Mercado
Público de Florianópolis: no contexto de suas funções
Rodrigo
Born Jaeger*
Resumo
Este
artigo analisa o papel do Mercado Público de Florianópolis, que nasceu no século
XIX para alimentar a cidade, mas que nunca assumiu essa função em sua
totalidade. Ao rever o seu processo de construção social, podemos notar que a
cidade de Florianópolis impôs ao Mercado o modelo higienista de renovação
urbana, com suas práticas de segregação social e espacial. Apresentamos também
as funções do atual Mercado e o seu lugar como patrimônio urbano. Na última
parte, examinamos a atual renovação de concessões públicas para a exploração
econômica dos boxes, convidando o leitor à reflexão sobre o papel do Mercado
para o futuro da cidade.
Palavras-chave:
Mercado Público; feira livre; abastecimento alimentar; reforma
urbana.
Abstract
This
article examines the role of the Public Market in Florianopolis, which was born
in nineteen century to feed the city, but never assumed this function in its
entirety. In reviewing its social building process, we can note that the city of
Florianopolis imposed to the Market the hygienist model of urban renewal, with
its practices of social and spatial segregation. We also present the functions
of the present Market and its place as urban heritage. At the last part, we
examined the current renovation of public concessions for economic exploitation
of the boxes, inviting the reader to the reflection about role of the Market for
the future of the city.
Mercado
Público uma solução para as barraquinhas que enfeavam a entrada de Nossa Senhora
do Desterro.
No
levantamento feito sobre a história das feiras livres em Florianópolis, o
Mercado Público assume um papel de destaque, e o processo de construção deste
nos revelou contextos que vão muito além das relações comerciais varejistas de
gêneros alimentícios, e são estes contextos que revelaram o que possivelmente
possa ter sido a primeira feira livre do centro urbano da então cidade Desterro,
em pleno do século XIX; revelando ainda as relações conflituosas que giraram em
torno desta feira, o que culminou em uma disputa política entre personagens da
elite florianopolitana. Este cenário, mostra uma feira indesejada por não estar
nadequada aos enquadramentos das políticas higienistas, tão bem aceitas nos
centros urbanos da época, mas também, mostra que a feira livre, da Praia da
Praça, tem seu papel na cidade, como fonte de abastecimento alimentar, que por
conseqüência resultava em um fluxo de pessoas relevantes para o restante do
comércio da cidade. Daí o interesse de parte da elite comercial da cidade:
“[...] havia um grupo comercial muito forte nas imediações da praça, que só
aceitou perder o enorme movimento de consumidores que as barrinhas traziam para
o local, diante da visita da autoridade máxima do império brasileiro.” (SILVA,
1996).
A polemica
girou em torno do local onde deveria ser construído Mercado Público, e tendo a
elite no domínio das diretrizes que ordenavam a construção deste espaço, o
resultado foi a construção de um espaço extremamente segregador como mostra o
regimento interno para se obter o direito de explorar um boxe no interior do
mercado. “Em relação ao aluguel das
casinhas, a lei dizia que deveria ser feito por concorrência pública e apenas a
“pessoas morigeradas de bons costumes”. (SILVA, 1996). Aja vista o motivo pelo
qual se exigia do poder municipal a retiradas das barracas da Praia da Praça,
aqueles que teriam o direito de assumir os postos de vendas no mercado não foram
os mesmos feirantes que antes trabalhavam a beira mar.
