Localização dos meios de consumo coletivos e valorização do solo
urbano.
Dayana
Aparecida Marques de Oliveira
Resumo
A produção
e consumo do espaço são guiados pela lógica capitalista de produção, por isso,
possuem caráter desigual. Tal desigualdade é manifesta na paisagem urbana a
partir da escolha das localizações dos meios de consumo coletivos, que servem à
lógica de produção do espaço como meios de valorização fundiária e imobiliária.
O Plano Diretor enquanto uma das principais leis que regem o planejamento urbano
regulamenta e legitima as ações e decisões relacionadas à valorização do solo,
bem como à distribuição dos meios de consumo coletivos de acordo com os
interesses dos que o elaboram. Em Presidente Prudente, os
contrastes resultantes desses fatos, aparecem na diferenciação das áreas da
cidade, que variam de acordo o perfil seus habitantes.
Palavras-chave: Valorização; Meios de consumo coletivos; Plano Diretor; Presidente
Prudente/SP.
Abstract
The production and consumption of space are guided
by the logic of capitalist production, therefore, have uneven character. This inequality is manifested in the urban
landscape from the choice of locations of
the means of collective
consumption, which serve the production
logic of space as a means of valuing
land and real estate. The Master Plan as one of the
principal legislation governing
urban planning and legitimizes the actions and decisions
related to land
value, and the distribution
of means of collective consumption according to the
interests of those who
make it. Presidente Prudente, contrasts resulting from these facts appear in the differentiation of areas of the city, which vary according to profile its inhabitants.
Keywords: Valorizing; means of collective consumption; Master Plan; Presidente Prudente / SP.
1.
Introdução
Espaço e
sociedade se relacionam dialeticamente no processo de produção e reprodução
direcionado pelo modo capitalista de produção. Produção e consumo se desenvolvem
a partir de interesses guiados por necessidades criadas a fim de atender
demandas específicas, as quais modificam o espaço. Por outro lado, as formas
expressas no espaço geográfico direcionam as relações e as
transformam.
Os meios de consumo coletivos são formas de reprodução social e ao mesmo
tempo, utilizados como instrumentos na valorização do espaço, porque sua
implantação modifica o preço do solo e a demanda pela localização, além de
atrair novos fluxos.
Em função disso, são inúmeros os exemplos nas cidades brasileiras que
demonstram a falta de equidade na implantação de infraestruturas, equipamentos e
serviços. O planejamento urbano, em especial o Plano Diretor, enquanto uma das
principais leis municipais poderia minimizar a desigualdade na implantação dos
meios de consumo coletivos. Todavia, apesar de poder apresentar uma alternativa
ao desenvolvimento desigual, o planejamento esbarra nos interesses hegemônicos,
os quais são à base da elaboração e aprovação das leis.
A cidade de Presidente Prudente/SP é um exemplo de como a lógica de
valorização é posta em prática a partir da utilização dos meios de consumo
coletivos, e qual o contraste que essa lógica resulta nas demais áreas da cidade
que não são alvo da valorização, sendo o Plano Diretor um importante elementos
para garantir as ações e decisões que culminam no atendimento dos interesses
relacionados ao mercado imobiliário.
2.
Produção, distribuição, troca e consumo: elementos para análise da
cidade.
O modo capitalista de produção atribui ao espaço sua característica
desigual, contemplada na cidade a partir dos diversos padrões estabelecidos na
paisagem urbana, os quais exprimem a lógica do desenvolvimento
desigual.
A sociedade e o espaço relacionam-se dialeticamente, por isso, ambos
existem através da relação com o outro. SANTOS (2008) ao escrever acerca do
espaço geográfico, o definiu como conjunto de sistema de objetos e de sistemas
de ações em constante interação. A interação tem a ver com a dialética, os
objetos e as ações vislumbram espaço e sociedade.
