Do
Desenvolvimentismo ao Neoliberalismo: contradições e conseqüências.
Daiana Perogil
Resumo
O
presente artigo vem discutindo a respeito de um período histórico na política
brasileira, que proporcionou mudanças nas ações econômicas, políticas e sociais.
Trataremos do período Desenvolvimentista no Brasil, bem como a atuação estatal
nessa fase, que se encontrava fortemente articulada com a economia interferindo
na mesma, na busca de uma integração regional, através de um viés nacionalista.
Todavia, esse modelo entrará em crise e entraremos em outro período que chamamos
de Neoliberalismo, modelo econômico e político que perdura até os dias atuais.
Discutiremos como se formou e consolidou esse modelo no Estado brasileiro e a
partir disso compreendermos suas ações. Após analisarmos esses contextos,
buscamos entender as conseqüências que os mesmos trouxeram para sociedade
brasileira, e as alternativas que essa população busca para sobreviver diante de
um sistema tão excludente e segregador.
Palavras Chaves:
Estado
Brasileiro; Desenvolvimentismo; Neoliberalismo.
Summary
This article has been arguing about a historical period in Brazilian
politics, which enabled changes in economic actions, political and social. 'll
Do the Developmental period in Brazil, as well as state actions in this phase,
which was strongly linked with the economy by interfering in it, in pursuit of
regional integration, through a nationalistic bias. However, this model will be
in crisis and we will call another period of neoliberalism, economic and
political model that endures to this day. We will discuss how it formed and
consolidated this model in the Brazilian state and from that understanding their
actions. After reviewing these contexts, we seek to understand the consequences
that they bring to the Brazilian society, and the alternatives that people seek
to survive as a system so exclusionary and segregated.
Keywords: Brazilian State; Development; Neoliberalism.
Introdução
O Estado brasileiro, com a sua estrutura capitalista, veio ao
longo dos anos apresentando mudanças em seus discursos e ações. Mudanças essas
que foram ocasionadas devido a fatores internos e externos, como do ideário
desenvolvimentista para o neoliberalismo, as conseqüências dessas ações são
refletidas tanto nas questões econômicas como
sociais.
O presente trabalho vem em busca de demonstrar e analisar essa
mudança de discurso por parte do Estado brasileiro, gerando assim os seus
contra-discursos, investigando um discurso que
institucionalizava o regional, na busca de integrar as regiões do país, para que
houvesse uma maior participação das mesmas no âmbito da economia, com o discurso
de levar o “progresso” para as demais regiões do país, que eram consideradas
arcaicas.
Com a crise desse modelo de “desenvolvimento”, começa a surgir outros
discursos, principalmente após o Consenso de Washington e com a abertura dos
mercados, a homogeneização dos territórios, o progresso técnico e
organizacional, pois neste período o mundo está vivendo a fluidez da
globalização, atingindo os países subdesenvolvidos com ideologias ocasionadas
por esse movimento.
Procuramos analisar as conseqüências ocasionadas em ambos os momentos
do Estado brasileiro, e também os movimentos de resistência que começam a surgir
em decorrência das contradições geradas pelas políticas neoliberal, que surgem
em busca de alternativas para ocuparem os espaços na sociedade, bem como,
reconhecimento, para darem continuidade a sua sobrevivência, diante desse
sistema tão excludente.
Discutindo o modelo desenvolvimentista no
Brasil
O Estado brasileiro possui em sua ossatura, a estrutura
capitalista, através da qual direciona as suas ações, políticas públicas e
condutas, todavia, o que decidirá a materialização das mesmas que poderá ser em
prol das necessidades sociais ou não, é o bloco no
poder.
Diversas são as
transformações que ocorrem no Estado brasileiro, destacaremos os acontecimentos,
da década de 1930, com a ascensão da burguesia industrial ao poder, as políticas
a partir de então, passam a serem direcionadas para o campo industrial, pois,
a Política Econômica Nacionalista (1930-1945) demonstra o
enfraquecimento da oligarquia rural, predominantemente cafeeira, durante a
Grande Depressão e o surgimento de grupos sociais urbanos, classe média e
operários industriais, proporcionando através disso, uma crescente intervenção
do Estado na economia. Sobre este aspecto Ianni (1991, p.
