EDUCAÇÃO E TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS: SENSIBILIDADE
ECOLÓGICA
E TRANSFORMAÇÕES NAS RELAÇÕES EDUCAÇÃO, TRABALHO E MEIO
AMBIENTE
Helder Baruffi
Mestre em Direito pela PUC/SP e Doutor em Educação pela
USP
Professor Associado da
Faculdade de Direito e Relações Internacionais da UFGD
Resumo: No conjunto de transformações sociais visualizadas
nas relações trabalho e educação numa sociedade globalizada e dependente, o
presente artigo busca refletir, a partir da percepção de uma “agonia planetária”
a importância de uma educação emancipatória, vista como prática de liberdade.
Para tanto, explicita, a um tempo, o caráter ideológico da “educação para o
trabalho”, reificado, enquanto mão de obra, expropriador da natureza, e de
outro, sinaliza por uma ética da responsabilidade, em que meio ambiente,
trabalho e educação constituem-se totalidades e emancipação, numa sociedade de
risco.
Resumen: En el conjunto de relaciones sociales mostradas
en el trabajo y la educación en una sociedad globalizada y dependiente, este
artículo pretende reflejar, desde la percepción de una "agonía planetaria" la
importancia de la educación emancipadora, vista como la práctica de la libertad.
Con este fin, explícita, a un tiempo, el carácter ideológico de la "educación
para el trabajo," reificado, expropiación de la naturaleza, y otra, las señales
por una ética de responsabilidad, donde el medio ambiente, trabajo y educación
son un todo y emancipación, en una sociedad de riesgo.
Abstract: In the set of social transformations viewed in
the relationships between work and education within a globalized and dependent
society, this article aims to reflect, from the perception of a "planetary
agony" the importance of emancipatory education, seen as practice of freedom. To
do so, explicitly, at a time, the ideological character of "education for work,"
reified, while labor, expropriator of nature, and at another, signals for an
ethic of responsibility, where the environment, labor and education constitute
wholes and emancipation, in a risk society.
1.
Introdução
Para a ciência da história não há nenhuma pedagogia à parte da
própria materialidade, ou seja, do particular movimento histórico dos homens. É
nesse movimento de produção do existir que se torna possível a compreensão do
homem como um ser de relações. Nesse sentido, compreender as transformações
sociais implica assimilar o movimento histórico e implica saber da produção do
conhecimento e de como se processam as relações do homem com a natureza,
transformando-a e a si próprio (MARX & ENGELS, 2007; KOSIK,
1976).
Como atividades próprias da natureza humana, trabalho e educação
compõem uma totalidade do modo de produção da própria existência e das relações
interpessoais. Historicamente determinado, o homem é compreendido no contexto
destas relações, complexas, muitas vezes contraditórias e nem sempre apreendidas
no cotidiano do processo educativo.
É questão recorrente, seja numa dimensão filosófica, psicológica ou
metodológica. As relações que se estabelecem entre trabalho, educação e meio
ambiente são muito estreitas e se recolocam a cada momento, principalmente
quando se enseja proceder a uma análise das transformações sociais, presentes à
totalidade concreta da pessoa humana, agente histórico. Constituem elementos
dessa totalidade e, como tal, expressam a produção humana, conservando o caráter
dialético dos fenômenos existentes na estrutura social. Geram novas e constantes
exigências que, captadas, antecipam um modo de ser futuro, determinando tarefas
para o presente. Essa relação reclama pensar a natureza contraditória da
subjetividade humana e seu movimento de superação das mediações históricas e
sociais e demanda pensar as complexas relações que se estabelecem entre capital
e trabalho e desenvolvimento.
Assim, importa considerar as mediações que ocorrem no interior das
instituições da sociedade, como filtragem de uma concepção social de
regularidade e cadência, de uma concepção econômica e política historicamente
reconhecida, para uma abstração de interesse do próprio modo de produção, cujas
formas têm variado ao longo da história. A educação não da conta de todas essas
mediações, na medida em que os modelos sobre os quais as mediações se apoiam,
acabam caindo, muitas vezes, na explicação simplista daquilo que é possível
perceber no interior do processo produtivo, normalmente marcado por uma busca de
reprodução das relações de trabalho e criação de bens e de serviços capazes de
suprir as necessidades econômicas do homem. Este procedimento implica mais do
que uma reprodução de coisas, a tentativa de reprodução do movimento do capital
social dentro de um processo globalizante, envolvente, fixado em diferentes
momentos. Esta assimilação se processa muito cedo. Família, escola e trabalho
fazem parte destes mediadores.
É certo que, no limite das primeiras aprendizagens, este processo de
interiorização se desenvolve com maior intensidade (BERGER; LUCKMANN, 2002). A
criança que aprende a ler vai fazer parte da sociedade e conviver de modo
diferente daquela que não aprende a ler, assim como aquela que ingressa
prematuramente no mercado produtivo vai fazer parte da sociedade e conviver de
modo diferente daquela outra cujo ingresso se dá após um longo processo mediado
pela família e pela escola.
Independentemente da tomada de consciência, o ingresso na sociedade
organizada se dá mediado e os resultados destas mediações estarão presentes
quando da inserção no mercado de trabalho, na constituição e organização da
família. Constituirão o ritmo e a dinâmica de satisfação e realização pessoal e
profissional, compondo elementos de análise dos atores sociais na escola e na
sociedade. Essas mediações se particularizam, também, na própria fala dos
educadores, no atribuírem um sentido à prática.
