INDÚSTRIA E
COMÉRCIO NA REGIÃO SUL: Algumas considerações
Carlos José Espíndola
José Messias Bastos
Resumo
O desenvolvimento
atual das três grandes áreas geoeconômicas do Sul do Brasil está alicerçado na
criação de um tecido industrial que teve seus fundamentos construído a partir da
pequena produção mercantil que foi implantada com o povoamento das áreas de
floresta desta porção do território brasileiro.
Abstract
The
current development of three major geoeconomic areas of southern Brazil is
founded on creating an industrial structure that had its foundations built from
petty commodity production, which was implanted with the settlement of forest
areas in this part of Brazil.
Introdução
O
povoamento de parte considerável do território correspondente à Região Sul,
iniciado de forma efetiva a partir de meados do século XVIII, difere em pontos
cruciais do povoamento do restante do território brasileiro, pois a democracia
agrária permitia mudanças muito freqüentes na trajetória econômica dos inúmeros
pequenos, médios e mesmo grandes estabelecimentos industriais, comerciais e
agrícolas. Com grande potencial de consumo e de produção a referida região
integrou-se muito precocemente aos grandes centros comercial (as áreas de
colonização açoreana do litoral ao Rio de Janeiro no século XIX) e industrial
(as áreas alemãs e italianas no século atual à São Paulo). Dessa forma, o
capitalismo industrial engendrado na região a partir de uma consolidada pequena
produção mercantil e inicialmente com pequenos estabelecimentos, teve que fazer
esforço não só de superação das desvantagens locacionais, como também de
empreender estratégias econômicas para fazer frente aos grandes grupos nacionais
e estrangeiros do Centro-Sul do país, pois, conforme MAMIGONIAN (1982),
analisando a história econômica da indústria de Santa Catarina, assinala que
situadas "distantes do mercado consumidor, as empresas catarinenses tiveram que
se aprimorar permanentemente. renovando máquinas e métodos de trabalho.
enquadrando mão-de-obra e rebaixando custos".
Assim
fazendo uma análise da estrutura industrial e comercial do Sul do Brasil,
percebe-se, de forma clara, não só a hegemonia dos capitais regionais no
controle dos empreendimentos dos principais setores do comércio, como também o
dinamismo muito forte das redes de lojas em termos de produtividade, crescimento
e modernização.
Para
completar este quadro ressalta-se a idéia que de o Sul do Brasil não é
periférico ou complementar ao centro dinâmico do capitalismo industrial
brasileiro (São Paulo, principalmente) como ocorre com o Nordeste e o Brasil
Central, mas sim concorrencial, pois foi estruturado nesta porção do território
brasileiro um capitalismo com dinamismo próprio.
Cabe,
então, neste interino fazer um esforço de regionalização do Sul com base no
processo de formação histórico-espacial, a partir da premissa que o comando da
vida de relações na atual conjuntura é ditado pelo tecido industrial edificado
pela imigração européia do século passado nos três Estados Brasil meridional. A
primeira região, da fachada atlântica com industrialização tradicional,
originada a partir do estabelecimento de imigrantes açorianos, alemães,
italianos, poloneses e ucranianos em pequenas propriedades, destacando-se a área
da encosta da serra gaucha e das bordas do planalto mais fortemente polarizado
pela região metropolitana de Porto Alegre, as áreas alemãs do Vale do Itajaí e
de Joinville, o Leste e o Sul catarinense e região metropolitana de
Curitiba.
A
segunda grande região engloba áreas que tiveram no passado a economia de criação
extensiva de gado bovino, em campos naturais, onde se desenvolvem atualmente
atividades ligadas, sobretudo à indústria de papel e celulose, frigoríficos de
carne bovina e indústria madeireira correspondendo às áreas do Sul do Rio Grande
do Sul , campos de Lages, Vacaria, Curitibanos, Guarapuava e de Ponta Grossa).