25):
[...] á
revolução de 30 é o fato de que ela cria condições para o desenvolvimento do
Estado burguês, como um sistema que engloba instituições políticas e econômicas,
bem como padrões e valores sociais e culturais de tipo propriamente
burguês.
Com o Governo Getulio Vargas, há mudanças nas estratégias e ações
de governo, como já colocamos há uma maior ênfase na industrialização. Todavia,
cabe ressaltar que a Revolução implicou na derrota do Estado oligárquico e não a
liquidação do mesmo, pois a oligarquia ainda representava um numero
significativo na elite brasileira e consecutivamente as suas ações, ainda eram
significativas.
Durante o período de 1930 a 1945, primeiro governo de Getulio
Vargas, o nacionalismo econômico foi à característica principal desse governo,
através dessa linha de pensamento que era a predominante na época, as políticas
e ações governamentais eram formuladas, tanto no viés econômico, como social e
político.
Assim,
nos anos de 1930-45, o governo federal criou comissões, conselhos,
departamentos, institutos, companhias, fundações e formulou planos. Além disso,
promulgou leis e decretos. (...) Tratava-se de estudar, coordenar, proteger,
disciplinar, reorientar e incentivar as atividades produtivas em geral. Ou seja,
tratava-se de formalizar, em novos níveis, as condições de intercambio e
funcionamento das forças produtivas no mercado brasileiro. Além disso
pretendia-se também, estabelecer novos padrões e valores, ou reafirmar os
padrões e valores específicos das relações de instituições capitalista. Nota-se
que a cultura brasileira ainda estava impregnada das heranças dos valores e
padrões surgidos ma sociedade escravocrata. (Ianni 1991, p.
34)
Através disso, vemos quais são os direcionamentos
das políticas no Governo Vargas, que está voltada para uma reorientação entre o
Estado e economia. A urbanização também é uma marca forte nesse período.
Poulantzas (2000, p 142) ao discutir sobre o Estado, destaca
que:
[...] o funcionamento
concreto de sua autonomia e o estabelecimento de sua política através das
fissuras que caracterizam-no, não se reduz às contradições entre as classes e
frações do bloco no poder: dependem da mesma maneira, e mesmo principalmente, do
papel do Estado frente às classes dominadas. Os aparelhos de Estado consagram e
reproduzem a hegemonia ao estabelecer um jogo (variável) de compromissos
provisórios entre o bloco no poder e determinadas classes dominadas. Os aparelhos de Estado
organizam–unificam o bloco no poder ao desorganizar–dividir continuamente as
classes dominadas, polarizando-as para o bloco no poder e ao curto–circuitar
suas organizações políticas específicas. A autonomia relativa do Estado diante
de tal ou qual fração do bloco no poder é necessária igualmente para a
organização de hegemonia, a longo termo e de conjunto, do bloco no poder em
relação às classes dominadas, sendo imposto muitas vezes ao bloco no poder, ou a
uma ou outra de suas frações, os compromissos materiais indispensáveis a essa
hegemonia.
Esse período também é marcado por uma ditadura
que se inicia em 1937, que se denominará de Estado Novo, devido ao surgimento de
uma “ameaça” socialista, usa-se do meio da ditadura para controlar e sufocar
esses movimentos sociais, que eram de cunho, trabalhistas, raciais, feministas,
entre outros.
Durante o primeiro mandado de Vargas, o Estado
estava comprometido com o liberalismo econômico e, por isso, não tomou medidas
adequadas para acelerar o processo de
desenvolvimento.
O segundo mandado (1951-1954) é caracterizado por
uma política de emancipação econômica, pois é no período de 1952-1953 que são
criadas importantes instituições estatais, como a Petróleo Brasileiro S.A.
(Petrobrás) e Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobrás), entre outras
instituições. Com isso vemos que, estava sendo criadas novas condições para a
expansão e a diferenciação do sistema econômico brasileiro, proporcionando
mudanças que influenciariam nas próximas transformações na economia do
País.