Dentro do complexo e globalizado modo de produção econômica, a
relação trabalho, educação e meio ambiente assume importância por responder
diretamente pela questão fundamental da existência humana - o trabalho. Porém,
esse movimento de apreensão das relações do homem com a natureza não se
consolida na direção da libertação do homem frente à natureza. Ao contrário,
ocorre pela subjugação do homem ao trabalho repetitivo, ao trabalho mecânico, ao
trabalho fragmentado e à destruição do meio ambiente, pela exploração
irresponsável dos bens naturais e pela produção, também irresponsável, de
excrementos que tornam estéril a vida no planeta Terra (JONAS, 2006).
A consolidação do pensamento hegemônico não é um movimento linear.
Diferentes atores intervêm no processo e, dentre eles, o Estado. Como mediador
do processo produtivo, busca operacionalizar estratégias que fundamentem e
direcionem o equilíbrio entre capital e trabalho, visto, é evidente, sob a ótica
da reprodução, da concepção de trabalho simplificado na atividade produtiva
formalmente organizada, em trabalho e seu produto que “emprestam certa
permanência e durabilidade à futilidade da vida mortal e ao caráter efêmero do
tempo humano” (ARENDT,1993, p. 16) .
Este reducionismo do conceito trabalho produz um saber técnico e
instrumental, voltado para uma finalidade objetiva: qualificação da mão de obra
e uma forma de produção que não considera as consequências para a
natureza.
Embora o modo de produção encontre formas próprias de distribuição do
conhecimento, as instituições formais de educação constituem-se instrumentos de
reprodução, em particular voltados para o fornecimento de algumas habilidades
básicas para o trabalho. A estrutura formal de educação, tradicional, moderna ou
progressista, adapta-se aos novos tempos e às novas exigências, sempre na
expectativa do mercado e não como uma autonomia própria.
O conhecimento tem sido desenvolvido em função desses interesses de
produção e reprodução, concentrado mais em uma parcela da sociedade,
contribuindo para justificar desigualdades.
Na perspectiva das transformações sociais, cabe à educação uma
participação efetiva, cujo conhecimento imediato é dado pela apreensão da
microfísica do poder institucionalizado (FOUCAULT, 2008). A educação, de forma
recorrente, tem primado por bases teóricas que enfatizam o individualismo e uma
visão coisificada do trabalho (Por todos: FRIGOTTO, 2001; 2003). É através da redefinição da relação
trabalho e educação que se torna possível pensar numa prática transformadora
numa sociedade complexa e em mudança.
2 Uma perspectiva pedagógica
O valor teórico-prático da ação educativa não é evidenciado na
escola. A relação trabalho-educação constitui-se questão para a escola na medida
em que o trabalho assume um papel definidor dessa relação, como elemento
teórico-prático e político da ação pedagógica.
O trabalho compreendido como princípio educativo (GRAMSCI, 1987),
próprio da escola que não separa trabalho e educação, mas os concebe como
unitário, é o modo próprio do homem participar ativamente da vida da natureza,
para transformá-la e socializá-la. Assumir o trabalho como um elemento
teórico-prático e político da ação pedagógica é superar a visão ou o conceito de
escola vista como um apêndice da vida do aluno, um espaço intermediário entre a
família e a infância, entre o trabalho e o mundo adulto e concebê-la como
integrada ao processo evolutivo do indivíduo, na perspectiva existencial e
vivente do indivíduo. Trabalho, educação e meio ambiente por sua vez, compõem um
único aspecto da vida do indivíduo e fazem parte da história
social.
O elo teoria-prática está na base de sustentação da unidade entre
trabalho-educação-meio ambiente, contrapondo-se ao pensamento fracionado e
parcelar de educação para o trabalho, em que este, reificado, torna-se objeto
central dos interesses gerados no interior da sociedade
produtiva.
Esse elo teoria-prática encontra, no cotidiano da educação, uma
possibilidade de socialização das transformações que produzem. Essa relação
trabalho-educação-meio ambiente, na dimensão do teórico e na dimensão do
prático, produção e socialização do conhecimento, apresenta-se como unidade e
não em dimensões antagônicas.
A repetição paciente e sistemática é um princípio metodológico
fundamental: mas não a repetição mecânica, obsessiva, material (GRAMSCI, 1982,
p. 174). É a repetição que se volta para a apreensão dos princípios, para a
adaptação de cada conceito às diversas peculiaridades e tradições culturais.
Essa repetição paciente e sistemática objetiva a apresentação e reapresentação
do conteúdo, dos fatos, dos conceitos em todos os seus aspectos positivos e em
suas negações tradicionais, relacionando sempre cada aspecto parcial à
totalidade. Visa a descobrir a unidade real sob a aparente diferenciação e
contradição, bem como descobrir a substancial diversidade sob a aparente
identidade.
A educação em sua perspectiva formativa não se limita à simples
enunciação teórica de princípios a serem assimilados pelos indivíduos. Daí a
necessidade do princípio educativo de apreensão dos elementos essenciais e
contraditórios, articulados e graduados num movimento de dedução e indução,
identificação e distinção, demonstração positiva e destruição do velho, num
processo de síntese reconstrutiva. Esse processo não se realiza de modo
abstrato, mas sim concreto, sobre a base do real e da experiência efetiva.
(Idem, p. 174).
