanização das cidades do Sul da Bahia, pois,
toda uma infra-estrutura urbana foi montada para atender aos interesses dos
fazendeiros e exportadores do cacau, como exemplo, mencionam a construção da
ferrovia Itabuna/Ilhéus e a ampliação do Porto e das rodovias vicinais. A
cultura do cacau foi rapidamente absorvida pelo mercado externo, tornando-se a
base da economia regional.
A cultura cacaueira trouxe benefícios para todo o
país, colocando o Brasil na nona
posição no ranking mundial de exportação do cacau. Há que se ressaltar,
entretanto, que a produção era uma atividade dos médios e grandes produtores,
pois até os anos de 1990 as áreas cultivadas chegavam aos 100 hectares. Ou seja,
por mais que toda a região tenha crescido e se desenvolvido com o cultivo do
cacau, a concentração maior de riqueza ficava com os grandes fazendeiros, com os
ricos coronéis. Essa disparidade de acúmulo de posses não era tão notória
enquanto todos podiam indistintamente usufruir da riqueza gerada pelo cacau.
Contudo, a partir do final da década de 80 do século passado, com a crise gerada
pela vassoura-de-bruxa, os pequenos trabalhadores rurais, sentiram muito mais
intensamente os prejuízos por conta da região ter se concentrado apenas no
cultivo de um único produto.
O desenvolvimento da região cacaueira do Sul da
Bahia, assim como o Brasil como um todo, produziu o que Albagli (2004) chama de
“ilhas de prosperidade”. Na verdade, produziu uma minoria de pessoas
excessivamente prósperas e uma maioria pobre e bastante explorada, a saber, os
trabalhadores rurais. Esses fatos confirmam a “Teoria Marxista da Dependência”, a
qual estabelece que o modo de produção capitalista é intrinsecamente desigual e
excludente, ou seja, gera acumulação de bens para uns e pobreza para outros.
Aplicando-se este postulado à região cacaueira do Sul da Bahia, observa-se que
neste território o capitalismo propiciou o acúmulo de riqueza por parte dos
coronéis à custa da pobreza do trabalhador rural, o qual era intensamente
explorado (MARTINS, 2001; GRACIOLLI & DUARTE,
2009).
2.1 Vassoura-de-bruxa e uso de
agrotóxicos
Com o advento do fungo chamado vassoura-de-bruxa, cujo nome
científico é Crinipellis perniciosa,
ocorreu o declínio da produção de cacau que passou de 400 mil toneladas ao ano
para cerca de 120 mil. Com isso, o cacau foi perdendo valor no cenário
internacional e o Governo Federal perdeu o interesse nessa planta e passou a
subsidiar o cultivo de outros produtos que trariam maior retorno financeiro
(NASCIMENTO et al, 2009; MELLO, 2010).Essa doença, a princípio, se limitava à Região Amazônica e foi
detectada no Sul da Bahia no ano de 1989, exatamente no município de Uruçuca,
distante 40 km da cidade de Ilhéus. Começou de forma tímida, mas foi se
alastrando pelas cidades produtoras, causando pavor aos produtores, aos
técnicos-cientistas, e à população
em geral. Desde a descoberta da doença, a CEPLAC tem concentrado esforços para
banir a doença ou ao menos gerar mudas de cacau resistentes ao fungo.
Há que se mencionar que a vassoura-de-bruxa aliada à baixa do preço do
cacau no mercado internacional desencadeou uma devastadora crise econômica e
sócio-ambiental. “Muitos produtores de cacau abandonaram as plantações,
resultando numa migração massiva de pequenos produtores e trabalhadores rurais
para a periferia das grandes cidades, que tem no setor de serviços, maiores
oportunidades de emprego” (MELLO, 2010).
Moreira e Trevizzan (2008)
comentam que, por conta da vassoura-de-bruxa, “o número de empregos diretos e
indiretos sofreu uma rápida redução de 400 mil para apenas 150 mil, gerando
tensões sociais no campo e na cidade em dez anos”. Foi para combater esses
problemas que os trabalhadores rurais começaram a manipular agrotóxicos.
Em se tratando dos agrotóxicos importa mencionar que estes se constituem
num dos mais importantes fatores de riscos para a saúde humana. Sua produção em
escala em escala industrial teve início em 1930, intensificando-se a partir da
década de 40. Desde então, surgiram inúmeros grupos de substâncias químicas para