“A construção do primeiro Mercado Público esteve no centro desta luta
médico-higienista-social. Ao mesmo tempo que se procurava destruir as
barraquinhas para limpar a área central da cidade, procurava-se também evitar um
foco de endemias e livrar aquele local dos indesejáveis representantes das
classes marginais. Tratava-se de uma “toalete social” e de uma “toalete
topográfica”, indissociáveis entre si. [...] É dentro deste contexto que, em
1831, a câmara do Desterro solicita ao governo provincial autorização para
demolir as barraquinhas, porque elas eram “alugadas a pessoas imorais e até
escravos, e que desde a sua origem tem sido receptáculo de roubos e lugar de
todo gênero de prostituição, além do ridículo aspecto que faz apresentar à praia
da praça da cidade” (SILVA, 1996, p. 20)
Como
resultado, tivemos que o mercado foi construído, no ano de 1850, no terreno onde
hoje se localiza a Praça Fernando Machado, logo em frente Praia da Praça. A
locação do prédio não se deu aí por mera coincidência, pois João Pinto da Luz,
era proprietário do comércio na esquina da rua Augusta (atual rua João Pinto),
com a Praça XV de Novembro. E segundo Silva, a “toalete topográfica” foi feita,
porém, a tentativa de limpeza social não surtiu o efeito esperado, além do
Mercado Público, não ter cumprido o seu papel com entreposto de abastecimento
alimentar; nos boxes logo se destinaram a outras mercadorias que não gêneros
alimentícios, faltando espaço assim para os peixeiros e colonos que
comercializarem os seus produtos. Como mostra as matérias do Jornal do Comércio
dos anos de 1881 e 1886:
“Mui conveniente seria que o pescado fosse vendido dentro do mercado, ou
que, a continuar a ser vendido fora, fossem erguidas barracas ou tendas, de modo
a preservá-los dos raios solares” (Jornal do Comércio – Desterro 07/12/1886; in
Silva, 1996 p.28) [...] “Os agricultores padecem do mesmo problema, e “depois de
penosa viagem de dois ou três dias por maus caminhos, não encontram o menor
abrigo nesta capital, e expostos ao sol ardente do verão e às chuvas torrenciais
(...) esses soldados do trabalho, obreiro do progresso, nem ao menos tem um
telheiro de zinco, ou um rancho de tábuas para abrigarem as mercadorias com as
quais enriquecem o nosso Mercado!” (Jornal do Comércio – Desterro 04/09/1888; in
Silva, 1996 p.28)
Ainda segundo Silva, para amenizar a
situação dos verdadeiros feirantes, foi construído ao lado do Mercado Público,
um galpão em caráter provisório, que ficou conhecido como “Galpão do Peixe”.
Situação que demandou por um novo Mercado Público, este que foi inaugurado no
ano de 1899. Críticas feitas por jornais da época revelaram que o processo
licitatório para a ocupação dos boxes do novo Mercado Público, não favoreceu os
antigos feirantes, mais sim pessoas ligadas ao governo
municipal,
“[...] as
críticas do jornal oposicionista se intensificavam. No geral, variam em questões
como sujeira no Mercado antigo, e no restante da cidade, atravessadores no
comércio do pescado e a limitação no número de licenças para a venda destes no
Mercado Novo, o que estava fazendo com que os peixeiros do Mercado antigo
ficassem impossibilitados de fazer o seu comércio, sendo obrigados a vender o
seu produto a preços mais baixos para os atravessadores, justamente aqueles os
que tinham conseguido obter a licença para vender o peixe no Mercado, graças ao
seu “bom relacionamento” com o governo municipal. Este problema foi resolvido
algum tempo depois, com a liberação, por parte do superintendente Raulino Horn,
da venda do peixe em outros pontos da cidade”. (SILVA, 1996, p.