Nesta direção, a educação escolar assume uma dimensão social que
extrapola a dimensão do simples preparar para a atividade profissional --
atributo este reduzido a um conceito de trabalho cujo estranhamento ao indivíduo
trabalhador está presente desde a sua concepção --, contribuindo para a
descoberta de como enfrentar as contradições que estão na base da pobreza, da
miséria, da ignorância, e que constituem aspectos não enfrentados pelo
pensamento utilitarista.
A superação desta perspectiva de educação voltada para a formação de
indivíduos sem ideias gerais, sem cultura geral, apenas com olhos infalíveis e
uma mão firme, centrada num ofício, numa perspectiva de trabalho em que a
dimensão histórico-cultural é substituída pela dimensão prático-utilitária, só é
possível pela inversão metodológica da relação educativa frente ao trabalho e
suas interrelações com o meio ambiente, inversão que pressupõe “o conceito e o
fato do trabalho (da atividade teórico-prática) como princípio educativo
imanente à escola [..]” (Idem, p. 130).
A escola como limitadora do desenvolvimento é fortemente criticada,
em particular por Gramsci que a quer capaz de formar “homens completos e não
meio-homens ou homens de casos específicos, de uma única atividade” (MANACORDA,
1990). Gramsci propugna por uma escola voltada não para a busca de uma relação
instrumental entre a educação e o trabalho, mas para a superação desta dimensão
fragmentada de conceber a educação que prepara para o futuro, ou mesmo que tenha
este sentido de preparar para alguma coisa, sem compreender que o homem se
completa na sua ação.
O trabalho deve estar no centro da ação humana, seja ele intelectual
ou físico, porque é pelo trabalho que o homem se constrói. O homem inteiro
proposto é o homem voltado para a construção de si próprio, que dedica as suas
forças para atingir este fim. Por isso, a exigência de rigor intelectual, método
e disciplina, elementos que permitirão ao indivíduo o progresso intelectual pelo
qual o homem será educado a ser não mais o homem de uma única atividade, mas o
homem completo.(MANACORDA, 1990, pp. 30-49).
O conceito de equilíbrio entre o social e o natural sobre os
fundamentos do trabalho, da atividade teórico-prática do homem, cria os
primeiros elementos de uma intuição do mundo afastada das crenças que submetem o
homem a uma dimensão puramente material ou a uma dimensão puramente intelectual
e fornece o ponto de partida para o “desenvolvimento de uma concepção
histórico-dialética do mundo” (GRAMSCI, 1982, p. 130).
Para o trabalhador, o conceito de trabalho produzido pela escola e o
conceito de trabalho na sua perspectiva existencial têm dimensões diferentes.
Trabalho significa método, rigor intelectual, disciplina, transformação, vida. A
educação, entretanto, apresenta-se como um não trabalho. Esta contradição assume
valores muito fortes para o trabalhador, na medida em que vê, na escola, um
momento de passagem, de espera, de não produção da existência, porque a escola
não trabalha com a vida, não produz vida, não se torna vivente, não toma o
indivíduo sob o aspecto da existência.
Considerando-se a realidade social, a educação pressupõe uma relação
de colaboração educativa, de trabalho partilhado na escola, constituindo-se
fonte de aprendizado que não se resume a conceitos teóricos ou a exercícios
práticos, mas que dizem dessa realidade presente em cada indivíduo, construtor
do seu conhecimento. Na escola, o nexo instrução-educação somente pode ser
representado pelo “trabalho vivo do professor” (Ibidem, p.
132).
Não é somente mudar o enfoque desta relação. É, antes de tudo, mudar
os conceitos que embasam a organização da educação, que fundamentam a
organização curricular e a prática educativa do professor, no sentido de superar
a dimensão retórica na qual a educação formal está organizada. Pressupõe uma
mudança conceitual teórico-prática, na perspectiva de que o homem é construtor
da sua própria história, na medida em que o trabalho assim também o é concebido.
É um esforço de busca construtiva de novos conteúdos, no propósito de
desenvolver a capacidade de inovar.
A educação não tem sentido fora da dimensão política do trabalho e de
respeito ao meio ambiente. Por isso a necessidade de conceber, refletir, pensar
e produzir conhecimento tomando como ponto de partida o homem concreto, a
existência limitadora e a dimensão histórica capaz de produzir elementos
significativos.
Uma educação que se deixa livre, sem intencionalidade, serve apenas
como ideologia, não produzindo uma consciência. Ao contrário, torna-se evidente
a necessidade de impor à educação o sentido pedagógico do trabalho; impor o
sentido da formação do homem, compreendendo o pedagógico que existe em cada
conteúdo, em cada prática, em cada ato ou ação, seja do professor, da comunidade
ou do aluno. É esse pedagógico que apontará o significado da educação na
formação do indivíduo, “como pessoa capaz de pensar, de estudar, de dirigir ou
de controlar quem dirige” (Idem, p 136).
A educação para o trabalho assemelha-se ao espontaneísmo. Toda
atitude de respeito e aceitação simples e pura do processo educativo, do que
existe na escola, dos currículos, dos programas, das técnicas e procedimentos,
em sua aparência de respeito pela natureza da escola, é, na realidade, uma
renúncia à educação e a formar o homem segundo um plano humano. É o abandono
completo do indivíduo ao autoritarismo, ou seja, à pressão exercida
objetivamente pela sociedade do trabalho (Ibidem, p. 133).