combater as pragas e doenças presentes na agricultura, o que levou a existir
hoje cerca de 3.500 ingredientes ativos de agrotóxicos, distribuídos em 35.00
diferentes produtos no mercado mundial (OMS, 1994).
Os agrotóxicos foram criados, na tentativa de
defender a agricultura contra pragas que atacam as plantações. A utilização de
agrotóxicos teve inicio na década de 20 e, durante a segunda guerra mundial,
eles foram utilizados até como arma química, SILVA et al. (2005) Os agrotóxicos
são substâncias químicas (herbicidas, pesticidas, hormônios e adubos químicos)
utilizadas em produtos agrícolas e pastagens, com a finalidade de alterar a
composição destes e, assim, preservá-los da ação danosa de seres vivos ou
substâncias nocivas. No Brasil, a sua utilização tornou-se evidente em ações de
combate a vetores agrícolas na década de 60. Alguns anos depois, os agricultores
foram liberados a comprar este produto de outros países. Quando bem utilizados,
os agrotóxicos impedem a ação de seres nocivos, sem estragar os alimentos.
Porém, se os agricultores não tiverem alguns cuidados durante o uso ou
extrapolarem no tempo de ação dos agrotóxicos, estes podem afetar o meio
ambiente e a saúde. O Brasil é hoje um dos maiores compradores de agrotóxicos do
mundo e as intoxicações por estas substâncias estão aumentando tanto entre os
trabalhadores rurais que ficam expostos, como entre pessoas que se contaminam
através dos alimentos.
A Organização Mundial de Saúde, (1994), diz que
alguns estudos já relataram a presença de agrotóxicos no leite materno, o que
poderia causar defeitos genéticos nos bebês nascidos de mães contaminadas. Ainda segundo a OMS (1994) estes
agrotóxicos poderão ser encontrados em vegetais: verduras, legumes, frutas e
grãos, como também em alimentos de origem animal (leite, ovos, carnes e frangos)
que podem conter substâncias nocivas chegando a contaminar a musculatura, o
leite e os ovos originados do animal, quando este se alimenta de água ou ração
contaminada. Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o uso
intenso de agrotóxicos levou à degradação dos recursos naturais - solo, água,
flora e fauna - em alguns casos de forma irreversível, levando os desequilíbrios
biológicos e ecológicos. Além de agredir o ambiente, a saúde também pode ser
afetada pelo excesso destas substâncias e quando mal utilizados, os agrotóxicos
podem provocar três tipos de intoxicação: aguda, subaguda e crônica.
Na intoxicação aguda, os sintomas surgem
rapidamente, algumas horas após a exposição excessiva, por curto período, a
produtos altamente tóxicos. Podem ocorrer de forma branda, moderada ou grave,
dependendo da quantidade do veneno absorvido. Os sinais e sintomas são nítidos e
objetivos. A intoxicação subaguda é ocasionada por exposição moderada ou pequena
a produtos altamente tóxicos ou medianamente tóxicos. Tem aparecimento mais
lento e os principais sintomas são subjetivos e vagos, tais como dor de cabeça,
fraqueza, mal-estar, dor de estômago e sonolência. A intoxicação crônica
caracteriza-se por ser de surgimento tardio, após meses ou anos de exposição
pequena ou moderada a produtos tóxicos ou a múltiplos produtos, acarretando
danos irreversíveis como paralisias e neoplasias. Dada a grande diversidade de
produtos, em cerca de 300 princípios ativos em duas mil formulações comerciais
diferentes no Brasil, é importante conhecer a classificação dos agrotóxicos
quanto à sua ação e ao grupo químico a que pertencem. Essa classificação também
é útil para o diagnóstico das intoxicações e instituição de tratamento
específico, FUNASA (2002).
1.0 Inseticidas: possuem ação
de combate a insetos, larvas e formigas. Os inseticidas pertencem a quatro
grupos químicos distintos:
1.1 Organofosforados: esse grupo é o
responsável pelo maior número de intoxicações e mortes no país. São compostos
orgânicos derivados do ácido fosfórico, do ácido tiofosfórico ou do ácido
ditiofosfórico. Exemplo: Folidol, Azodrin, Malation, Diazinon, Nuvacron,
Tamaron, Rhodiatox.