A terceira região
está localizada mais a oeste dos três Estados sulinos e correspondem as áreas de
floresta que se tornaram fronteira agrícola na primeira metade do atual século,
destacando o Noroeste do Rio Grande do Sul, o Oeste Catarinense, o Sudoeste e
Norte-Noroeste do Paraná, onde são predominantes atividades ligadas a
agroindústria e a implementos agrícolas.
Assim
sendo, este trabalho constitui-se numa primeira tentativa de aproximação entre a
indústria, o comércio e a formação sócio-espacial da região Sul do território
brasileiro.
Esse
texto divide-se em quatro grandes seções. A primeira - composta da introdução -
que visa apresentar a região Sul. A segunda que procura mostrar um panorama
geral da indústria no desenvolvimento do Sul do país. A terceira parte refere-se
à estrutura da indústria sulina, com base na regionalização proposta na
introdução e, a última seção emite considerações sobre a dinâmica do capital
comercial regional.
Palavras chave: Brasil Meridional,
desenvolvimento, comércio, indústria
Keywords:
Southern Brazil, development, trade, industry
Panorama Geral da
Indústria
A
região Sul composta pelos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul,
apresentaram nas últimas décadas um equilibrado desempenho participativo no
conjunto da economia nacional. A tabela 1 demonstra que os valores giraram em
tomo de 17% entre 1970 e 1985. Já a região sudeste diminuiu sua participação no
período em cerca de 7,6%.
TABELA
1
Participação das
Regiões no Produto Interno do Brasil 1970-1985
Anos
Regiões |
1970 |
1975 |
1980 |
1985 |
Norte |
2,1 |
2,0 |
3,1 |
3,8 |
Nordeste |
11,7 |
11,0 |
11,9 |
13.0 |
Sudeste |
65,5 |
64,8 |
62,2 |
57,6 |
C.
Oeste |
3,8 |
4,1 |
5,5 |
8.7 |
Sul |
16,7 |
17,9 |
16,9 |
16,7 |
BRASIL |
100,0 |
100,0 |
100,0 |
100,0 |
Fonte: IBGE. Diretoria de Pesquisas. Departamento de Contas
Nacionais. Adaptado a partir de BANDEIRA, Pedro S. A Economia da Região Sul. In:
Affonso, R. de B.A. & SILVA, Pedro, LB. (Org.) Federalismo no Brasil.
São Paulo: UNESP, 1995
Ademais, entre 1970-85, as taxas médias anuais de crescimento do
produto interno da região Sul foram da ordem de 7,70% contra 6,78% do Sudeste
brasileiro (BANDEIRA 1995). Esse aumento de participação da região Sul no
produto interno brasileiro decorre, dentre outros fatores, de uma significativa
importância do setor secundário, conforme dados da tabela 2. Assim, a
participação do produto industrial na referida região, em relação ao Brasil,
cresceu de 11,9% em 1970 para 15,7% em 1985. O aumento de participação do setor
secundário e a queda de participação do setor primário, foram os responsáveis
pela manutenção do seu desempenho no conjunto brasileiro.
TABELA
2
Participação das
Regiões no Valor da Transformação Industrial no Brasil
1970-85
Anos |
1970 |
1975 |
1980 |
1985 |
Regiões |
|
|
|
|
Norte |
1,0 |
1,3 |
3,1 |
4,0 |
Nordeste |
7,0 |
7,4 |
9,3 |
12,0 |
Sudeste |
79,0 |
75,2 |
68,9 |
65,7 |
C. Oeste |
0,8 |
1,1 |
2,2 |
2,4 |
Sul |
11,9 |
14,8 |
16,2 |
16,7 |
BRASIL |
100,0 |
100,0 |
100,0 |
100,0 |
Fonte:
Idem tabela 1.
A
tabela 2 demonstra ainda, uma perda de participação do produto industrial na
região Sudeste e um aumento de participação nas demais regiões. O aumento de
participação da região Sul no VTI, veio acompanhado da queda de participação de
São Paulo e Rio de Janeiro no total do VTI da indústria de transformação do
Brasil. A indústria paulista, por exemplo, caiu de 58% em 1970 para 51,9% em
1985. Já a do Rio de Janeiro apresentou mna queda de 15.6% em 1970 para 9.6% em
1985 (BANDEIRA, Op. cit., p. 230).