Ao assumir o trabalho como atividade prática e não como um princípio
orientador da prática pedagógica, produzindo uma consciência fragmentada e
acrítica, a educação vai favorecer uma maior e mais fácil submissão do
trabalhador ao modo de produção. Constitui-se numa forma de colocar toda a
responsabilidade sobre o indivíduo, retirando da discussão o processo de
produção. O investimento é em mão-de-obra e não na pessoa que possui força de
trabalho.
A reversão da intencionalidade da educação para o investimento no
homem trabalhador, possuidor de força de trabalho capaz de libertar o homem do
próprio esforço de subsistência, pela intencionalidade, pela antecipação desse
seu esforço, é caminho para a construção do conceito pedagógico da relação
trabalho-educação-meio ambiente. Quanto maior a limitação do homem frente ao
processo produtivo, quanto maior a incapacidade de coordenar trabalho e regime
de vida, maior é o processo de alienação e submissão do indivíduo diante das
exigências objetivas do maquinismo.
A educação tem a tarefa humana de conduzir à emancipação, ao pensar
de modo claro, seguro e pessoal, retirando o sujeito da cultura inorgânica e
pretensiosa e da pretensa sociedade do trabalho, o que pressupõe que se deva
educar não só o indivíduo, mas o próprio educador (Ibidem, p. 132-134). É
necessário que a educação, como um todo pedagógico, aborde a questão
trabalho-educação-meio ambiente sob a perspectiva do pedagógico, possibilitando
uma mudança na apreensão das relações de produção e invista na elaboração de um
conhecimento novo, cujo pressuposto básico centre-se no homem, em seu processo
de desenvolvimento histórico, dentro de suas condições reais de
existência.
Ao discutir essa relação do homem com a natureza mediada pelo
trabalho, torna-se possível discutir não apenas as necessidades do homem, os
problemas concretos, as possibilidades de transformação desses problemas, mas,
antes de tudo, discutir o próprio significado da existência do homem, ser
presente. É na possibilidade dos indivíduos descobrirem-se como agentes
responsáveis, em que o processo de produção do conhecimento está voltado para a
prática social, que se abrem caminhos para uma educação emancipatória,
comprometida com o indivíduo criativo e transformador.
A educação produz no indivíduo uma transformação que se manifesta
pela maior independência frente aos limites do trabalho coisificado. O contato
com o trabalho não tem nada de novo se não estimular uma nova atitude com
relação à natureza e à vida. “Em suma, ou se trata de momentos de um trabalho
educativo com o objetivo consciente de criar aqueles homens novos de uma nova
fase histórica, ou então não valem para nada” (MANACORDA, 1990,
p.96).
A perspectiva do trabalho como elemento teórico da ação educativa não
se resume à adoção de novas metodologias ou à introdução de laboratórios nas
escolas ou no trabalho na fábrica, mas encontra-se no sentido e direção que se
dá ao ato mesmo de educar.
O trabalho como princípio educativo é identificado nas situações
concretas, explicitadas, por exemplo, nas discussões das leis naturais a serem
conhecidas e dominadas na interação do homem com a natureza; na descoberta de
leis sociais, historicamente situadas e percebidas como criadas pelo homem e,
portanto, passíveis de serem transformadas por uma ação coletiva, consciente e
deliberada; na consciência de direitos e deveres; na unidade concepção-execução,
teoria-prática, como elo entre consciência e realidade no combate à alienação do
homem na base material que a produz e reproduz. É a base para refletir com os
indivíduos. É atividade consciente, produtiva, livre sobre a atividade
pedagógica. A educação procura a unidade entre o sujeito e a natureza, num
processo de elaboração do saber voltado para a descoberta do homem como ser
capaz de posicionar-se diante dos fenômenos, capaz de apreender a realidade,
capaz de unir o pensar ao fazer, priorizando, no trabalho, o conhecimento
articulado à vida, às questões básicas da existência.
Neste esforço, o indivíduo descobre o seu papel de ser sujeito
desafiado a lutar contra a condição de indivíduo abstrato, a ter clareza de suas
necessidades, dos fins e objetivos que orientam a atividade produtiva; do
significado do trabalho para a autorrealização do ser humano; do significado de
mobilizar suas próprias forças no controle do processo de produção e do produto
de seu trabalho; da importância da mediação do outro significativo, da
colaboração e do trabalho compreendido como coletivo, autocriação, desafio,
superação de limites e dificuldades, organização.
3. Sensitividade ecológica e transformações nas relações educação e
trabalho
A sociedade do trabalho, além de reificar o homem, provocou uma
degradação ambiental de tal ordem que conduziu a humanidade a uma situação de
“agonia planetária” resultado da exploração irresponsável dos bens naturais.
Somos contemporâneos de uma crise ambiental sem precedentes, resultado da
ideologia individualista-desenvolvimentista, da consequência dos avanços
tecnológicos e científicos pós-Revolução industrial e da busca do bem estar a
qualquer preço. Todos os limites foram ultrapassados “ao excluir o futuro mais
distante das suas previsões e o globo terrestre na consciência da própria
causalidade.” (JONAS, 2006, p.22).
Essa crise decorre da contraposição entre os interesses do homem – o
desenvolvimento – e a natureza –
sua preservação e equilíbrio ambientais, com o esgotamento dos recursos naturais
e, por consequência, o risco de catástrofes anunciadas. Ulrich Beck (2001)
descreve essa sociedade como uma “sociedade de risco”, caracterizada pelo
permanente perigo de catástrofes ambientais em face de seu contínuo e
insustentável crescimento econômico.