Analisar o espaço e as relações sociais que nele são estabelecidas
pressupõe abranger sua totalidade, cuja construção pode ser melhor compreendida
a partir dos conceitos estabelecidos por MARX (1987, p. 7): produção,
distribuição, troca e consumo. Na análise espacial da cidade a utilização desses
conceitos é imprescindível, pois transcendem a paisagem urbana expressa enquanto
materialidade; compreendem o movimento dialético do espaço que inclui as
relações sociais que nele são estabelecidas.
A produção é entendida por MARX (1987) como aquela que cria os
objetos correspondentes às necessidades (Berdürfnissen), ou seja, que através de
um movimento constante e direcionado produz os objetos com o intuito de suprir
necessidades específicas criadas pela própria produção. A expressão necessidade é importante porque ela está
ligada aos anseios e objetivos da sociedade que se organiza em classes sociais,
cuja maior referência de distinção é a renda. A necessidade é relativa e varia
de acordo com os agentes que a criam, podendo estar associadas a graus distintos
do que se entende por urgente e por supérfluo. Os objetos criados para suprir
essas necessidades, direcionam o consumo, já que ao produzir também se consume e
vice-versa.
O produto só se efetiva no consumo e cria uma nova necessidade de
produção. A produção além de fornecer o objeto de consumo, determina o caráter e
o modo consumo e o consumidor, cria o sujeito para o objeto. As relações são
importantes na produção do espaço e na paisagem da cidade. Para LEFEBVRE (2001,
p. 52), a cidade encontra-se em um meio termo
(...) a caminho entre aquilo que se chama a ordem próxima (relações dos indivíduos
em grupos mais ou menos amplos, mais ou menos organizados e estruturados,
relações desses grupos entre eles) e a ordem distante, a ordem da sociedade,
regidas por grandes e poderosas instituições (Igreja, Estado), por um código
jurídico formalizado ou não, por uma ‘cultura’ e por conjuntos significantes.
(grifos do autor).
Na produção do espaço, a coligação dos interesses entre os agentes, ao
criar necessidades de produção, cria objetos de forma e em locais específicos a
fim de atender as demandas instituídas. Ou seja, a produção direcionada,
direciona também a demanda, os indivíduos consumirão os objetos, e como será
esse consumo. Essa lógica de produção e consumo ajuda a compreender a seleção
dos locais para estabelecimento dos meios de consumo coletivos nas cidades
contemporâneas, bem como a falta de acesso a eles, para a demanda que não foi
planejada a atender. Na relação entre produção e consumo o elemento “interesse”
possui importante destaque, porque é o interesse em criar novas necessidades e
manter o tipo e o modo de consumo atual que se produz e consume o
espaço.
Ao analisar a cidade, percebe-se que o consumo se dá de forma
desigual, bem como sua produção, por isso os consumidores não são os mesmos para
locais diferentes. A produção de cidades segregadas e fragmentadas ganha força
com a lógica do consumo desigual, em que surgem espaços exclusivos, criados para
atender demandas pertencentes a classes sociais também específicas. Tal fato
intervém na distribuição e na circulação.
A distribuição reparte os objetos de acordo com as leis sociais
(MARX, 1987, p. 12), ela é o produto da produção, vai além da distribuição do
resultado da produção, compreende também sua forma, “o modo preciso de
participação na produção determina as formas particulares da distribuição, isto
é, determina de que forma o produtor participará da produção”. A distribuição
também é guiada pelas necessidades criadas, é realizada de forma desigual e
concentrada. Essa é uma das contradições mais evidentes nas cidades: a
distribuição desigual e concentrada. As necessidades criadas que direcionam a
distribuição feita nas cidades é predominantemente voltada à valorização
fundiária e imobiliária.