Pelo
exposto verifica-se que a indústria do Sul do país apresentou, nas referidas
décadas, performance e dinamismo superior ao Sudeste, sobretudo os estados
brasileiros (Rio de Janeiro e São Paulo), que se constituem nos principais
celeiros industriais do país.
Todavia, é importante destacar que o desempenho intra-regional
apresenta algumas especificidades. Em termos gerais a indústria riograndense
obteve entre 1970-85, menores ganhos, se comparados com a indústria catarinense
e paranaense. Segundo BANDEIRA (1995), a explicação para um menor dinamismo da
indústria gaúcha, relaciona-se a sua relativa distância ao centro de gravidade
do mercado nacional. BARROS DE CASTRO (1980) ressalta que desde a sua origem a
indústria gaúcha apresentava um caráter regional.
Contudo, conforme LAPOLLI (1993) a industrialização do Rio Grande
do Sul pode ter perdido posição relativa para os dois estados do sul (SC e PR),
mas tem obtido ganho de maior expressão que os Estados como o Rio de Janeiro,
Pernambuco e São Paulo.
No período de
1989-92 - fase de alta recessão - a indústria de transformação riograndense
apresentou taxas de -5,2% a.a., contra -5,5% a.a. da indústria de transformação
nacional (índice econômico FEE, 1992, apud LAPOLLI, 1993) Destaque-se que a indústria riograndense, nas últimas décadas,
vem paulatinamente buscando uma maior integração interindustrial e uma intensa
diversificação.
A
indústria paranaense, por sua vez, cresceu em média, na década de 80, cerca de
4,7% a.a., contra 2,2% a.a. da indústria brasileira. Dentre os principais
fatores responsáveis pelo dinamismo positivo da indústria paranaense, destaca-se
"os investimentos realizados em segmentos modernos, representativos das
atividades relacionadas ao novo paradigma tecnológico da informação e
comunicação. Desta forma, ganharam representatividade os segmentos voltados
para a produção de máquinas e aparelhos eletrônicos, fitas e discos magnéticos e
o de fabricação de aparelhos e equipamentos de telecomunicações" (CUNHA, 1995:
129).
A
partir de 1975 a indústria paranaense apresentou
crescimento acelerado, com taxa média anual de 22% ao ano, no período de 75-80.
Esse crescimento foi substanciado pelo Programa Especial de Fomento à
Industrialização (PEFI) a instalação da Refinaria da Petrobrás, que entrou em operação em
1977 e, promoveram transformações profundas na estrutura produtiva, com o
aumento de participação do setor de química no valor de produção da indústria de
transformação do Paraná. Destacam-se, neste contexto os investimentos
agroindustriais nas cadeias produtivas de carne de frango e suíno, por grupos
locais e catarinenses (Sadia, por exemplo).
Na
década de 80,
a estrutura industrial paranaense é novamente alterada com
os investimentos realizados pela Volvo S/A. Ressalte-se, neste caso, o papel
desempenhado pelas classes dominantes regionais que articularam uma aliança com
o capitalismo monopolista estrangeiro, visando à industrialização recente de
Curitiba (MAMIGONIAN,1982).
Assim,
a participação da indústria de material de transporte, com ênfase na produção de
ônibus e caminhões, aumenta sua participação na produção industrial de 2, 1% em
1980 para 7,2 em 1989. Destaca-se ainda, o aumento de participação das
indústrias de papel e celulose, freezers, refrigeradores, etc.
A
indústria catarinense vem gradativamente aumentando sua participação no PIB da
região Sul do Brasil. De uma percentagem de 18,3% em 1980 para 21,6% em 1984
(MAMIGONIAN, 1986). Esse aumento configura-se, também, no aumento de
participação no total do VTI da indústria de transformação no Brasil. De um
total de 2,56% em 1970 para 3,95% em 1985 e sua população participa com apenas
3% da população brasileira.