Nesse sentido o alerta de que temos consciência dos riscos que vivemos,
representado pelo agravamento dos problemas ambientais; por outro lado, temos a
percepção clara e nítida da ineficácia de políticas de gestão ambiental,
caracterizando uma irresponsabilidade organizada.
Os excessos praticados no planeta Terra tornaram a economia, a
demografia, o desenvolvimento, a ecologia problemas globais. Apesar de os defensores do modelo atual
de produção e desenvolvimento, visualizarem as tragédias ou problemas como
fatalidades do processo de desenvolvimento, o discurso do trinômio
produtividade, progresso e riqueza já não agrada a todas as plateias, como
ressalta Jacques Demajorovic (2011, p.1): “O agravamento dos problemas
ambientais está ligado a escolhas feitas no que diz respeito à forma como o
conhecimento técnico-científico vem sendo aplicado no processo produtivo.”
A percepção do risco e da agonia planetária colocou o tema ambiental
no centro do debate jurídico. Conforme destaca Canotilho (2007, p. 1) “Assim como aconteceu com a doutrina dos
direitos fundamentais em geral, onde se radicou uma questionável cronologia de
gerações de direitos, também no campo do direito ao ambiente passou a ser tema
recorrente nas discussões jusambientais uma espécie de sedimentação geológica em
torno de problemas ecológicos e ambientais de primeira geração e problemas
ecológicos-ambientais de segunda geração”.
Em relação aos primeiros, destaca o constitucionalista português, “as
dimensões jurídico-normativas mais relevantes reconduziam-se à prevenção e
controle da poluição, das suas causas e dos seus efeitos e à subjetivização do
direito ao ambiente como direito fundamental ambiental”, com ênfase na dimensão
antropológica deste direito, estando a pessoa humana e a sua dignidade na “raiz
indeclinável da moralidade ambiental antropocêntrica”. E, em relação aos segundos, “as
dimensões mais importantes destes problemas apontam para uma sensitividade
ecológica, (conforme expressão de Oren Perez) mais sistêmica e cientificamente
ancorada e para a relevância do pluralismo legal global na regulação das
questões ecológicas” (CANOTILHO, 2007, p. 2).
É a percepção de que os problemas ambientais não podem ser
enfrentados senão a partir de uma visão holística, global, em razão das
implicações globais e duradouras, como o efeito estufa, a destruição da camada
de ozônio, as mudanças climáticas ou a destruição da biodiversidade.
Nesse sentido, os impactos econômicos e sociais de qualquer fenômeno
da natureza não se limitam ao espaço geográfico onde o fenômeno se manifesta,
mas interfere e provoca consequências sobre toda uma região ou diferentes
continentes. O agir sobre a natureza na sociedade de risco implica em
consequências para as gerações atuais e que acabarão, por certo, a continuar
esse quadro de irresponsabilidade, a comprometer, de forma insustentável e
irreversível, os interesses das gerações futuras na manutenção e defesa da
integridade dos componentes ambientais naturais.
Ao tomar a sério os interesses das gerações futuras, a constituição
brasileira, assim como tantas outras, assinala para a solidariedade e para o
desenvolvimento sustentável (BENJAMIN, 2007). Historicamente situado, o direito
a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, insere-se entre os direitos
fundamentais – direitos do ser humano, reconhecidos e protegidos como tais pela
ordem constitucional de um Estado – “é uma norma jurídica vinculativa, protegida
através do controle jurisdicional da constitucionalidade dos dispositivos
reguladores deste direito” (CANOTILHO, 2000, p. 372).
Ainda com Canotilho (2000, p. 371), cabe destacar que “A positivação
de direitos fundamentais significa a incorporação na ordem jurídica positiva dos
direitos considerados ‘naturais’ e ‘inalienáveis’ do indivíduo. Não basta uma
qualquer disposição. É necessário assinalar-lhes a dimensão de fundamental
rights colocados no lugar cimeiro das fontes de direito: as normas
constitucionais. Sem esta positivação jurídica, os ‘direitos do homem são
esperanças, aspirações, ideias, impulsos, ou, até, por vezes, mera retórica
política’, mas não direitos protegidos sob a forma de normas (regras e
princípios) de direito constitucional
(Grundreschtsnormen)”.
Nessa mesma linha de argumentos, Ingo Sarlet (2003, p. 33-34)
assinala que os direitos definidos constitucionalmente como direitos
fundamentais têm maior possibilidade de efetivação, diante dos mecanismos
jurídicos existentes nos ordenamentos que os contemplam, isso em atenção ao já
destacado por Norberto Bobbio (2004, p. 43-45) “o problema fundamental em
relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justifica-los, mas o de
protegê-los [...] o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas
jurídico e, num sentido mais amplo, político”. É a questão do fazer, do
implementar, do realizar, do dar eficácia.
Com Canotilho (2000, p. 371), “os direitos fundamentais referem-se
àqueles direitos inerentes ao homem como indivíduo ou como participante na vida
política; as liberdades, à defesa da esfera jurídica dos cidadãos perante os
poderes políticos; e as garantias, às garantias ou meios processuais adequados
para a defesa dos direitos”.