A distribuição tem haver com a circulação, que é compreendida por
MARX (1979, p. 8) como um momento determinado da troca. “A distribuição
determina a porção [a quantia] de produtos que corresponde ao indivíduo; a troca
determina os produtos no qual o indivíduo reclama a parte que a distribuição lhe
atribui”. O autor ainda apresenta que a troca reparte novamente o que já está
distribuído segundo a necessidade individual. A troca não existe sem a divisão
do trabalho e a distribuição ocorre de acordo com essa divisão. Na cidade, a
troca pode ser compreendida como as interações espaciais e os estabelecimentos
dos fluxos, enquanto a distribuição compreenderia as formas espaciais e a forma
como o indivíduo consome e produz a produção. “A importância de um indivíduo
enquanto produtor e consumidor também depende de sua posição no espaço e varia
em função das oportunidades na estrutura espacial” (SANTOS, 2003, p.
169).
3. Os
meios de consumo coletivos
LOJKINE (1997) caracteriza os meios de consumo coletivos como formas
de socialização capitalista através da intervenção estatal (política de
planejamento), que não é neutra e não se dá de forma autônoma, mas por um
conjunto de relações e tomada de decisões delineadas sob o direcionamento da
lógica capitalista de produção.
A desigualdade na política estatal explica a desigualdade espacial na
localização dos meios de consumo coletivos, cuja implantação não ocorre de forma
eqüitativa, a fim de contemplar a demanda nas diferentes áreas da cidade. A
concentração dos meios de consumo coletivos cria novas formas de vida e de
necessidades sociais, contudo, do ponto de vista da reprodução do capital são
vistos como supérfluos “(...) na medida em que só intervém no nível da
reprodução da força de trabalho (...)” (LOJKINE, 1997, p. 157). Os meios
de consumo coletivos assim se caracterizam porque o suporte material desse tipo
de consumo só existe em meio ao coletivo, compreendem, portanto,
infraestruturas, equipamentos e serviços. Mediante a reprodução do capital não
apresentam rentabilidade, configurando-se em gastos sem retorno.
De acordo com LOJKINE (1997) três características distinguem os meios
de consumo coletivos dos individuais:
1. Valor de uso coletivo guiado por necessidade social e não
individual (transporte coletivo, assistência social, ensino escolar). Substituem
as formas de consumo individuais, “(...) na medida em que elas permitem mais
responder globalmente a necessidades suscitadas pela sociedade” (p. 155);
2. Duração do consumo. São meios que possuem efeito de lentidão em
sua renovação, o que significa “(...) uma diminuição da rotação do capital não
produtivo no setor do consumo e, por conseguinte, uma rentabilidade capitalista
muito fraca, a menos que se modifique o próprio valor de uso, o que significa
quase sempre uma mutilação do seu valor de uso” (p. 156);
3. Dificilmente divisíveis, “(...) os meios de consumo coletivos têm
enfim a característica de não possuir valores de uso que se coagulam em produtos
materiais separados, exteriores às atividades que os produziram” (p. 156). Esses
equipamentos não podem ser confundidos com serviços ou a prestação deles dos
quais os meios de consumo coletivos são suporte físico.
O autor afirma que diferente dos meios de consumo individuais, os
coletivos não são consumidos diretamente pela força de trabalho individual (não
são objetos de transformação direta do capital variável em salário). Para
LOJKINE (1997, p. 151), pouco importa se os meios de consumo coletivos são
públicos ou privados, no caso da produção de escolas ou hospitais, oferecem a
particularidade de serem a
(...) metamosfose de uma fração do capital variável em compra de forças de trabalho e meios de trabalho
que só funcionam no processo de consumo. São portanto, despesas indispensáveis
para transformar o resto do capital variável em salário, e, depois em compra de
mercadorias para o consumo final.
Por mais úteis que elas sejam frente à reprodução da força de
trabalho, alguns equipamentos são mais privilegiados que outros, por exemplo, os
equipamentos escolares que estão diretamente ligados à formação profissional são
mais privilegiados que os equipamentos ligados ao lazer ou a cultura. Isso
acontece da mesma forma, com os meios de comunicação, sendo aqueles ligados à
reprodução do capital, mais favorecidos que os que estão destinados à reprodução
da força de trabalho, tal fato se mostra na diferença das condições de estradas
que servem zonas industriais e de estradas que servem as residências dos
trabalhadores (LOJKINE, 1997).