Nos anos cinqüenta,
vemos no Brasil ganhar força o discurso sobre o regional tornando-se “um
referencial para se compreender e atuar sobre o território brasileiro” (Lencione
1989, p. 120), esse discurso ganha impulso devido o fato de que, pouco se
conhecia sobre o território brasileiro, e o mesmo se encontrava em “ilhas”, pois
não havia uma integração nacional, muitas regiões estabeleciam maiores relações
com países vizinhos do que com o próprio território nacional. Com isso surge
então a necessidade de se conhecer o regional, bem como, compreender os
desequilíbrios regionais que se perfaziam, passando então estas preocupações a
ser uma questão de Estado.
Nesse contexto, surge então em 1956 o Plano Metas de Juscelino
Kubitschek, com os objetivos de transformar a economia brasileira e promover
mudanças no território, o que demandaria um longo tempo, transformando 50 anos
em 5 anos, baseado na ideologia do desenvolvimento pautado na industrialização.
Este foi palco para o inicio do processo desenvolvimentista que se desencadearia
no país e se fortaleceria na ditadura militar
(1964-1985).
Nesse período desenvolvimentista, ao se referirem em desigualdades
regionais, ficavam restrito as discutições, entre o binômio Nordeste/Sudeste,
sobre esta questão Lencione (1989, p. 121) coloca
que:
A
explicação do desenvolvimento desigual, pelos chamados desequilíbrios regionais,
ao se reduzirem a essa bipolaridade Nordeste, Sudeste – abriram caminho para a
transposição de analises dos analistas no entendimento do desenvolvimento
desigual. Os pares foram montados: Sudeste desenvolvido, Nordeste
subdesenvolvido; o moderno e o arcaico, o novo e o velho e, deram o fundamento
para as teorias dualistas e as do colonialismo
interno.
Contudo, nesse período podemos observar a participação do Estado
nesse processo de institucionalização do regional, bem como, a desconcentração
do capital hegemônico do sudeste para as demais regiões do país, mesmo sendo
visível, a redução da explicação das desigualdades regionais entre sudeste e
nordeste. Todavia não podemos desconsiderar as demais regiões, pois ainda nos
anos cinqüenta deu-se a construção de Brasília no Planalto Central, na região
Centro-Oeste, e através disso, a referida região passou a participar de
políticas governamentais e receber incentivos por parte do Estado.
Nesse contexto, o Estado então decide criar superintendências, para
descentralizar os investimentos que somente estavam concentrados na região
sudeste do país, com isso em 1959 cria-se então a Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE, as demais superintendências regionais
foram criadas posteriormente no governo militar. Através disso, Lencione (1989,
p.122), admoesta que:
As
políticas de desenvolvimento regional foram explicitadas como estratégias de
intervenção apenas com a formulação da questão nordestina, ou seja, a partir dos
interesses do capital hegemônico e da necessidade de se dar uma resposta à
oposição política gestada pelas lutas populares. (...) Dos flagelos da secas ao
imperativo da industrialização, desnaturalizando-se os problemas da questão
regional e a possibilidade de uma legitimação fundada na necessidade da
reprodução do capital hegemônico, assentado sobretudo no Sudeste, que precisava
colocar o seu projeto da integração produtiva do território como interesse
geral. A necessidade da sua expansão industrial deveria ser traduzida no
interesse do desenvolvimento industrial como meta fundamental e insubstituível
para superar as desigualdades regionais de
desenvolvimento.
A partir da visão da autora, podemos observar que esse discurso
desenvolvimentista que estava colocado, visava apenas os interesses do capital
hegemônico, havendo necessidade de explorar recursos de áreas até então
desconhecidas e valorizar os interesses do Sudeste, propagando a ideologia de
que essas questões fossem de interesse geral.