40)
Percebemos
com isso, que as soluções para os problemas advindos da falta de transparência
do processo licitatório de uso do novo Mercado Público, não revê a questão
democrática do acesso a este nobre espaço para o comércio, pelo contrário os
peixeiros indesejados tiveram seus pontos de vendas pulverizados pela cidade. Já
os colonos, assim como eram chamados os agricultores oriundos dos municípios
vizinhos, por sua vez ainda esperaram mais para poder acessar o espaço do novo
Mercado Público. Conforme o estudo realizado por Silva, somente com a construção
da segunda ala deste mercado, trinta e dois anos depois, e ainda sim restritos a
dois dias da semana e, podendo utilizar somente na parte interna da antiga ala,
é que estes puderam montar a sua feira. “A parte interna do prédio antigo foi
fechada e durante muito tempo abriu apenas duas vezes por semana para as feiras
dos colonos”. (SILVA, 1996). O regulamento interno que visava ordenar as
atividades que ali iriam ser exercidas, ao que parece só se fez valer quanto ao
rígido controle para se manter a ordem moral e conseqüentemente a boa imagem da
tão esperada obra pública; porém, quanto à garantia da permanência de um espaço
que servisse para o abastecimento alimentar da população florianópolitana, a
prefeitura foi à primeira romper com o regulamento:
“Naquele momento,
apenas alguns dias depois da inauguração, se pode notar que pontos dos
regulamentos do Novo Mercado já haviam sido burlados, tanto pela população, como
pelos próprios comerciantes. Mas o maior desrespeito a esse regulamento, sem
dúvida, foi da própria superintendência municipal, que liberou a comercialização
de gêneros não-alimentícios no Mercado, passando por cima do artigo 1º do
regulamento interno, de sua própria lavra”. (SILVA, 1996, p 41)
“A praça do mercado
servirá de centro à compra de gêneros alimentícios: a carne verde, toda a
qualidade de pescado, aves, ovos, frutas, hortaliças, legumes, cereais, produtos
da lavoura e quitanda para alimentação” (Lei n° 56 de 28/04/1848. In: SILVA,
1996)
Podemos
ver que a construção do Mercado Público de Florianópolis, apesar de ter sido uma
obra pública construída com verbas da prefeitura municipal, não veio a suprir a
necessidade todos em se ter um espaço limpo e ordenado para a venda e compra de
alimentos. “[...] a verdade é que muitos bens produzidos de forma pública e com
dinheiro público são apropriados privativamente. Aliás, entre estes, certos já
são produzidos para o uso exclusivo de alguns” (SANTOS, 1996) E ao que nos
parece, talvez o Mercado Público desde o seu projeto não tinha o compromisso ser
uma obra que colaborasse com ações de segurança alimentar, mas sim a
consolidação de um espaço que fosse condizente com o os ares de modernidade que
a cidade vivia na época.
Em uma
entrevista realizada, no ano de 1991, pela Revista Geosul, pertencente ao
Departamento de Geociências da Universidade Federal de Santa Catarina, o
geógrafo catarinense Victor Antônio Peluso Jr, depõe sobre suas impressões
guardadas em sua memória da Florianópolis de sua infância e juventude, e através
de breve depoimento temos um retrato de como era o cotidiano desta feira livre,
e a chegada da modernidade urbana a Ilha:
[...] “Morei na rua
Conselheiro Mafra, na Figueira. O cais junto ao mar já estava, mas ainda havia o
velho sobrado a beira-mar. O mercado limitava-se ao prédio na rua Conselheiro
Mafra. Depois era o cais e a praia. De manhã, chegavam as canoas com peixes,
verduras, lenha, louça de barro e outro produtos do continente. Por toda a parte
andavam os carregadores oferecendo-se para transportar o que se comprasse. Umas
das recordações mais fortes era a passagem, pela rua estreita, do automóvel do
Carlos Hoepke ou Eduardo Horn, ocasião em que ninguém se segurava em casa a
gurizada que corria para ver aquela maravilha”. (GEOSUL, 1992,
p.09)
Através
das lembranças de Victor Peluso Jr, podemos perceber como que os processos de
modernização da sociedade não se sobrepõem totalmente ao modo de vida passado,
ao contrário podemos ver no cenário descrito pelo geógrafo, a que a modernidade
se resume a rápida passagem do novo, ou seja, dos dois únicos automóveis existem
na cidade, pelas estreitas ruas acostumadas ao tráfego de carroças e pedestres.
Vemos também, através dos proprietários dos automóveis, que as mesmas famílias
que inovavam a cidade com seus bens, ocupavam cargos importantes dentro do
governo local. E o fascínio que leva gradualmente a implantação de um novo modo
de vida a ser predominante no futuro:
“Já que a cidade é
produto do crescimento e não da criação instantânea, deve-se esperar que as
influências que ela exerce sobre os modos de vida não sejam capazes de eliminar
completamente os modos de associação humana que predominavam anteriormente. Em
maior ou menor escala, portanto, a nossa vida social tem a marca de uma
sociedade anterior, de folk, possuindo os modos característicos da fazenda, da
herdade e da vila.” (WIRTH,1998, p. 91-92)
Embora ele
apareça de forma exprimida pelas novas tendências da modernidade o espaço do
passado sempre esta presente nas cidades, ou melhor, usando o termo miltoniano
para falar sobre, as rugosidades do passado estão presentes na arquitetura, em
hábitos, na cultura realizada nos espaços vividos. E acreditamos que a feira
livre no centro urbano da cidade represente um pouco disso.