A escolha acerca da localização desses meios é de incumbência do
Estado e, apesar de estar enquadrado na ordem distante é na ordem próxima que
essa escolha interfere. Ao serem implantados na cidade, tornam-se formas capazes
de alterar o espaço em que foram implantados, seja por promover a atração mais
intensa dos fluxos ou por modificar o uso do solo.
É fato que a implantação de infraestruturas, equipamentos e serviços
modifica o preço do solo, devido a valorização que lhe é atribuída, assim há
interesse de diversos agentes na instalação desses meios em localizações cuja
propriedade lhes confere ou é alvo de seus investimentos. Destarte, encontram-se
inúmeros exemplos nas cidades brasileiras acerca da implantação de meios de
consumo coletivos para assegurar valorização a localizações que são frentes de
expansão imobiliária. Enquanto isso, bairros pobres e afastados das áreas em que
estão concentrados os meios de consumo coletivos carecem sua ausência, enquanto
eles são utilizados como instrumentos para maior obtenção de
lucros.
Devido à alta dos preços das localizações, por causa da concentração
dos meios de consumo coletivos, a demanda passa a ser selecionada, sendo assim,
apenas os que podem pagar pelo preço correspondente à localização usufrui dela.
O desenvolvimento desigual típico do capitalismo toma a direção da produção do
espaço e estabelece seu consumo, o qual se efetiva desigualmente de acordo com a
renda e, consequentemente com a classe que o indivíduo pertence.
4. Os
meios de consumo coletivos em Presidente
Prudente/SP.
Presidente Prudente tem 207.625 habitantes, sendo 203.370, sua
população urbana, segundo os dados preliminares do censo de 2010. A cidade destaca-se na
rede urbana paulista, sobretudo devido ao setor de comércio e serviços. Fundada
na primeira metade do século XX (1917) possui desde sua gênese iniciativas
voltadas a especulação fundiária e valorização imobiliária para o alcance de
maiores lucros sobre a comercialização do solo urbano.

A primeira iniciativa relacionada à questão foi realizada quando um
de seus fundadores José Soares Marcondes, proprietário da “Companhia Marcondes
de Colonização, Indústria e Comércio” (empresa colonizadora de terras) organizou
campanha publicitária (inclusive no exterior) para divulgar suas vendas,
utilizando a oportunidade de obter riqueza com o plantio de café, sendo a
presença da ferrovia um dos principais argumentos de sua
campanha.
Do outro lado da ferrovia, o núcleo urbano estabelecido por Francisco
de Paula Goulart (que fundou a cidade, juntamente com Marcondes) era
comercializado sem ordens ou normas que fixassem o valor a ser pago pelo terreno
ou o tamanho do mesmo. As negociações variavam de acordo com as possibilidades
de pagamento do comprador. Tal núcleo era dividido apenas por quatro avenidas
(hoje as principais da cidade), as demais ruas que hoje cortam o centro surgiram
depois, e por serem estreitas e apertadas dificultam a circulação nesta área da
cidade.
Até a década de 1970, a política local foi liderada
por ruralistas, doravante, surge à figura do político empresário, cujo discurso
desenvolvimentista estava ligado à indústria. As reivindicações do empresariado
ganham cada vez mais destaque com o interesse na implantação do Distrito
Industrial na cidade. Para tanto foi necessária à aprovação do projeto de
Criação do Núcleo Industrial I (NIPP-I) pela Lei 2105/80, que seguindo as
exigências da promulgação da nova Lei Orgânica dos Municípios do Estado de São
Paulo, de 1967, foi criado o primeiro Plano Diretor, em
1969.
O primeiro Plano Diretor municipal de Presidente Prudente foi uma
expressão clara dos interesses da classe que estava no poder; o discurso
hegemônico que justificou a elaboração desta lei e fez parte de sua composição,
consolida-se enquanto dominante na esfera política local, e possui resquício na
legislação e na ação do poder público municipal até hoje.