E com Norberto Bobbio e no mesmo sentido os doutrinadores atuais, com
destaque para Cansado Trindade e Flávia Piovesan: são históricos. Por isso a
possibilidade de realização, porque representam a ação humana e envolvem
conquistas, lutas, sofrimento, lágrimas e sangue. Direitos de liberdade
(individuais e políticos); direitos de igualdade (econômicos, sociais e
culturais, relacionados ao trabalho, à assistência social, à habitação, à saúde,
à educação, ao lazer); direitos de solidariedade ou fraternidade (direito à paz,
à proteção ao meio ambiente e à qualidade de vida, ao desenvolvimento, à
manutenção do patrimônio comum da humanidade, à autodeterminação dos povos, à
proteção dos consumidores, à proteção da infância e juventude.) São ao mesmo
tempo, individuais e coletivos.
São direitos de solidariedade “devido à sua natureza de implicação
universal. Alcançam, no mínimo, uma característica de transindividualismo e, em
decorrência dessa especificidade, exigem esforços e responsabilidades em escala
mundial, para que sejam verdadeiramente efetivados” (MEDEIROS, 2004, p.
74-75).
Enquanto direito social, consiste em poder. Realiza-se quando imposto a outros, um
certo número de obrigações positivas (BOBBIO, 2004, p. 41). Não é outro o
sentido da ética da responsabilidade, da sensibilidade ecológica, da natureza,
da possibilidade concreta de realização do humano. Históricos, os direitos
fundamentais – e em particular o direito ao meio ambiente – se positivam como
resultado da consciência, da percepção de que sua ausência grita contra a
humanidade do próprio homem.
Mas não basta positivar. Tem que tornar efetivo. É o que se propõe no
paragrafo 1º, inciso VI, do art. 225 da CF que assim determina:
Art. 225
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder
Público:
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio
ambiente;
Nos termos da norma constitucional, promover a educação ambiental,
bem como a conscientização pública para a preservação do meio ambiente é tarefa
propositiva e cooperativa, compromisso não apenas do Estado, mas da sociedade
como um todo.
Só em meados da década de 70, por uma conjunção de fatores, os
sistemas constitucionais começaram a reconhecer o ambiente como valor merecedor
da tutela maior. Na história do
direito, poucos valores ou bens tiveram uma trajetória tão meteórica, passando
em poucos anos, “de uma espécie de nada jurídico ao ápice da hierarquia
normativa, mantendo-se com destaque nos pactos políticos nacionais” (BENJAMIN,
2007, p. 61). Para Herman Benjamin, numa primeira onda de constitucionalização
ambiental, sob a direta influencia da Declaração de Estocolmo de 1972, vieram as
novas Constituições dos países europeus que se libertavam dos regimes
ditatoriais, com a Grécia (1975), Portugal (1976) e Espanha (1978). Num segundo
grupo, ainda sob os padrões e linguagem de Estocolmo, foi a vez de países como o
Brasil (1988), ao estabelecer, no seu art. 225, verbis:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações.
Após a Rio 92, outras constituições foram promulgadas ou reformadas,
incorporando, expressamente, novas concepções, como a de desenvolvimento
sustentável, biodiversidade e precaução (França, 2005- Charte de l’
environnement).
Como consequência dos debates em nível mundial, os modelos
constitucionais ambientais trazem, em seu bojo, algumas características que
merecem destaque e que irradiam a educação ambiental, conforme proposto por
Herman Benjamin (2007):
a) mudança de paradigma no tratamento jurídico do tema. Adotam uma
compreensão sistêmica (orgânica ou holística) e legalmente autônoma do meio
ambiente, determinando um tratamento jurídico das partes a partir do todo;
b) indisfarçável compromisso ético de não empobrecer a Terra e a sua
biodiversidade, objetivando manter as opções das futuras gerações e garantir a
própria sobrevivência das espécies e dos seus habitat. Equilíbrio ecológico,
áreas protegidas, combate à poluição, proteção da integridade dos biomas e
ecossistemas, dever de recuperar o meio ambiente
degradado;
c) revisão do direito de propriedade, receptivo à proteção do meio
ambiente, reescrevendo-o sob a marca da sustentabilidade;
d) clara opção por processos decisórios abertos, transparentes, bem
informados e democráticos, estruturados em torno de um devido processo
ambiental;
e) indicação de uma nítida preocupação com a implementação, isto é,
com a enumeração, já no próprio texto constitucional, de certos direitos e
deveres relacionados à eficácia do Direito ambiental e dos seus instrumentos,
evitando feição retórica.
Particularmente na Constituição brasileira, a ambientalização
constitucional, embora concentrada no art. 225, aparece espalhada, com destaque
para os arts 5º, XXII, XXIII, 20,II a VII, 21, XIX, 22, IV, 23, VI e VII, 24, VI
a VIII, 26,I, 170, VI, 184, 2º, 186, II e 200, VII e VIII.
É o Estado de direito ambiental (Cf. PILATI; DANTAS, 2011) pautado,
fundamentalmente, nos princípios da precaução e da prevenção, na democracia
participativa, na educação ambiental, na equidade intergeracional, na
transdisciplinaridade, no desenvolvimento sustentável e na responsabilização
ampla dos poluidores, com adequação de técnicas jurídicas para salvaguarda do
bem ambiental, tendo como pressuposto a repolitização da realidade e o exercício
radical da cidadania, individual e coletiva na defesa da natureza.
Esse Estado de direito ambiental requer uma transformação global, não
só dos modos de produção, mas também dos conhecimentos científicos, pressupondo
uma nova relação com a natureza.