Mercado Público na atualidade
forma e função
Florianópolis ao
longo de sua história, e talvez por ter o seu sítio urbano limitado por uma
linha litorânea muito próxima, não mudou o seu centro urbano de lugar. O centro
cresceu em direção das chácaras que rodeavam o núcleo urbano, porém, as funções
administrativas municipais permanecem localizadas nas proximidades das antigas
construções já existentes no início do século XX. E dentro deste contexto,
observamos as funções que o Mercado Público de Florianópolis assume hoje em dia
na vida econômica e social da cidade.
“Se a forma é
primeiramente um resultado, ela é também um fator social. Uma vez criada e usada
na execução da função que lhe foi designada, a forma freqüentemente permanece
aguardando o próximo movimento dinâmico da sociedade, quando terá toda a
probabilidade de ser chamada a cumprir uma nova função”. (Santos, 1985 p.
55)
No
entanto, percebemos que o Mercado Público e o seu entorno permaneceram exercendo
uma função econômica de comércio varejista da cidade de Florianópolis, com
grande circulação de consumidores no local. No passado aí estava o cais do
porto, ponto de chegada e partida da ligação com o continente, hoje se localiza
nas proximidades os terminais de transporte rodoviários, tanto urbanos quanto
intermunicipal. Portanto, do ponto de vista dos fluxos de pessoas e de capital,
o Mercado Público ainda é um ponto valorizado para o comércio varejista. A parte
que, talvez a sua importância quanto ao abastecimento da cidade, não tenha o
mesmo significado, pois o sua capacidade de suporte já não dá mais conta da
demanda da cidade atual, com aproximadamente 350 mil habitantes; mas este se
configura como um local de maior concentração de peixarias da cidade. Também
mantém o seu caráter de ser um espaço de lazer, pois, no seu interior, e aqui
ressaltamos que somente ala sul assume este caráter, localizam-se bares e
restaurantes em que são servidos pratos tidos como típicos da Ilha, o que dá ao
local um valor turístico, que valoriza ainda mais os pontos comerciais aí
existentes, tendo em vista que a economia turística em Florianópolis é uma das
mais relevantes.
“Finalmente, tivemos
a criação dos bares e restaurantes que tornaram o Mercado conhecido em todo o
país. Dentre eles destacam-se o “Pirão”, originário da Beira-Mar Norte – bairro
nobre da cidade – [...] Deve se ficar claro, porém, que estes locais ainda são
minoria dentro do Mercado Público. Existem outros, destinado a um público menos
especializado, que recebem tradicionalmente um número muito maior de
freqüentadores. As peixarias e açougues recebem, naturalmente, pessoas de todos
os tipos, mas são locais de compra e venda e não de parada. [...] O curioso é
que os bares e restaurantes, responsáveis práticos pela verdadeira revolução no
conjunto de mercadores do Mercado Público, transgridem o regulamento atual do
estabelecimento, que diz que naquele recinto é “terminantemente proibida a venda
e o uso de bebidas alcoólicas”. [...] Tais transgressões do regulamento do
Mercado, justamente nos pontos onde ele mais se destaca, estão a demonstrar
Talvez
pelo significado que teve perante o primeiro período de modernização da cidade,
a sociedade local ainda resguarda este papel cultural que mercado apresenta
hoje. O geógrafo Milton Santos quando nos fala das formas e significação social
nos ponta neste sentido:
“Eis porque o
primeiro período de modernização técnica para uma sociedade (isto é, o momento
em ela sofre o primeiro impacto da ordem capitalista internacional) se reveste
de tamanha importância. Estabelece-se então uma rugosidade – espécie de forma
semipermanente – que irá afetar a evolução das funções futuras”. (Santos, 1985
p. 55-56)
Quanto a
função de entreposto exclusivo de alimentos, o Mercado Público nunca assumiu
esta função, a ala norte, que foi a primeira a ser construída e que em certo
momento da sua história abrigou a feira dos colonos, hoje se destina quase que
exclusivamente ao comércio de vestuário e calçados. Já os colonos, continuam
próximos ao mercado, porém se ter direito ao seu interior, nem mesmo agora
possui um barracão, a exemplo do “Barracão do Peixe”, mas ocupam de forma
periódica durante quatro dias da semana, o Largo da Alfândega ao lado das duas
alas do mercado.