1.2 Carbamatos: são derivados do ácido
carbâmico. Exemplo: Carbaril, Temik, Zectram,
Furadan.
1.3 Organoclorados: são compostos à
base de carbono, com radicais de cloro. São derivados do clorobenzeno, do
ciclo-hexano ou do ciclodieno Foram muito utilizados na agricultura, como
inseticidas, porém seu emprego tem sido progressivamente restringido ou mesmo
proibido. Exemplo: Aldrin, Endrin, BHC, DDT, Endossulfan, Heptacloro, Lindane,
Mirex.
1.4 Piretróides: são compostos
sintéticos que apresentam estruturas semelhantes à piretrina, substância
existente nas flores do Chrysanthemum (Pyrethrun) cinenarialfolium. Alguns
desses compostos são: aletrina, resmetrina, decametrina, cipermetrina e
fenpropanato. Exemplo: Decis, Protector, K-Othrine,
SPB.
2.0 Fungicidas: tem ação de combate a fungos. Existem muitos fungicidas
no mercado. Os principais grupos químicos são:
2.1 Etileno-bis-ditiocarbamatos:
Maneb, Mancozeb, Dithane, Zineb, Tiram.
2.2 Trifenil estânico: Duter e
Brestan.
2.3 Captan: Ortocide e
Merpan.
2.4
Hexaclorobenzeno.
3.0 Herbicidas: combatem ervas
daninhas. Nas últimas duas décadas, esse grupo tem uma utilização crescente na
agricultura. Seus principais representantes são:
3.1 Paraquat: comercializado com o
nome de Gramoxone.
3.2 Glifosato:
Round-up.
3.3 Pentaclorofenol.
3.4 Derivados do ácido fenoxiacético:
2,4 diclorofenoxiacético (2,4 D) e 2,4,5 triclorofenoxiacético (2,4,5 T). A
mistura de 2,4 D com 2,4,5 T representa o principal componente do agente
laranja, utilizado como desfolhante na Guerra do Vietnã. O nome comercial dessa
mistura é Tordon.
3.5 Dinitrofenóis: Dinoseb,
DNOC.
4.0 Outros grupos importantes
compreendem:
4.1 Raticidas: (Dicumarínicos):
utilizados no combate a roedores.
4.2 Acaricidas: ação de combate a
ácaros diversos.
4.3 Nematicidas: ação de combate a
nematóides.
4.4 Molusquicidas: ação de combate a
moluscos, basicamente contra o caramujo da
esquistossomose.
4.5 Fumigantes: ação de combate a
insetos, bactérias: fosfetos metálicos (Fosfina) e brometo de metila.
Os agrotóxicos são
classificados, ainda, segundo seu poder tóxico. Esta classificação é fundamental
para o conhecimento da toxidade de um produto, do ponto de vista de seus efeitos
agudos. No Brasil, a classificação toxicológica está a cargo do Ministério da
Saúde, FUNASA (2002).
A seguir poderemos ver a classificação
toxicológica com a "Dose Letal 50" (DL50), comparando-a com a quantidade
suficiente para matar uma pessoa adulta.
Quando o agrotóxico é extremamente tóxico, o rótulo de seu recipiente é
vermelho, a dose letal será 5
mg/kg ou seja 01 pitada referente a
algumas gotas suficiente para matar uma pessoa adulta. Quando o agrotóxico é
altamente tóxico, o rótulo de seu recipiente é amarelo, a dose letal será 5/50,
ou seja, algumas gotas referentes a uma colher de chá será suficiente para matar
uma pessoa adulta. Quando o agrotóxico é
medianamente tóxico, o rótulo de seu recipiente é azul e a dose letal será
50/500, ou seja, uma colher de chá é equivalente a 02 colheres de sopa que será
suficiente para matar uma pessoa adulta.
3. Materiais e métodos
Trata-se de uma pesquisa quantitativa de
abordagem descritiva exploratória, cuja coleta de dados secundários deu-se em
sistemas de informações oficiais – prontuários médicos dos trabalhadores rurais
que buscam atendimento nas unidades de saúde da Comissão Executiva do Plano da
Lavoura Cacaueira – CEPLAc. Os dados primários foram coletados por meio da
aplicação de questionários aos trabalhadores rurais. Foram selecionados 135
prontuários para trabalharmos os dados para a pesquisa, mas somente 50
prontuários eram de trabalhadores rurais que manipulavam agrotóxicos na
plantação de cacau. Assim sendo, o questionário fechado foi aplicado apenas a
esses 50 trabalhadores.
4. Resultados e discussões
Os resultados obtidos mediante a análise dos
prontuários dos trabalhadores rurais que manipulavam agrotóxico permitiram
constatar que apenas 13 (6,5%) registravam queixas sugestivas ao manuseio com o
produto referido, conforme expressa o gráfico 1, exposto a
seguir:

Gráfico
1: Amostragem dos Prontuários dos Trabalhadores
Rurais.
Acreditamos,entretanto, que esse número seja bem
maior, pois muitos trabalhadores rurais não sabem quais problemas o uso de
agrotóxicos pode trazer para sua saúde.
Em relação aos sintomas mais comuns decorrentes
do uso de agrotóxicos, a cefaléia é a que apresenta maior índice -19%-, seguido
de vômitos e diarréia, os quais somam cada um 11%.

Gráfico 2: Problemas de Saúde (Manipulação de Agrotóxicos).
Após as análises dos prontuários, efetuamos as
entrevistas desses 50 trabalhadores rurais que manuseavam agrotóxico. Segundo é
possível observar no gráfico abaixo, 100% são do sexo masculino, posto que
atividades que demandam maior esforço, como o trabalho rural, são geralmente
realizadas por homens.

Gráfico 3: Sexo dos
entrevistados.
No que diz respeito ao período de tempo com o qual vem lidando com
os agrotóxicos, 100% afirmaram que
utilizam esses insumos agrícolas há mais de 10
anos.

Gráfico 4: Tempo de uso dos
agrotóxicos
Quando indagados sobre os agrotóxicos mais
utilizados, os nomes mais citados foram de dois herbicidas: Gramoxone e
Round-up, ambos correspondendo a 50% de indicação por parte dos sujeitos
entrevistados. Há que se ressaltar, entretanto, que eles mencionaram o nome de
fantasia desses produtos, na verdade o que eles gostariam de dizer é que
manuseiam Paraquat (comercializado como Gramoxone) e Glifosato (comercializado
com o nome de Round-up).

Gráfico 5: Agrotóxicos mais
utilizados
Perguntamos, em seguida, se esses produtos que
eles utilizavam eram aprovados pelo Ministério da Agricultura com o uso que eles
estavam destinando e 100% dos entrevistados não souberam informar, conforme
expressa o gráfico seguinte:

Gráfico 6: Aprovação
do produto pelo Ministério da Agricultura.
Esses dados só vem a confirmar o fato de que os
trabalhadores rurais têm manuseado agrotóxicos sem treinamento adequado e sem
conhecimento das utilidades desses produtos e dos riscos que estes causam à
saúde humana e à natureza.
No tocante ao destino dos vasilhames de
agrotóxicos, obtivemos outro dado agravante: 100% dos trabalhadores rurais
ignoram as recomendações do Ministério da Agricultura e dos fabricantes dos
produtos de não reutilizarem os vasilhames. Ao contrário, usam-nos como
reservatório de água para consumo de pessoas e animais, entre outras
destinações.

Gráfico 7: Destino
dos vasilhames de agrotóxicos
Em relação ao uso dos EPI (Equipamento de
Proteção Individual), os entrevistados
disseram que não os utilizam, apesar de terem recebido treinamento para
usá-los. Eles acreditam que sabem como usar esses produtos e, por isso, esses
equipamentos são irrelevantes.

Gráfico 8: Destino
dos vasilhames de agrotóxicos.
Por fim, nossa última pergunta foi referente à
possibilidade de manter uma lavoura de cacau sem o uso de pesticidas. 100% dos
entrevistados disseram que isso era impossível e era justamente para combater
“matos brabos” e garantir uma boa safra que usavam os
agrotóxicos.

Gráfico 9:
Possibilidade de manter uma lavoura sem uso de
agrotóxico.
Conclusão
Com a realização dessa pesquisa, foi possível
perceber que o desenvolvimento econômico do território da Microrregião do Sul da
Bahia foi de fato impulsionado pelo cultivo do cacau. Contudo, esse
desenvolvimento econômico gerou riqueza para uma minoria de coronéis, de grandes
produtores rurais. Os trabalhadores rurais, entretanto, que foram os grandes
responsáveis diretos pelo desbravamento das terras, plantio e cuidado da
lavoura, não receberam a devida atenção, nem foram alvo das políticas públicas.
Sem uma orientação precisa quanto ao manuseio dos
agrotóxicos, os quais as empresas vendem como sendo “defensivos agrícolas”, os
trabalhadores rurais fazem uso desses insumos agrícolas sem o uso dos
Equipamentos de Proteção Individual e ainda reutilizam os vasilhames,
contrariando as normas do Ministério da Agricultura. Os sujeitos entrevistados declararam que
usam os agrotóxicos para combater os “matos brabos” que surgem na
lavoura-cacaueira, para combater a vassoura-de-bruxa, mas fazem isso
indiscriminadamente, sem respeito à legislação que regulamenta o uso dessas
substâncias químicas. Falta um treinamento desses trabalhadores para que estes
saibam quando e como usar agrotóxicos e mais, é preciso mostrá-los outras formas
mais saudáveis de cuidado da lavoura, pois estes consideram que não é possível
manter uma lavoura sem o uso desses insumos que causam tantos danos ao
meio-ambiente e à saúde humana.
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