No Brasil, foram instrumentos responsáveis pela estruturação de um
Estado de Direito Ambiental ao estabelecerem princípios próprios e criarem uma
política de proteção ao meio ambiente: Lei n. 6.938/81- Lei da Política Nacional
do Meio Ambiente, Lei n. 7.347/85-
Lei da Ação Civil Pública e a Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988, Lei nº 9.795/99.
4. Desenvolvimento sustentável, educação ambiental e novas
perspectivas para a sociedade do trabalho.
O desenvolvimento sustentável é “o desenvolvimento capaz de suprir as
necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as
necessidades das futuras gerações. É o desenvolvimento que não esgota os
recursos para o futuro”. O desenvolvimento
sustentável depende de planejamento e do reconhecimento de que os recursos
naturais são finitos. É um não à degradação do meio ambiente, à pobreza, à
miséria e um olhar com confiança o futuro da humanidade.
Uma nova prática dialógica homem-natureza, necessidade do mundo
moderno, se impõe, e com ela, a necessidade de uma “Educação Ambiental”,
expressão que surge, pela primeira vez, em um encontro de educadores na
conferência de Keele na Inglaterra no ano de 1965 (Cf. DIAS, 1992) ao destacar
que a educação ambiental deveria se tornar parte essencial da educação de todos
os cidadãos.
No final dos anos 60 e início dos anos 70, as questões ambientais
passaram a ser analisadas em uma perspectiva mais global. Na década de 1970 os
governantes começaram a preocupar-se, com o grande aumento da poluição e o
alerta de esgotamento dos recursos naturais. Em 1970, inicia-se o uso da
expressão “environmental education” (educação ambiental) nos Estados Unidos,
onde foi aprovada a primeira lei sobre Educação Ambiental (GUIMARÃES, 1995).
A partir da década de 70, a UNESCO
promoveu vários eventos relacionados ao Meio Ambiente, com destaque para a
Conferência de Estocolmo (1972), considerada um marco político internacional
para o surgimento de políticas de gerenciamento ambiental. Ali foram propostos
novos conceitos como o do Ecodesenvolvimento, uma nova visão das relações entre
o meio ambiente e o desenvolvimento; gerados e criados novos importantes
programas como o das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA); gerados
documentos da relevância da Declaração sobre o Ambiente Humano, uma afirmação de
princípios de comportamento e responsabilidade que deveriam governar as decisões
relativas à área ambiental e o Plano de Ação Mundial, uma convocação à
cooperação internacional para a busca de soluções para os problemas ambientais.
A Conferência também constituiu o Dia Mundial do Meio Ambiente, a ser comemorado
no dia 05 de junho de cada ano. A partir dela, a atenção mundial foi direcionada
para as questões ambientais, especialmente para a degradação ambiental e a
poluição interfronteiras, popularizando o conceito da dispersão, de grande
importância para evidenciar o fato de que a poluição não reconhece limites
políticos ou geográficos e afeta países, regiões e pessoas para muito além do
ponto em que foi gerada.
A reunião internacional que de fato revolucionou a Educação Ambiental
foi a Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, promovida pela
UNESCO e realizada em Tbilisi, na Geórgia em 1977 (SOARES, 2008). A declaração
final de Tbilisi estabelece os princípios orientadores da Educação Ambiental e
remarca seu caráter interdisciplinar, crítico, ético e transformador.
Anuncia que a Educação Ambiental
deveria basear-se na ciência e na tecnologia para a tomada de consciência e
adequada compreensão dos problemas ambientais, fomentando uma mudança de conduta
quanto à utilização dos recursos ambientais.
A conferência seguinte foi a de Moscou (1977), que reuniu educadores
ambientais de cem países. Visou fazer uma avaliação sobre o desenvolvimento da
Educação Ambiental desde a Conferência de Tbilisi, em todos os países membros da
UNESCO.
A Educação Ambiental, nessa conferência não-governamental, reforçou
os conceitos consagrados pela de Tbilisi, a saber, a Educação Ambiental deveria
preocupar-se tanto com a promoção da conscientização e transmissão de
informações, como com o desenvolvimento de hábitos e habilidades, promoção de
valores, estabelecimento de critérios padrões e orientações para a resolução de
problemas e tomada de decisões. Portanto, objetivar modificações comportamentais
nos campos cognitivo e afetivo. Nesta Conferência, a Educação Ambiental foi
definida como “uma dimensão dada ao conteúdo e à prática da educação, orientada
para a resolução dos problemas concretos do meio ambiente, através de enfoques
multidisciplinares e de uma participação ativa e responsável de cada indivíduo e
da coletividade”.
A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento (CNUMAD), oficialmente denominada de “Conferência de Cúpula da
Terra” e informalmente de Eco-92 ou Rio-92, foi realizada no Rio de Janeiro
entre 03 e 14 de junho de 1992, 20 anos após a Conferência de Estocolmo e teve
grande importância para reforçar e ampliar essa nova abordagem ambiental, que já
vinha sendo discutida em documentos anteriores. “A matéria ambiental passou a
ser incorporada de maneira definitiva, como processo indispensável no caminho do
desenvolvimento sustentável, preconizado no encontro através da Agenda 21, uma
agenda de diretrizes para o século 21” (SILVA JÚNIOR, 2010. p.
107-8).
Destaca-se, da Agenda 21, no Capítulo 36, “a promoção da educação, da
consciência política e do treinamento” e apresenta um plano de ação para o
desenvolvimento sustentável a ser adotado pelos países, a partir de uma nova
perspectiva para a cooperação internacional.