Mercado Público, a
Segurança Alimentar, e a gestão do espaço urbano de Florianópolis.
A história
do Mercado Público de Florianópolis que, diga-se de passagem, sustenta a
polêmica em torno de suas concessões públicas até a atualidade, nos mostra que a
ação dos governos municipais de Florianópolis que regulamentam o comércio de
gêneros alimentícios das feiras livre, pouco colaboraram para a melhoria do
setor, pois são pouco objetivas neste sentido e obscuras quanto a sua
legislação. Tampouco, estas ações que colaboraram para a segurança alimentar,
pelo contrário, percebe-se que as tendências foram no sentido oposto, pois as
mudanças feitas no centro da cidade se deram no intuito de dificultar o acesso
das pessoas pobres ao alimento.
Embora,
este conceito de segurança alimentar seja bem mais recente, que este contexto
histórico que aqui expomos. Nada nos impede de fazermos uma análise retroativa,
a fim de verificar como a questão alimentar da cidade era pensada, ou
negligenciada pela municipalidade. O conceito citado abaixo foi retirado da II
Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, realizada na cidade
de Olinda – PE, no ano de 2004.
“Seguridad
Alimentária y Nutricional es la realizacion Del derecho de todos y todas al
acceso regular y permanente de alimentos de calidad, em cantidad suficiente sin
afetar el acceso a otras necesidades esenciales, teniendo como base prácticas
alimentícias promotoras de la salud, que respeten la diversidad cultural y que
sean social, econômica y ambientalmente sustentables” (II Conferência Nacional
de SAN. Olinda, 2004. In
Maluf, 2009).
Sabemos
que mesmo hoje e em países de economia mais desenvolvidas tais como os da União
Européia e os EUA, onde as políticas de segurança alimentar estão mais
adiantadas em relação a nós, este conceito citado acima não é posto em práticas
na sua totalidade. Também, entendemos que os contextos sociais, econômicos e
culturais não tem parâmetros para fazermos comparações, destas distintas
realidades, a atual e a vivida no período entre meados do século XIX até as
primeiras décadas do século passado. Porém, de toda forma, entendemos que a
construção do Mercado Público de Florianópolis, poderia ter colaborado muito
para a qualidade das relações sócio-econômicas, que envolviam a comercialização
e o consumo de gêneros alimentícios, se os princípios que prezavam pela melhoria
do ambiente da feira livre da cidade fossem os norteadores do projeto que
culminou no mercado. Mas, o que vimos neste breve levantamento histórico, a
respeito das primeiras feiras livre de Florianópolis, que teve o Mercado Público
como palco central da regulamentação desta atividade, foi a atitude proveitosa
de pessoas ligadas ao poder do governo municipal, para explorar economicamente
um espaço que estava na vanguarda da modernização urbana da cidade. Além, da
repetição de um modelo de reforma urbana, que teve início na França do século
XVIII, cujo discurso se calcava na higienização dos espaços públicos, esta que
incluía uma limpeza social das áreas centrais das cidades.
Hoje
o Mercado Público não representa mais o que há de moderno, mais sim um
patrimônio histórico de Florianópolis, por assim ser, é valorizado como atração
turística e continua sendo um importante ponto de comércio do centro; e a
democratização deste espaço público, que viria com uma licitação sobre os boxes
de venda, não ocorre porque os que lá estão instalados alegam que historicamente
suas famílias conquistaram o direito de explorar o espaço e, e para isto
continuam contando com a conivência da prefeitura municipal. Ao abrir o processo
licitatório do Mercado Público, a prefeitura poderia resgatar o artigo primeiro
do regulamento interno, consolidando assim em um espaço exclusivo para a o
comércio de gêneros alimentícios, diminuindo assim a pressão que a urbanização
exercer sobre a feira livre de rua, colaborando então para a segurança alimentar
da cidade. Como nos mostra a passagem abaixo, a feira livre é extremamente
vulnerável as mudanças de zoneamentos praticadas pelo poder municipal.