Em 1964 os militares assumem o poder do país, não mudando o
ideário desenvolvimentista que já estava colocado, alimentando ainda mais, pois
os interesses do desenvolvimentismo, pautado no “progresso” e “desenvolvimento”
através da industrialização, bem como, a busca pela integração nacional, na
verdade eram mecanismos para preparar o território para penetração, expansão e
mobilidade do capital hegemônico, cabe ressaltar que a importância não se dava,
nem o mercado local, através de suas produções locais e nem a mão-de-obra local
que contava, mas sim os mecanismos de reprodução do grande capital. A respeito
do “planejamento autoriatário” Limonad (2004, p. 60) argumenta
que:
Após 25
anos de planejamento autoritário os resultados obtidos em termos da
desconcentração espacial da riqueza foram irrelevantes (...) com uma
complexificação e diversificação dos problemas sociais e econômicos. O Estado,
responsável direto pelas políticas e implementação do planejamento, desde a
última década do século XX converteu-se em promotor e financiador do
planejamento, implementado em parceria com iniciativas privadas, com o objetivo
de inserir e articular o país aos fluxos globais e torná-lo competitivo
internacionalmente.
Contudo, o ideário desenvolvimentista começou a entrar em crise,
devido ao crescente empobrecimento, bem como, o fracasso do projeto de
desenvolvimento através da industrialização, que acabou marcando severamente a
realidade e as disparidades regionais, que ao invés de diminuírem, só
aumentaram.
A crise
se aprofundava. Saídas foram tentadas. A busca por créditos externos, a ida ao
FMI e aos acordos firmados para ajustamento da economia, acabaram significando o
agravamento da recessão econômica. Dentro deste quadro outros setores sociais,
as classes médias urbanas, foram alvos ônus, desde a elevação de impostos até a
poupança forçada via contração salarial. O abismo havia chegado à classe média e
assim, soçobrava o grande mercado consumidor da indústria nacional, que era
pega, também, pelo lado da realização da mercadoria. Neste sentido os tributos
indiretos também se comprimiram. (Lencione 1989, p.
127)
Embora diversas fossem as tentativas para tentar salvar e
assegurar o modelo desenvolvimentista entrava em crise, pois o mesmo não
conseguiu responder as necessidades sociais, bem como, as enormes disparidades
regionais que se faziam presente.
Consenso de Washington, políticas neoliberais e possíveis
alternativas.
Nesse período, precisamente em 1989 nos Estados Unidos ocorreu uma
reunião patrocinada pelo Instituto Internacional de Economia em Washington, com
participação de técnicos e personalidades do governo dos Estados Unidos, do
Banco Mundial, do FMI, e de empresas transnacionais, aprovando uma série de
medidas, entre as quais, estava à abertura econômica para os Estados nacionais,
o que implicava na redução ou eliminação de barreiras protecionistas, surgindo
assim o Consenso de Washington, com qual veio ensejado às políticas
neoliberais.
As políticas neoliberais vieram a desarticular todo o processo de
planejamento e investimentos estatais que as nações menos desenvolvidas haviam
criado para integração espacial e o desenvolvimento dos seus territórios, pois a
partir dos anos de 1990, os países Latino-Americanos e os demais países
subdesenvolvidos, passaram a adotar essas políticas elaboradas através do
Consenso de Washington, fazendo emergir uma nova ordem mundial. A partir disso
as políticas públicas são formuladas e baseadas na crença da racionalidade
decorrente dos ajustes de mercado e das negociações efetuadas em espaços
decisórios e segmentados.
Com o fim do regime militar no Brasil, nos anos de 1985, trouxe
expectativas para o bloco no poder, permitindo o avanço e a redemocratização do
Estado e a socialização da política, buscando a construção de uma “nova
política”, ocasionando a fusão das esferas políticas e não-políticas, do Estado
e da sociedade civil, permitindo assim a entrada do neoliberalismo nas decisões
do governo brasileiro.
O processo
neoliberal, embasado no desenvolvimento global que conduziria as nações ao
sucesso econômico e social, reorganiza os processos de materializações e os
discursos a respeito das articulações do Estado para planejar seu
desenvolvimento econômico, social e político. Diante desse contexto que se
perfaz na década de noventa Acselrad (2000, p. 88) destaca
que:
[...]
uma nova ortodoxia do desenvolvimento incorporou ao longo dos anos 90 um
conjunto de inovações discursivas que procuraram redistribuir legitimidade e
poder no que se refere ao governo dos homens e das coisas. (...) A questão
colocada era: como “ajudar” o desenvolvimento desses países sem ferir a
soberania política de seus governos, e respeito aos próprios estatutos do Banco
Mundial? A solução discursiva encontrada foi a de separar as funções
propriamente políticas – mantidas na orbita dos governos nacionais – das funções
ditas “de governança”, entendidas como de corte estritamente gerencial,
passível, portanto de serem assumidas pelos organismos
multilaterais.