A cidade começou a crescer de forma intensa, porém descontínua. A
construção de obras ligadas a infraestrutura, sobretudo a melhorias no sistema
viário com base na promoção da integração entre as diversas áreas, nos anos de
1970 e 1980 impulsionou o crescimento disperso da cidade, e no mesmo movimento a
relocação dos mais pobres para conjuntos habitacionais construídos em antigas
áreas rurais, em locais distantes, com ausência de infraestruturas. Um dos exemplos mais notáveis foi a
construção do Parque do Povo a partir das obras de canalização do Córrego do
Veado, que transformou uma área anteriormente sem infraestruturas em um
frutífero campo de geração de lucros sob a propriedade urbana, como nos mostra o
estudo de SPOSITO (1983).
Os agentes ligados ao setor imobiliário, em especial os incorporadores,
utilizaram-se de inúmeras estratégias para alcançar maiores lucros com a
comercialização de áreas criadas para atender a demanda, dentre as quais o
marketing foi uma importante ferramenta para vender lotes em áreas em
descontínuo à malha urbana, mas com a diferença: nessas a ação do poder público
foi decisiva na implantação das infraestruturas, como no caso do bairro
Marupiara, em que antes de haver ocupação, a pavimentação asfáltica já era
presente (SPOSITO, 1983).
Além da ação do poder público na implantação de infraestruturas,
modificações na legislação foram fundamentais para garantir eficácia às ações
dos agentes ligados ao setor imobiliário. MIÑO (2001) analisou a contribuição do
poder público para o surgimento e consolidação dos condomínios fechados
em Presidente
Prudente, e constatou, no início dos anos de 1980, mudanças a
fim de permitir a implantação dos condomínios Jardim Morumbi e Jardim João Paulo
II. “O poder municipal não somente se omitiu no cumprimento da legislação, mas
também solucionou oportunamente o problema da ilegalidade desses condomínios”
MIÑO (2001, p. 193).
Os anos de 1990 foram caracterizados pela implantação de grandes
conjuntos habitacionais, principalmente na zona norte da cidade com ausência de
meios de consumo coletivos e distante dos principais equipamentos. No final
dessa década, intensificou-se o surgimento dos condomínios fechados em oposição
às áreas mais pobres da cidade, os novos espaços criados, de caráter “exclusivo”
modificaram as áreas que passaram a abrigá-los, bem como a distribuição dos
fluxos na cidade, partindo desses pontos em direção aos shoppings centers da
cidade e a áreas de comércio e serviços voltados ao atendimento dessa demanda.
Neste sentido, vias que ligam os pontos citados foram implantadas com ótimas
condições de pavimentação asfáltica, sinalização e
iluminação.
Na década seguinte (2000), novos condomínios fechados e loteamentos
particulares surgem em descontínuo à malha urbana, sendo a zona sul a que mais
recebeu com a implantação de condomínios de médio a alto padrão, cujos notáveis
investimentos em infraestrutura foram realizados pelo poder público. A zona
norte também presenciou o crescimento urbano que se deu genericamente com a
implantação de conjuntos habitacionais e loteamentos populares, ao contrário do
setor leste, em que o relevo acidentado tornou-se uma barreira para a expansão
crescente.
Apesar de Presidente Prudente apresentar diversos focos de expansão,
desde o fim da década de 2000, investimentos têm sido realizados na zona oeste,
os quais corroboram com oscilações significativas no preço do solo devido aos
investimentos públicos que provocaram também mudanças no uso dos solos. A
locação de equipamentos coletivos públicos e privados, melhorias no sistema
viário, atração dos fluxos pela consolidação de uma área de comércio e serviços,
transformou a paisagem da antiga COHAB-CECAP, da década de 1980.
Atualmente, além da zona oeste, diversas áreas da cidade estão recebendo
investimentos públicos, no entanto, as obras são pontuais e se diferenciam de
acordo com as localizações. A Avenida Manoel Goulart (uma das principais
avenidas da cidade) recebeu em 2010 recapeamento, assim como algumas ruas
próximas a área central da cidade como a Rua Álvares Machado.