A
indústria catarinense é a quinta do país em número de trabalhadores (305 mil) e
a sexta em quantidade de empresas (12 mil) e em 1996 o Estado catarinense
exportou US$ 2,6 bilhões, 5,5% do total exportado pelo Brasil. Em termos de
utilização da capacidade instalada, o percentual médio da indústria catarinense
foi da ordem de 84,1 % contra 81 % do Rio Grande do Sul e 74% do Paraná (FIESC,
1997).
Outras
considerações poderiam ser feitas em relação às indústrias do Sul do Brasil e as
atuantes nos diferentes estados. Mas em termos gerais pode-se afirmar que
"enquanto no Paraná se destacam o Bamerindus e a CR Almeida (engenharia) e no
Rio Grande do Sul a Varig e o Grupo Gerdau (siderurgia) como grandes grupos
nacionais, em
Santa Catarina os grandes grupos privados de projeção nacional
são todos eles industriais e se dispersaram pelas várias regiões: Sadia –
Transbrasil, Perdigão no Oeste; Hering, Artex, Tupy, Tigre-Hansen, Weg, etc. nas
áreas de alemães; Guglielmi, Freitas e Gaidzinski na área carbonifera, além da
Portobello - Usati no Litoral central" (MAMIGONIAN, 1986)
Com
base nos dados, pode-se afirmar que as indústrias do Sul do Brasil apresentaram
notável dinamismo. Contudo, esse dinamismo decorre da responsabilidade de
indústrias específicas que estão regionalmente localizadas em diferentes áreas
dos Estados do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
A estrutura
regional da Indústria do sul do Brasil
Como
visto anteriormente, o processo de ocupação do Sul, ao contrário das demais
regiões brasileiras, esteve diretamente ligada ao processo colonizador estatal e
privado dos últimos séculos. Essa ocupação caracteriza-se "por colonizações
de pequenos agricultores alemães. italianos e poloneses (sec. XLY e XX). que
coexistem com povoamentos luso-brasileiros de origem mais antiga (XVII e XVIII)
e consagrados à criação no planalto, e à pequena lavoura no litoral"
(MAMIGONIAN, 1965: 63).
As
especificidades das etapas dos processos de colonização e a dinâmica econômica
das diferentes atividades produtivas, possibilitou a estruturação de distintas regiões geoeconômicas
no sul do país e nos estados.
Assim,
de forma preliminar, pode-se afirmar que o estado do Paraná, de Santa Catarina e
do Rio Grande do Sul estão estruturados em três grandes zonas geoeconômicas.
Área de
colonização recente (séc. XIX)
Nessa
primeira região destaca-se no Paraná a região metropolitana de Curitiba.
Historicamente. Curitiba é o centro industrializado de maior envergadura no
Estado. Nesse conglomerado urbano instalaram-se grandes montadoras de automóveis
e ônibus, como a Renault, Volvo, Chrysler, Audi e Detroit Diesel Corporation. A
instalação dessas montadoras na região metropolitana de Curitiba contou com o
apoio do Estado do Paraná, através do Fundo de Desenvolvimento do Estado (FDE),
"uma caixa de fomento administrado pelo Banestado, enfardado pelos Royalties de
Itaipu e de todos os investimentos privados no Paraná" (EXPRESSÃO, 1996:
15). Nesse processo o governo do Paraná ofereceu US$ 300 milhões de
participação no capital (40%), terreno (2,5 milhões de m2),
infra-estrutura de estradas e telecomunicações, terminal exclusivo no Porto de
Paranaguá, dilatação no prazo de pagamento do ICMS (4 anos no mínimo) e 10 anos
de isenção de impostos em São
José dos Pinhais (EXPRESSÃO, 1996). Em Santa Catarina, se destacam
nessa região as áreas de origem alemã do Vale do Itajaí e de Joinville e
italiana do Sul do Estado. A área alemã é a mais industrializada do Estado,
totalizando mais de 50% do valor da produção industrial catarinense. Nesta área
destacam-se as cidades de Joinville e Blumenau. Os ramos industriais
predominantes são os de metalurgia, mecânica, elétrico-comunicação, material de
transporte, plástico, têxtil, vestuário-artefatos, têxteis, "química" e
mobiliário e as firmas de projeção nacional e mundial são a Consul-Embraco,
Tupy, Hansen-Tigre, Weg, Hering, Artex etc.). No Sul do Estado destacam-se
grandes centros industriais como Criciúma (cerâmica metalurgia, vestuário),
Tubarão (onde se localiza a Termoelétrica Jorge Lacerda e cerâmica) e Urussanga
(cerâmica). Recentemente foi vivificado os investimentos no setor carbonífero
(paralisado com a abertura comercial do (des)governo Collor) e constituição de
distritos industriais ligados a confecção, calçados, entre outros.