O Consenso de Washington, veio em busca de um novo paradigma para
o mundo globalizado no terceiro milênio. Todavia, esse novo paradigma veio
propiciar o imperialismo norte americano sob os demais países subdesenvolvidos,
que através dessas políticas neoliberais ficaram a mercê do Banco Mundial e do
FMI, pois as suas dividas externas foram se agravando cada vez mais, devido essa
busca incessante por inovações tecnológicas, desenvolvimento e na tentativa de
se igualar aos países tidos como desenvolvidos, entretanto, não passaram de
países onde seus recursos naturais e mão-de-obra barata foi
explorada.
Através disso, vemos que o modelo neoliberalista
vem substituir o ideário desenvolvimentista nos anos 90, propondo o crescimento
ilimitado da economia de mercado.
O modelo neoliberal, caracterizado pela abertura
e desregulamentação dos mercados e a privatização das empresas públicas e a
precarização das relações de trabalho (...) (Rattner 2000, p.
17).
Esse fortalecimento da economia norte americana, bem como, a sua
hegemonia, se deu devido o esfacelamento da União Soviética e a com a queda do
muro de Berlim, o que representou fatores favoráveis, sob este aspecto Sader
(2005, p. 20) declara que:
[...] a
desaparição do líder do campo oposto: a URSS. Além disso, no seu próprio campo,
os Estados Unidos viram o Japão completar mais de uma década de recessão e a
Europa manter um nível muito baixo de crescimento. Assim, sua posição é muito
mais favorável do que a que tinha no período anterior à queda do muro de Berlim.
O seu principal adversário, aquele que funcionava como líder do bloco que se
opunha ao bloco capitalista, desapareceu, junto com tudo o que era o “campo
socialista” na Europa ocidental. Só isso já representa uma mudança estrutural
altamente favorável aos Estados Unidos.
Através disso, há um fortalecimento da economia norte americana, e
com isso as políticas neoliberais ganharam força a ponto de se imporem sob
culturas, e organizações estatais tentando através dessa hegemonia, estabelecer
uma forma global de produção e modos de viver e fazer o território.
A partir dessa lógica globalizante, vemos o que Haesbaert (2005),
chama de compressão “tempo–espaço”, devido que, as relações espaciais entre
fluxos, comunicações, pessoas passam a se dar de uma forma mais rápida, o que
vem marcando a pós-modernidade e a desterritorialização do tempo e do espaço.
Haesbaert (2005, p 17) sobre a compressão “tempo-espaço” coloca
que:
Trata-se tanto da compressão tempo-espaço, no sentido mais
abstrato de um distante que se torna próximo pelos recursos tecnológicos de que
dispõem quanto de uma experiência de contato com o outro, o estrangeiro, este
“distante” que se torna próximo praticamente a cada esquina nas grandes
cidades.
A globalização veio favorecer as inovações
técnicas e enfraquecer as organizações sindicais, sob uma modernização que é
incapaz de integrar uma sociedade.
Todavia essa forma, neoliberal, hegemônica e globalizante, procura
se impor sobre os Estados-Nações, sendo colocado como a única forma para se
adquirir desenvolvimento e os que não participam dessa lógica são considerados
atrasados, porém, os territórios não participam de forma igualitária dessa
lógica, havendo a partir disso a fragmentação e seleção dos espaços, que de
acordo com Haesbaert (2005), estamos inseridos em uma “confusão espacial e
social”, o que ocasiona insegurança social, crise das representações sociais,
associadas, também, à desterritorialização.
Nos países periféricos houve interrupções nos processos formadores
do mercado interno, neutralizando as forças redistributivas que até então se
organizavam em espaços de solidariedade, para dar espaço à hegemonia da
globalização.