Na zona oeste foi implantado posto de saúde de média complexidade
(popularmente conhecido como Cohabão), além do Centro de Treinamento de um clube
de futebol, mudanças no sistema viário, principalmente na Avenida Salim Farah
Maluf próximo às imediações do estádio municipal, o Parque da Longevidade (que
está em processo de construção) e obras de revitalização do Balneário da
Amizade, além da presença e implantação de grandes hipermercados (Carrefour,
Muffato Max, Walmart e Macro).
No dos anos 2000, na zona leste, foi revitalizado o antigo prédio em
que funcionavam as Indústrias Matarazzo passado a ser denominado Centro Cultural
Matarazzo, onde funciona a biblioteca municipal, o Acessa São Paulo, o Projeto
Guri, o conservatório municipal, e abriga exposições de artes. Atualmente estão
sendo realizadas melhorias no sistema viário vão desde a duplicação de ruas à
edificação de rotatórias e sinaleiros. Em 2011 o destaque está para as obras de
expansão da FATEC (Faculdade de Tecnologia de Presidente Prudente), faculdade
pública cuja área para expansão de 7.300 metros
quadrados foi doada pela Prefeitura
municipal.
Nas zonas norte e a parte da zona sul em que estão os bairros
periféricos, os investimentos públicos são menores, limitam-se a construção de
praças, operações tapa-buracos, e outras iniciativas menores, comparadas à zona
oeste, leste e a área central.
Analisando espacialmente a disposição dos equipamentos coletivos
percebemos a importância da descentralização dos mesmos, já que alguns deles
estão limitados a poucas áreas da cidade.
Nessa análise limitamo-nos apenas a equipamentos coletivos de caráter
público (porque podem ser utilizados pela maior parte das pessoas, ao contrário
dos privados, dos quais só utilizam aqueles que podem arcar com seus custos),
com exceção dos shoppings centers, que contém dois dos grandes supermercados da
cidade, cinemas e apresentam exposições, e das universidades que prestam
serviços variados à comunidade.
Quanto aos equipamentos relacionados à educação, selecionamos as
escolas municipais e as universidades, percebemos maior presença desses
equipamentos nas zonas oeste e leste, sendo os setores norte, noroeste e
sudoeste a menor quantidade desses equipamentos.
Em relações aos postos de saúde públicos, o setor noroeste da cidade
é o que conta com menores possibilidades de atendimento. Os principais hospitais
que atendem pelo Sistema Único de Saúde são os equipamentos mais concentrados, e
estão localizados próximos a duas das principais vias da cidade. Neste caso, se
o paciente necessitar se deslocar para ser atendido até um desses hospitais será
necessário recorrer ao transporte coletivo e enfrentar tempo significativo em
deslocamento.
Caso semelhante acontece com os principais equipamentos de cultura,
dentre os quais estão inclusos o museu municipal, o teatro municipal e o Centro
Cultural Matarazzo, que estão próximos a importantes vias da cidade, assim como
os dois shoppings centers.
Selecionamos ainda as principais áreas de lazer: o estádio municipal,
a Cidade da Criança e o Parque do Povo. O Parque do povo apesar de estar em uma
área de fácil acesso, rodeado de outros equipamentos é uma área bastante
valorizada, a qual (dependendo do local que o indivíduo residir) pode ser
difícil de chegar. A localização da Cidade da Criança é difícil de acessar
porque fica próximo a Rodovia Raposo Tavares, local em que apenas duas linhas de
ônibus fazem o trajeto. O estádio municipal localizado no setor noroeste da
cidade possibilita acesso mais facilitado, no entanto, com a venda do time que
defendia a cidade, o mesmo não receberá mais jogos dos campeonatos nacionais e
estaduais, diminuindo sua utilização.