No Rio
Grande do Sul destaca-se o eixo industrial Porto Alegre-Caxias do Sul. A região
de colonização recente do Rio Grande Sul, compreende parte da encosta da serra,
planalto e baixada, sendo caracterizada predominantemente por imigrantes
italianos, que desenvolveram industrialmente a produção vinícu1a
(Dreher-Bento Gonçalves) e frigoríficos (Frigosul-Canoas). Na área de
imigrantes alemães, sobressai a produção de fumo, com a presença da Souza Cruz
desde 1920 em Santa
Cruz do Sul.
Segundo MAMIGONIAN
(1985) "esta pequena produção mercantil, que lembra o povoamento do nordeste dos
EUA no século XVII, foi fator fundamental para entender o êxito de
industrialização de Novo Hamburgo, Caxias do Sul e etc. ". No entorno da Grande
Porto Alegre, grupos como a Ford GM, Pirelli, entre outras anunciaram novos
investimentos. Em contrapartida, na região do Vale do Rio dos Sinos, entre
1991-96, 79 empresas calçadistas faliram e outras 26 fecharam (EXPRESSÃO,
1997a).
Área de Latifúndio
No
Paraná as áreas que fazem parte dessa região são Ponta Grossa, Irati,
Guarapuava, entre outras.
Destaca-se nessa porção do território paranaense a indústria de
papel e celulose (KIabim) em Telêmaco Borba e a Lutcher
(Guarapuava). Por outro lado, a indústria de madeira possibilitou o surgimento
da indústria de fósforos (Irati) e esquadrias (Ponta Grossa).
Na
década de 80 e 90, os campos gerais de Ponta Grossa constituem-se como área de
maior parte dos novos investimentos produtivos no estado do Paraná,
posteriormente a região metropolitana de Curitiba. A sua localização,
relativamente próxima a capital do Estado e ao porto de Paranaguá e também como
zona de passagem dos grãos que vêm do Oeste e do Paraguai, estimularam
investimentos como a construção de fábricas de carpetes (Beaulieu Kruisnoutern -
multinacional com fábricas na Bélgica, África do Sul e Austrália), pneus e
frangos (Sadia). Em Ponta
Grossa, por exemplo, a unidade produtora de produtos derivados
de suínos (do Grupo Sadia) foi reestruturada para a produção de pizza e
salgadinhos.
No
Planalto catarinense destaca-se o beneficiamento de papel e papelão. Nessa área
a produção de maneira acelerada pela modernização das rodovias e a "penetração
dos madeireiros/colonos italianos e alemães do Rio Grande do Sul (Battistella,
Lüersen, Dal 'Asta e outras); assim como também a pasta mecânica iniciada com
técnicas rudimentares por Primo Tedesco em Caçador (1937). " (MAMIGONIAN, 1985)
No segundo qüinqüênio da década de 50, os grupos Hering e Bornhausen montaram
uma indústria para a produção de papel e papelão, mas foram obrigados a vendê-la
ao grupo Olinkraft (EUA). As condições naturais da região, por sua vez,
estimularam a entrada de grupos multinacionais (Rigesa) e nacionais (KIabin).