A partir dessa lógica neoliberal, o mundo dos negócios é
controlado por organizações empresariais gigantescas, que se apropriaram do
poder decisório do Estado, decidindo a partir de então onde, quando e como
investir. Essas corporações controlam as riquezas e detém o poder político sem
responsabilidades sociais, tudo em nome da liberdade do mercado, com isso
aparece à fragilidade do Estado, perdendo credibilidade e capacidade de
governança, apresentando uma democracia representativa, fictícia. Com isso,
Rattner (2000, p. 15) destaca que:
[...] o
Estado encarrega-se do planejamento e da infra-estrutura; as empresas, da
produção, mas não do controle dos recursos naturais; e as áreas sociais -
educação, saúde, comunicação e cultura – requerem a presença da sociedade
civil.
Com as políticas neoliberais e o Estado mínimo, observamos que
estas políticas não vieram restringir a intervenção do Estado, mais sim veio
modificando substancialmente o seu caráter, restringindo-se a criação de espaços
de expansão e lucratividade para as atividades privadas e reprodução do capital
financeiro globalizado, ou seja, os setores sociais ficaram a margem desse
processo gerando o que Haesbaert (2005) vem chamando de “aglomerados de
exclusão”, pois nesse período há uma massa enorme de pessoas desempregadas, que
conseqüentemente desencadeou em uma serie de outros processos, e ainda havia
aqueles sujeitos que já se encontravam a margem desse processo e não viram
melhorias nas suas condições de vida. A respeito dos “aglomerados de exclusão”
Haesbaert (2005, p. 24) define que:
Esses
“aglomerados”, bem representativos dos níveis mais pronunciados da
“desterritorialização” contemporânea, seriam marcados por características
representativas dos processos de exclusão sócio-espacial ou de
des-territorialização precária em que estão inseridos,
como:
(1) a
instabilidade e/ou a insegurança socioespacial;
(2) a
fragilidade dos laços entre os grupos sociais e destes com o seu espaço (tanto
em termos de relações funcionais quanto
simbólicas);
(3) a
mobilidade sem direção definida, como em muitos fluxos de refugiados, ou a
imobilidade sem efetivo controle territorial (...)
Esse período é marcado, pela ausência do Estado
sob determinadas questões, pois há uma “(...) ampliação da esfera não política,
temas antes não políticos se despolitizam e passam para a esfera privada.
Práticas governativas são transferidas para atores não-estatais através de novos
canais (...)” (Ascelrad 2000, p. 91), através disso vemos a ausência do Estado
nas questões sociais, que ficaram a mercê do
mercado.
Entretanto, podemos observar que este sistema se encontra em
crise, pois o neoliberalismo conseguiu sim, sustentar a sua proposta
fortalecendo a economia dos países ricos, e enfraquecendo a economia dos países
periféricos, porém, há um recuo no processo de globalização, e os efeitos
ocasionados por esse recuo deixa transparecer no pronunciamento das principais
autoridades e porta-vozes das instituições que dominam o cenário
econômico-financeiro mundial. A partir desse recuo do neoliberalismo, começou
haver uma forte participação da sociedade civil;
[...]
representado por centenas de milhares de ONGs, ambientalistas, sindicatos,
grupos de defesa do consumidor e outras associações, manifestando, protestando e
exercendo pressões políticas [...] (Rattner 2000 p.
11).
As mobilizações feitas pela sociedade civil, nos deixa claro que
grupos sociais não consentiram com essa lógica excludente que está proposta,
lutam na tentativa de garantirem os seus direitos, bem como, reconhecimento na
busca de se tornarem visíveis para o Estado e a sociedade, que insiste em
negá-los.
Alguns autores
apresentam propostas e medidas para tentar ao menos amenizar tamanhas
disparidades econômicas, todavia, ao pensarmos em possíveis soluções para esse
dilema, nos esbarramos em uma estrutura de poder que está colocada e composta
por forças conservadoras que historicamente exercem poder. “Existe, portanto,
uma contradição profunda entre a legalidade do exercício do poder pelos governos
eleitos e a legitimidade de suas ações durante a vigência de seu mandato.”
(Rattner 2000 p. 13).