Em geral, o mapa a seguir demonstra o quanto às áreas mais afastadas
que ficam nas bordam da cidade carecem da descentralização dos equipamentos
coletivos.

5. O Plano
Diretor de Presidente Prudente/SP e suas contradições.
A Lei
Complementar 151/2008 que dispõe sobre o Plano Diretor municipal de Presidente
Prudente, poderia minimizar a concentração dos equipamentos coletivos na cidade
através de determinações que estabelecessem a prioridade para os investimentos
determinando previamente os locais onde eles poderiam ser feitos. Mas, a
princípio o Plano Diretor de Presidente Prudente é extremamente genérico, sendo
sua extensão de apenas treze páginas, não traz elementos suficientes que
contemplem as questões que precisam ser atendidas pela política
urbana.
No capítulo III “Da Função Social da Propriedade Urbana” são
estabelecidas as exigências de ordenação da propriedade urbana. Dentre os
princípios básicos estabelecidos estão duas que achamos importantes destacar, as
quais se encontram nos incisos IV e V do Plano Diretor municipal de Presidente
Prudente. Esses incisos explicitam a
necessidade de aproveitar os recursos já dispostos e existentes no município
para promover o cumprimento da função social da propriedade urbana. Tal
determinação inviabilizaria a permanência de vazios urbanos na cidade, já que
eles contam com infraestruturas apenas como elemento favorável à especulação.
Apesar disso, diversos vazios urbanos são mantidos na cidade, custeados pela
sociedade que paga pela valorização deles, que é o que acontece na zona sul, ao
longo do prolongamento da Avenida Coronel José Soares Marcondes, cuja extensão
abriga condomínios fechados e uma universidade (UNIESP) e um grande vazio
urbano, na zona sul da cidade.

Prolongamento da Avenida Coronel José Soares
Marcondes
Foto
tirada em 16/04/2011 às 18:15 h.
Nota-se na foto, a presença de infraestrutura em uma área cuja
ausência de edificação é notável. Percebe-se a boa qualidade da pavimentação
asfáltica, bem como o desenho nítido das faixas sob o asfalto, além da presença
de postes de iluminação próximos um do outro. O contraste dessa situação é
contemplado em diversos pontos da cidade, como é o caso da Rua Benedita
Aparecida Barbosa no Watal Ishibashi bairro periférico da zona
norte.

Rua
Benedita Aparecida Barbosa, esquina com Ângelo de Ré – Watal
Ishibashi
Foto
tirada em 17/04/2011 às 15:30 h.
O capítulo V “Das Leis Específicas e Complementares” do Plano Diretor
do município de Presidente Prudente chama a atenção porque nele estão contidos
os objetivos básicos das leis que são instrumentos do planejamento municipal:
Uso e Ocupação do Solo Urbano; Parcelamento do Solo Urbano; Perímetro
urbano; Sistema Viário Básico; Código e Normas para Edificações. O artigo 6º
trás de forma direta os objetivos básicos destas leis que são de grande
importância para compreender o planejamento na cidade. No inciso V está previsto
“propiciar a otimização do uso da infra-estrutura e do equipamento urbano já
existente”, o que indica torná-los mais acessíveis à população para que seu uso
seja maior e mais intenso, o que eliminaria a disposição em fazer o caminho
inverso: implantar meios de consumo coletivos nos locais cuja demanda é menor
que a oferta de utilização dos serviços.
Outro objetivo básico das Leis específicas e complementares do
município seria o estímulo a polinucleação, previsto no art. 6º, inciso VII.
Essa iniciativa é importante porque possibilita aos indivíduos que residem
próximos a esses núcleos desempenharem de forma mais eficiente suas atividades,
no entanto, dependendo da capacidade de abrangência dos serviços e atividades
oferecidas nesses núcleos o deslocamento até pontos mais distantes da cidade
continua sendo necessário, apesar de proporcionar outras possibilidades de
mobilidade não há alterações na acessibilidade se não houver mudança no sistema
de transportes. Há ainda, previsto no art. 13, inciso V, “a descentralização dos
serviços públicos” como um dos objetivos básicos da política administrativa no
âmbito do planejamento municipal.