Na
porção austral do Rio Grande do Sul e nos campos de Vacarias predomina a
pecuária bovina e o cultivo de arroz. A partir de 1917, os governos Federal e
Estadual concederam isenções de direitos alfandegários (5 anos), reduções de
fretes para transporte de carne, empréstimos para atrair grandes frigoríficos,
instalando-se, então, o Armour (Livramento), a Cia de Pelotas (pelotas) e a Cia
Swift do Brasil (Rio Grande). (SUZIGAN, 1989). Ressalte-se que surgiram alguns
frigoríficos de capital local a exemplo do que ocorreu no interior de São Paulo
e do Paraná.
Atualmente essa região é a de pior desempenho econômico e
industrial. O PIE de Pelotas, por exemplo, encolheu quase 7% em 19%. Em Pelotas,
a derrocada da indústria de doces e conservas - em decorrência da importação do
pêssego grego - devastou a economia. O número de empregos no setor caiu de 17
mil em 1989 para 3.500 em 1996. Isto é, uma queda de 485% no total de
trabalhadores empregados no setor (EXPRESSÃO, 1997a: 26). Soma-se ainda, a perda
de competitividade do Porto de Rio Grande. Cabe assinalar que os gaúchos tiveram
decisiva participação na administração pública federal (vários presidentes da
República) o que pode ter contribuído para certo imobilismo empresarial em
algumas regiões do Estado.
Área de colonização muito recente (séc.
XX).
No
Paraná duas grandes áreas fazem parte dessa terceira região geo-econômica. A
primeira Norte-Noroeste do Estado - decorrente da expansão da cafeicultura
paulista, pós década de 20 - caracteriza-se por uma região agrícola muito
importante, onde a indústria surge como complemento à atividade primária.
Trata-se da indústria de primeiro beneficiamento dos produtos primários
abundantes na região. Portanto, nessa área destacam-se as indústrias
alimentares, como beneficiação do café e a extração de óleos vegetais (NESTLÉ,
SAMBRA). A partir de 1975, em decorrência de uma grande geada que dizimou as
plantações, essa região passou a ser sustentada no tripé soja-milho-trigo. Em
termos industriais, destaca-se, recentemente, os investimentos da Dixie Toga na
cidade de Londrina.
O
sudoeste - colonizado por gaúchos e catarinenses descendentes de italianos e
alemães - têm no minifúndio familiar, nas agroindústrias e cooperativas o seu
sustentáculo econômico. Essa área foi alvo de fortes investimentos, entre as
décadas de 60-90, oriundos de grandes grupos econômicos agroindustriais
catarinense, como por exemplo, o grupo Sadia que instalou ou adquiriu unidades
industriais em Toledo (1966), Dois Vizinhos e Pato Banco. Na década de 90 foi
criado em Cascavel o Parque Tecnológico Agroindustrial do Oeste e o Grupo Sadia
investiu, em 1996, cerca de R$ 10 milhões na ampliação de sua unidade em Toledo
e R$ 80 milhões em
Francisco Beltrão.
No
Oeste catarinense merecem destaque os frigoríficos de suínos e aves (Sadia,
Perdigão, Aurora, Chapecó) que após conquistarem o mercado nacional, partiram
agressivamente para a conquista do mercado externo. A partir de 1970, esta
região recebeu vultosos investimentos, por parte do Grupo Hering, para a
produção do farelo e óleo de soja, visando o atendimento do mercado
(CEVAL).
O
Noroeste do Rio Grande do Sul a área de pequenos produtores mercantis,
dedicam-se a produção agropecuária, com o destaque para a produção de milho,
soja e, a criação de suínos. Industrialmente, destaca-se a indústria de máquinas
e implementos agrícolas e agroindustriais processadoras. Ressalte-se que boa
parte dos frigoríficos de origem local foi sendo gradativamente adquiridos pelos
grupos agroindustriais catarinenses (Sadia. Perdigão, entre outros).