Mercadante & Tavares (2001), em seu texto “Eixos de um novo modelo”,
vem apresentando algumas possibilidades para uma possível mudança, que eles
chamam de “projeto alternativo” um projeto que:
[...]
abra caminho para a construção de um futuro sem exploração e sem opressão, (...)
capaz de ampliar o leque de alianças contra este modelo atual, mobilizar as
forças populares e assegurar a sustentação das políticas transformadoras.
(Mercadante & Tavares 2001, p. 10)
Esse “projeto alternativo” proposto por Mercadante & Tavares
(2001), é colocado na busca de incluir os subcidadãos na dinâmica econômica,
promovendo o crescimento econômico, geração de empregos, redirecionando os
gastos públicos, democratização dos direitos de propriedades, economia
solidária, permitindo a transformação do salário mínimo em um salário básico
compatível com as necessidades das famílias e
sujeitos.
Contudo, transformar somente o social no eixo do desenvolvimento,
não seria suficiente para responder as demandas que estão colocadas, se fazendo
necessário, conceber os programas de investimentos em “verdadeiros vetores de
crescimento e transformação da economia, subordinando a dinâmica econômica aos
objetivos e prioridades macro-sociais” (Mercadante & Tavares 2001, p.
11)
O autor Ratter (2000), vai um pouco mais além, defendendo a idéia de que
para haver uma sociedade sustentável, é necessário liberdade e participação dos
indivíduos, no entanto o próprio Rattner (2000) declara que não possui formula
pronta para concretizar o objetivo da sociedade sustentável, contudo sugere que
a sociedade se mobilize, se organize em busca de articular objetivos econômicos,
sociais e ambientais, em vez de esperar o advento da grande utopia. Para
conquistar os objetivos sociais não podemos nos ater a assistência paternalista
aos carentes:
[...]
queremos a conquista de objetivos sociais numa ordem democrática e
participativa. Processos democráticos são fundamentais para a construção de uma
sociedade sustentável, orientada por valores e não somente por uma racionalidade
instrumental. A população seguirá seu próprio caminho sem depender de favores do
Estado e das empresas. (Rattner 2000, p. 15).
O modelo neoliberal permitiu que ocorresse o aprofundamento das
assimetrias sociais e econômicas, transformando os desempregados em
marginalizados do convívio social. As alternativas em relação às políticas
neoliberais estão sendo colocadas através das políticas públicas, construídas
por governos populares municipais, estaduais e federais, apresentando propostas
como: orçamento participativo, bolsa escola, bolsa família, construção de
universidades, escolas, bibliotecas, banco do povo, incentivando a economia
solidária.
Mesmo sendo hegemônico o capitalismo “não consegue impedir que se
desenvolvam outros métodos alternativos de modo de produção, pois ele é incapaz
de inserir em si toda a população economicamente ativa” (Singer 2001, p. 44).
No entanto, a economia solidária e outros métodos alternativos
somente são possíveis a partir da conscientização das pessoas e de seus
interesses em se organizarem, para promoverem uma produção que seja de todos os
que a utilizam para gerar o produto social.
O maior desafio desse
paradigma do desenvolvimento alternativo é o de transformá-lo em política
nacional assumida pelo Governo Federal, ou seja, “necessitamos de um programa
capaz de mudar e governar o Brasil” (Mercadante & Tavares 2001, p.
14).
Considerações Finais
É passível de observação, as mudanças que ocorreram no Estado
brasileiro quando o mesmo deixa o discurso desenvolvimentista que surge na
década de 1950 e passa a dotar medidas e discursos
neoliberais.
O governo no período do desenvolvimentismo cria as
superintendências regionais, com a finalidade, segundo o discurso, de promover o
“progresso”, desenvolvimento e a integração regional, procurando descentralizar
da região sudeste, permitindo a migração de empresas e indústrias para as demais
regiões do país.
Sendo o objetivo desse discurso de governo, o de diminuir as
disparidades regionais que se perfaziam no território brasileiro, investindo em
infra-estruturas, políticas de colonização, incentivos fiscais, para promover o
“progresso” das regiões que eram consideradas arcaicas, “atrasadas”, com a
ideologia de promover empregos e o desenvolvimento
local.