Apesar da aparente preocupação com a polinucleação e com a otimização
do uso dos meios de consumo coletivos, o Plano Diretor traz como objetivo das
Leis que fazem parte do planejamento, em seu inciso X, do art. 6º, “estimular a
produção imobiliária, favorecendo a provisão de espaços adequados e criando
condições de bom atendimento do mercado”, o que demonstra a afinidade entre
poder público e os agentes do setor imobiliário e, ao mesmo tempo a influência
do segundo sobre o primeiro.
O estímulo previsto à produção imobiliária para o mercado não é
compatível com os demais objetivos presentes no art. 6º do Plano Diretor do
Município de Presidente Prudente, pois as condições requeridas para isso, negam,
sobretudo, os incisos, V e XI, porque o atendimento ao mercado que se diferencia
por fatores ligados as externalidades, é movido pela especulação, a qual
necessita primeiramente da dispersão ocupacional e do acesso aos meios de
consumo coletivos, como elemento fundamental para o marketing. Criar boas
condições de atendimento ao mercado imobiliário, demanda atender exigências que
caracterizam uma propriedade urbana próximo a locais privilegiados com boa
infraestrutura e acesso rápido a equipamentos urbanos. Além de tudo, é preciso
ainda promover valorização fundiária e imobiliária das localizações que
interessam ao mercado, o que só se faz a partir da implantação de
infraestruturas. As localizações são valorizadas desigualmente devido à
capacidade de atrair capitais, pela carga de capital que possuem e pelo lucro
que podem gerar.
6.
Considerações finais
A
produção e consumo do espaço seguem uma lógica específica, a qual é direcionada
pelo modo capitalista de produção. Pauta-se, portanto, no desenvolvimento
desigual, que caracteriza da mesma forma a produção e o
consumo.
Embora os meios de consumo coletivos não apresentem rentabilidade perante
o capital, são utilizados por estratégias sustentadas pelos agentes ligados ao
mercado imobiliário para aumento dos lucros com a comercialização do solo
urbano.
A aliança estabelecida entre estes agentes e os representantes do poder
público garante a manutenção e sustento de seus interesses. Enquanto em parte da
cidade concentram-se infraestruturas, equipamentos e serviços há uma grande
demanda que não é atendida devido à falta de acessibilidade, atribuída aos mais
pobres como um dos contrastes inerentes a lógica capitalista de produção e
consumo da cidade contemporânea.
Presidente Prudente traz em sua paisagem urbana os contrastes da lógica
de valorização urbana, com a permanência de vazios urbanos rodeados de
infraestruturas, as quais são insuficientes nos bairros mais pobres. Nesta
cidade, as contradições na lei, fundamentada no discurso dominante é evidente,
atribui privilégios e regulamenta as ações dos representantes do mercado
imobiliário em detrimento das necessidades dos mais pobres. A concentração dos
meios de consumo coletivos é uma prova do desenvolvimento desigual materializado
na paisagem urbana, o qual foi legitimado pelo discurso hegemônico ao longo da
história da cidade.
7. Referências bibliográficas
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cidade. São Paulo: Centauro, 2001.
LOJKINE, Jean. O Estado
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econômico filosófico e outros textos escolhidos. 4. ed. São Paulo: nova
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MIÑO, Oscar Alfredo Sobarzo. Os condomínios horizontais
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Prudente. In: SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão (org.). Textos e contextos para a leitura
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PREFEITURA MUNICIPAL DE PRESIDENTE PRUDENTE. Lei Complementar nº 151/2008 que dispõe sobre o Plano Diretor do município
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SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. O chão em Presidente
Prudente: a lógica da expansão territorial urbana. Rio
Claro: Universidade Estadual Paulista, Instituto de Geociências e Ciências
Exatas, 1983. 230
f. (Dissertação, mestrado em
Geografia).