Pelo
exposto, verifica-se que grosso modo, as três grandes regiões dos Estados
Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, apresentam uma estrutura industrial
sólida e diversificada. Assinala-se ainda que as referidas áreas alcançaram
grande êxito em seu processo industrial em virtude da abundância de recursos
naturais (madeiras, solos férteis), a capacidade empreendedoras de empresários
oriundos das fileiras da pequena produção mercantil que foi transplantada da
Europa no século passado e as grandes transformações econômicas e políticas a
foi submetido o Brasil, principalmente após a Revolução de 30. Este êxito
industrial contrasta com a fraqueza, até recentemente, da industrialização nas
áreas de pecuária extensiva (Campanha Gaúcha, Campos de Guarapuava, Ponta
Grossa, Lages, etc.) (MAMIGONIAN, 1985).
Considerações
sobre o desempenho do setor comercial no Sul do Brasil
O
desempenho do setor comercial no contexto econômico brasileiro não difere muito
do setor industrial, pois nas estruturas urbanas sulinas percebe-se com nitidez
a hegemonia dos capitais regionais familiares em praticamente todos os ramos do
atacado e do varejo.
Para
obtermos uma idéia do comportamento das principais redes varejista nos últimos
anos, analisaremos a seguir o comportamento do setor supermercadista através dos
levantamentos periódicos realizados pela ABRAS (Associação Brasileira de
Supermercados), divulgados regularmente, desde 1980, através da revista
SuperHiper, quando se observa alternância significativa das redes que disputam a
hegemonia do setor e mesmo o desaparecimento de algumas, como Casa da Banha
do Rio de Janeiro, Morita de São Paulo, por exemplo. No caso das empresas do Sul
do país, o comportamento das redes é diferente, algumas permanecendo
praticamente no mesmo patamar desde o início da pesquisa dos 300 maiores
supermercados do país: outras ganhando, ano após ano, pontos na classificação
geral. Dentre aquelas que se enquadram no primeiro caso, encontram-se as
empresas do Rio Grande do Sul como a Cia. Real de Distribuição que variou no
período de 1980
a 1994 entre as posições de 7° e 10° lugares, A Zaffari
&Cia. variou entre 8° e 13° (em 1997 atingiu a 83 colocação) e a
Nacional CDA Ltda., desse mesmo Estado, que foi rankiada em 1997 na 6ª colocação
(em 1986, quando aparece pela primeira vez no ranking, encontrava-se em 19°
lugar), além do desaparecimento da Cia Do Sul, são as exceções. Entre aquelas
que deram saltos significativos no setor, estão as firmas paranaenses e
catarinenses. Do Paraná aparecem Demeterco & Cia. Ltda. que saltou da
73a posição em 1987 para a 12a em 1997; os Supermercados
Condor Ltda., de 101a para 30a; Irmão Muffato e Pedro
Muffato resultantes da cisão em 1981 do grupo Muffato encontrava-se posicionado
em 64a e, em 1994, se estivessem juntas, estariam no 20a
colocação (estas foram rankiadas em 94, respectivamente, na 38a e 50ª
posição); a SenffParati S.A., de 80° para 45°; e o Supermercados Coletão, de
141° para 42° entre 1980 e 1997.
Em Santa
Catarina destacaram-se no período algumas
redes como o A. Angeloni & Cia. Ltda. e os Supermercados Vitória Ltda. que
saltaram respectivamente, de 43° e 68° lugares em 1981, para 20° e 22° em 1997;
os Supermercados Santa Mônica, de 145° para 83° no referido período, em 1996, um
ano antes da divisão que deu origem Hippo supermercados, a empresa chegou a
atingir 70ª colocação.