Contudo, os objetivos dessas políticas nesse
período, era o de abrir espaço para a expansão do capitalismo nas demais áreas
do país. Entretanto, esse modelo entra em crise, devido o crescente
empobrecimento e industrialização fracassada, marcando a realidade dos projetos
das superintendências regionais, e as disparidades regionais que ao invés de
diminuírem aumentaram de forma significativa, ou seja, o modelo
desenvolvimentista já não respondia mais com as necessidades e dificuldades que
se faziam presente.
Diante dos contextos mundiais, que acabaram afetando não somente a
economia, mais a estrutura estatal brasileira, principalmente após o Consenso de
Washington em 1989, aprovando
uma série de medidas, entre as quais, estava à abertura econômica para os
Estados nacionais.
A partir disso, na década de 1990 os países subdesenvolvidos adotaram as
técnicas e metodologias impostas pelo Consenso de Washington, ou seja, adotaram
as políticas neoliberais que promovia a abertura econômica, o Estado mínimo,
ficando o mercado responsável pela produção e o Estado pela infra-estrutura e o
social.
No entanto, o Estado passa a ficar a mercê do
mercado, se ausentando das políticas de planejamento e principalmente das
políticas sociais, vislumbrado cada vez mais a reprodução do capital hegemônico,
sob a ótica da globalização.
Como resistência, a esse modelo excludente a sociedade vem se
mobilizando através de protestos, lutas pela posse de terra, movimentações,
consolidação de cooperativas solidárias, com moeda própria, com toda uma relação
de trabalho diferenciada da lógica capitalista, com a conscientização política
colocando no poder governos populares, que buscam a participação da sociedade na
consolidação de políticas.
No entanto, a luta desses segmentos incluídos precariamente,
contra o sistema neoliberal, sistema do qual, se encontra em crise, pois o mesmo
não foi capaz de sustentar as contradições e os contra-discurso por ele criados,
propondo estes sujeitos marginalizados projetos alternativos que visem à
possibilidade de ampliar o leque de alianças contra o modelo atual, na busca de
assegurar e sustentar políticas transformadoras.
Todavia, o que presenciamos no século XXI, através de toda essa
multiterritorialidade, fluidez, globalização, redes, é uma fragmentação dos
movimentos sociais, não havendo uma articulação um com outro, na luta por
mudanças estruturais. Observamos que a luta dos mesmos se restringem para se
incluírem na dinâmica econômica do sistema capitalista, contudo, se faz
necessário principalmente para adquirirem condições para a manutenção e
sobrevivência de suas vidas.
Com isso, vemos quais são os verdadeiros interesses do Estado
capitalista, mesmo no desenvolvimentismo com o ideário do “progresso”, com o
objetivo de levar industrialização para as demais regiões, não passava de um
discurso para abrir espaço e novos territórios para a penetração do capital
industrial, que posteriormente vem a ser substituídos pelo capital financeiro e
com a nova ordem mundial, a hegemonia e imperialismo norte americano, a
globalização, que não veio solucionar ou amenizar os problemas existentes e
criados pelo desenvolvimentismo, mais agravá-los ainda
mais.
As políticas cunho neoliberais, são medidas às
vezes imediatas e assistencialistas, com cunho ideológico com discurso muita das
vezes para promover o desenvolvimento social, todavia a lógica é a de continuar
alimentando esse sistema, através disso, nos perguntamos: para que e para quem
são essas políticas? Vemos e analisamos que as mesmas vêm para atender as
necessidades e interesses de uma determinada classe, para dar continuidade ao
processo de produção e reprodução do capital
hegemônico.
No entanto, vemos o surgimento de movimentos
sociais, em busca de reconhecimento, e ocupar os espaços na sociedade dos quais
os mesmos se encontram marginalizados, observamos também, a ascensão de governos
populares tanto na esfera federal, como estaduais e municipais, que vem
proporcionando resistência a essa lógica, propondo alternativas as políticas
neoliberais, embora encontrem muitas barreiras dos processos políticos
dominantes, e a essa estrutura capitalista que está enraizada na ossatura do
Estado.
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Ponencia presentada en el
XIII Encuentro Internacional Humboldt. Dourados, MS, Brasil - 26 al 30 de
setiembre de 2011.
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