Em 1997, em Kyoto, Japão, aconteceu a III Conferência das Partes para
a Convenção das Mudanças Climáticas, participaram representantes de mais de 160
países. Deu-se origem ao Protocolo de Kyoto, que objetivou a redução de emissões
de gases estufas.
No Brasil, em 1999, é promulgada a Lei nº 9.795 que institui a
Política Nacional de Educação Ambiental – PNEA, definindo seus objetivos,
princípios e estratégias e promovendo a Educação Ambiental como responsabilidade
de todos, incluindo o ensino formal e não-formal. E conforme o capítulo I,
artigo 2º: “a educação ambiental é um componente essencial e permanente da
educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os
níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal”
(BRASIL, 1999).
A comunidade internacional, no ano de 2000, adotou os objetivos de
desenvolvimento do milênio como um marco global do desenvolvimento e da
cooperação.
Na cidade de Dacar, Senegal, em abril de 2002, a comunidade mundial
reafirmou a crença na Declaração Mundial sobre Educação para Todos adotada, em
1990, em Jomtien, Tailândia, expressando seu compromisso em alcançar os
objetivos e metas para todo cidadão e toda as sociedades apresentados no
Programa Educação para todos e, a partir destes estabelecer princípios básicos
da educação ambiental capazes de reconstruir as relações trabalho e educação,
numa perspectiva emancipatória.
Esses princípios podem ser assim descritos:
♦ Considerar o meio ambiente em sua totalidade, ou seja, em seus
aspectos naturais e nos criados pelos seres humanos, tecnológicos e sociais
(econômico, político, técnico, histórico-cultural, moral e
estético);
♦ Constituir um processo educativo contínuo e permanente, começando
pelos primeiros anos de vida e continuando através de todas as fases do ensino
formal e não-formal;
♦ Aplicar um enfoque interdisciplinar, aproveitando o conteúdo
específico de cada disciplina, de modo que se adquira uma perspectiva global e
equilibrada;
♦ Examinar as principais questões ambientais, do ponto de vista
local, regional, nacional e internacional, de modo que os educandos se
identifiquem com as condições ambientais de outras regiões
geográficas;
♦ Trabalhar com o conhecimento contextual, com estudos do
meio.
♦ Concentrar-se nas situações ambientais atuais, mas levando em
conta, a perspectiva histórica, resgatando os saberes e fazeres
tradicionais;
♦ Insistir no valor e na necessidade de cooperação local, nacional e
global para prevenir e resolver os problemas ambientais;
♦ Considerar, de maneira explícita, os aspectos ambientais nos planos
de desenvolvimento e de crescimento;
♦ Ajudar a descobrir os sintomas e as causas reais dos problemas
ambientais;
♦ Destacar a complexidade dos problemas ambientais e, em
conseqüência, a necessidade de desenvolver o senso crítico e as habilidades
necessárias para resolver os problemas;
♦ Utilizar diversos ambientes educativos e uma ampla gama de métodos
para comunicar-se e adquirir conhecimentos sobre o meio ambiente, estimulando o
indivíduo a analisar e participar na resolução dos problemas ambientais da
coletividade;
♦ Estimular uma visão global (abrangente/holística) e crítica das
questões ambientais;
Em âmbito interno, enquanto política pública de educação, esses
princípios estão presentes nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs. Neles,
os conteúdos ambientais foram inseridos às áreas de ciências Naturais, História,
Geografia, Língua Portuguesa, Educação Física, Arte e Matemática, de forma
transversal. O estudo sobre o meio
ambiente pode ser efetuado com uma abordagem integrada, onde o professor deva
considerar o contexto local, a realidade, suas experiências, assim como a dos
próprios alunos. Os Parâmetros sugerem que se busque fornecer significado ao
processo de ensino aprendizagem por meio de contextualização e da
interdisciplinaridade dos diferentes conteúdos escolares, enquanto conceito
emancipatório.
O tema Meio Ambiente conforme os PCNs deve ser trabalhado de forma
que possibilite que se tenha uma visão ampla sobre o Meio Ambiente. A dinâmica e
as características deverão envolver não somente os elementos naturais, físicos e
biológicos, mas também os elementos construídos e todos os aspectos sociais da
relação dos seres humanos com o Meio Ambiente, aí incluído o trabalho. Além da
formação de valores voltados para a preservação do Meio Ambiente, a educação
deve passar da teoria à prática, promovendo o exercício desses mesmos valores,
ou seja, transformando os valores em ações, e as ações em hábitos solidamente
incorporados pelos indivíduos.
5 Considerações finais
Observa-se, dos princípios expressos, que uma nova ética – a da
responsabilidade – se impõe para a relação trabalho, educação e meio ambiente.
As transformações sociais que decorrem desta nova ética exigem uma educação
emancipatória, transformadora e, principalmente, de respeito e responsabilidade,
com a superação da ética
individualista-desenvolvimentista.
A sociedade globalizada e as consequências globais das ações
propugnam pelo respeito ao meio ambiente e sinalizam para uma educação
responsável e comprometida com as novas gerações. Não se defende o retorno ao
estado de natureza, mas a efetiva superação da ética
individualista-desenvolvimentista, para a consolidação de uma ética da
responsabilidade, onde o conceito trabalho não é reificado, mas relação íntima
entre o homem e a natureza, processo de realização humana.
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