“É, portanto, um serviço que depende da concessão da
municipalidade para temporariamente se apropriar dos logradouros. Existe neste
sentido uma dimensão política de territorialidade em relação direta com o poder
governamental. O feirante não é proprietário da fração do espaço que utiliza, ao
contrário do comércio tradicional. Ele apenas adquire, em caráter precário, o
direito de usufruir daquele espaço em dias da semana e horários preestabelecidos
pelo poder público, para expor determinados produtos segundo regras também
pré-determinadas. Isto significa que a feira livre depende inteiramente da
vontade política municipal, pois ela não apenas determina o local e condições de
funcionamento, mas também pode remanejar ou mesmo extinguir feiras livres, já
que a ela cabe a gestão da via pública (Jesus, 1991.
p.18-19)”
Recentemente, a
Prefeitura Municipal de Florianópolis, renovou tais concessões destes
comerciantes por mais quinze anos. Embora, este seja um ponto de litígio, pois o
Ministério Público intimou a Prefeitura Municipal de Florianópolis a abrir o
processo licitatório em um período não superior a seis meses.
Conclusão
Com este
breve estudo, percebemos que por vezes, uma demanda pública por uma obra que
atenda a todos exercendo a sua devida função coletiva, pode ser aproveitada por
uma minoria de pessoas para que se construa com o dinheiro público, na prática
espaço que supram demandas econômicas particulares; e por conseqüência a sua
função pública deste espaço pouco fará para resolver o problema que fez com a
que a obra fosse lançada. Com o Mercado Público de Florianópolis acontece algo
semelhante, e que se perpetua por anos na medida em que ainda hoje a sua
concessão para a exploração econômica por parte dos comerciantes, permanece
sendo um processo público administrativo da Prefeitura Municipal da cidade, com
caráter nebuloso, pouco transparente no que diz respeito às licitações
concedidas por este órgão. No mais, o que deveria ser um espaço comercialização
de alimentos, que surgiu como uma promessa de melhoria para as feiras livres,
nunca apontou nesta direção, pois, as feiras livres da capital permanecem em
estado de vulnerabilidade por não ter um espaço garantido exclusivo a elas.
Porém, este trabalho nos trouxe alguns apontamentos para a pesquisa sobre a
evolução das feiras livres de Florianópolis, na medida em que indicou o papel
que esta assumia na história da cidade enquanto o abastecimento alimentar da
população florianopolitana. Mas, também ficaram algumas importantes perguntas
sem respostas. E estas merecem por sua vez dedicação de nossa parte, visando
respondê-las. São elas: Como se dava a circulação e o comércio da produção
agrícola produzida insular mente, (nas comunidades agrícolas de
Florianópolis) e provavelmente esta produção chegava ao centro da cidade, e de
que forma que ela era vista e qual o seu significado para a economia da cidade?
E a segunda questão é: quando para resolver a questão dos atravessadores do
pescado, a prefeitura liberou o comércio do mesmo em outros pontos da cidade,
onde o pescador poderia vender diretamente ao consumidor o seu produto, estes
pontos deram origem a outras feiras livres? Já que os colonos não tiveram acesso
ao Mercado Público assim como os pescadores em questão. Por fim, concluímos que
a presente pesquisa colaborou para a pesquisa maior na medida em que indicou
importantes caminhos a serem investigados com maior profundidade.
Bibliografia
consultada
MALUF,
Renato. Seguridad Alimentária y
Nutricional un enfoque de derecho y soberania. 2° ed. Quito: CAFOLIS, 2009.
190 p
REVISTA
SO DEPARTAMENTO DE GEOCIÊNCIAS – CCH. Florianópolis: Editora UFSC, 1991. 247 p
SANTOS,
Milton. Espaço & técnica. São
Paulo: editora Nobel, 1985
SILVA,
Nivaldo Jorge. A descoberta do Mercado
Público. Florianópolis: Associação dos Comerciantes e Varejistas do Mercado
Público de Florianópolis,1996. 59 p.
Ponencia
presentada en el XII Encuentro Internacional Humboldt "El Capitalismo como
Geografía", La Rioja, Argentina - 20 al 24 de setiembre de 2010.