No ramo
de lojas de móveis e eletrodomésticos a rede de Lojas Arapuã de São Paulo,
considerada, até 1994, como a maior do Brasil em termos de número de lojas, com
cerca de 350 estabelecimentos comerciais espalhados pelo território brasileiro,
reduziu em 1995 para 270 lojas. Só no Sul do país, 15 casas cerraram as portas,
sendo 4 no Rio Grande do Sul e 11 no Paraná e Santa Catarina. Ao mesmo tempo, a
rede Colombo, que inicia nos anos 80 extraordinária arrancada, chegando a um
crescimento médio de 25 novas filiais por ano na referida década, chegando ao
final de 1993 com 212 filiais. Em maio de 1994, quando já havia instalado 220
empresas comerciais, assume o controle de sua principal concorrente
em Porto
Alegre, a J H Santos, que tinha rede com 40 lojas. Assim, a
Colombo torna-se, com o encolhimento da Arapuã e a abertura de novas filiais, a
maior rede do Brasil em número de lojas no ramo de eletrodomésticos com cerca de
280 estabelecimentos até fevereiro de 1995.
Partindo agora para análise de alguns dados macro-regionais de
modernização do setor de supermercados (Tabela 3) com os percentuais de
automatização por lojas, check-outs, área de vendas e número de funcionários
proporcionalmente ao número de redes em cada região do país. Verifica-se que o
Sul, em todos os índices, foi superior às outras regiões, sendo mesmo superior
ao Estado de São Paulo em praticamente todos os percentuais, ficando abaixo
somente no item lojas automatizadas por funcionários com a cifra de 30% e São
Paulo 33%.
Tabela
3
Total Geral de
Lojas Automatizadas nas Regiões Brasileiras
Matriz
Região |
Lojas |
Check-outs |
Área vendas
(m2) |
Funcionários |
Total |
Lojas
autom. |
% |
Total |
Lojas
autom. |
% |
Total |
Lojas
autom. |
% |
Total |
Lojas
autom. |
% |
SP |
397 |
78 |
20 |
5.817 |
1.756 |
30 |
586.303 |
175.986 |
30 |
41.878 |
13.727 |
33 |
RJ, MG,
ES |
188 |
29 |
15 |
4.184 |
1.001 |
24 |
430.139 |
124.154 |
29 |
32.492 |
7.511 |
23 |
PR, SC,
RS |
155 |
34 |
22 |
2.384 |
738 |
30 |
219.811 |
77.860 |
35 |
17.478 |
5.350 |
30 |
Norte/Nordeste |
195 |
25 |
13 |
2.363 |
767 |
32 |
245.101 |
77.366 |
32 |
18.857 |
5.215 |
28 |
Total
Brasileiro |
936 |
167 |
18 |
14.758 |
4.272 |
29 |
1.482.854 |
456.866 |
31 |
110.806 |
31.904 |
29 |
Fonte: Revista de
Automação Comercial
Com
base nessas breves considerações que, a princípio, pode-se considerar
desenvolvimento do comércio no Brasil Meridional não complementar, não
periférico ao Centro-Sul, mas sim concorrencial à medida que os capitais
regionais pouca chance dão à expansão dos capitais extra-regionais. Daí a
fraqueza da presença de capitais comerciais de São Paulo e do Rio de Janeiro no
Sul muito diferente do quadro do Brasil-Central onde os capitais paulistas
exercem amplo controle. Quanto ao Nordeste, pelo fato de o mercado ser muito
fraco, as redes paulistanas e cariocas pouco se interessaram em estabelecer suas
filiais comerciais, salvo nas capitais estaduais.
Referências
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WAIBEL.
Leo.
Princípios da colonização européia no Sul do Brasil. In: Revista Brasileira de
Geografia. Ano 80. Número especial. Rio de Janeiro: IBGE, 1988 .
WAIBEL (1988: 219) afirma que a colonização do Paraná é
diferente, em origem e composição, da dos outros estados. Em primeiro lugar o
litoral do Paraná é estreito e ter um clima insalubre de tierra caliente.
Aí foram fundadas algumas colônias italianas na década de 1870, mas não
prosperaram. Em segundo lugar, a serra cristalina do Paraná é estreita e suas
encostas são tão íngremes que oferecem pouco espaço para a colonização.
Ponencia
presentada en el XII Encuentro Internacional Humboldt "El Capitalismo como
Geografía", La Rioja, Argentina - 20 al 24 de setiembre de 2010.