OS
DESLIZAMENTOS DE ENCOSTAS NAS FAVELAS
EM
ÁREAS DE RISCO DA “SUÍÇA BRASILEIRA”
THE LANDSLIDES OF HILLSIDES IN THE SLUM QUARTERS
IN THE AREAS OF RISK OF “BRAZILIAN
SWITZERLAND”
Artur
Rosa Filho 1
Ana
Tereza Caceres Cortez 2
1-Faculdade de Educação/ISE-UNIVAP-São José
dos Campos-SP-; Rua Tertuliano Delfim Jr, 181 - Jd. Aquarius- São José dos Campos - SP Cep: 12246-001-
2- Dpto de
Geografia-IGCE-Unesp-Rio Claro-SP- Rua 10, 2527 - Bairro Santana - Rio Claro
- SP - Cep 13500-230.
RESUMO
Nas
últimas décadas, os deslizamentos de encostas têm aumentado consideravelmente,
principalmente nos países subdesenvolvidos. Os movimentos gravitacionais de
massa são agravados em função da construção de habitações em encostas
acentuadas, alterando a paisagem urbana. O objetivo geral desta pesquisa é
realizar um estudo, através de uma abordagem perceptiva, sobre os deslizamentos
de encostas nas favelas Britador e Vila Santo Antônio em Campos do Jordão-SP.
Além dessas duas favelas, Campos do Jordão possui mais três favelas em situação
de risco considerado alto: Vila Albertina, Monte Carlo e Cachoeirinha. Nestas
cinco favelas residem cerca de 1.200 pessoas. Entende-se que essas favelas
configuram-se sob a lógica da urbanização brasileira, como áreas de segregação
sócio-espacial, representativas das periferias das cidades brasileiras. A
percepção geográfica dos deslizamentos de encostas no município de Campos do
Jordão fundamentou-se na procura de respostas humanas ao problema. A abordagem
perceptiva dada nesta pesquisa poderá contribuir para a adoção de estratégias
junto ao poder público municipal, bem como na tomada de consciência dos sujeitos
que moram nas favelas aqui estudadas sobre os deslizamentos de encostas. Esse
estudo partiu do pressuposto de que as pessoas ao morarem em áreas de risco,
ficam vulneráveis aos deslizamentos e colocam-se à mercê do acaso e nem a
experiência adquirida com os deslizamentos anteriores, não os livra da exposição
e das tragédias que um novo deslizamento pode
provocar.
Palavras chaves: Percepção, Favelas, Áreas de Risco,
Deslizamentos de Encostas.
ABSTRACT
In the last decades, landslides along hillsides have
increased considerably, especially in under-developed countries. The
gravitational movements of land masses are worsened due to the constructions of
habitations on steep hillsides, and so altering the urban scenery. The general
objective of this research is to carry through
a study on the landslides of hillsides in the slum quarters Brtitador and Vila
Santo Antonio located in Campos do Jordão-SP. Besides these two slums,
Campos do Jordão has three other slums witch
are believed to be in high risk areas: Vila
Albertina, Monte
Carlo and Cachoeirinha, around 1200 people reside in this
five slums. Its understood that these slums are of Brazilian urbanization are
areas of social space segregation, and representations of the outskirts of
Brazilian cities.The Geographic awareness of the landslides along the hillsides
in the city of Campos do Jordão was founded due to the search of human answers
to the problem. The perceptive approach given in this research will not only
contribute to the adoption of strategies which could be made by the city’s
public council, but also to the acknowledgement by the individuals who dwell in
this slums in relation to the landslides which take place along these
hillsides.This study get started due to the presupposition that the people
living in these areas of risk , are vulnerable to landslides and put themselves
to the mercy of luck, and not even the experience acquired in past landslides
will free them from the exposition to tragedy that a new landslides can brig
about.
Key-Words: Perception, Slums, Risk Areas,
Landslides
INTRODUÇÃO
Os deslizamentos de
encostas têm aumentado consideravelmente nas últimas décadas, principalmente nos
centros urbanos dos países denominados emergentes, onde esses movimentos de
massa são agravados em função da urbanização intensa e da construção de
residências em encostas acentuadas.
Esses deslizamentos
constituem riscos da natureza, que provocam conseqüências graves como, por
exemplo, o bloqueio de vias de circulação, o soterramento de casas e,
conseqüentemente, a ocorrência de vítimas fatais. Além disso, provocam diversos
danos ambientais, alterando a paisagem urbana e, com isso, tornando a mesma mais
vulnerável a novas ocorrências. O estudo dos deslizamentos de encostas ganhou
maior ênfase em meados do século XX, quando então a Geografia passou a atuar em
mais este campo de
estudo.
Na década de 70, geógrafos como Lívia de Oliveira e outros passaram a
estudar e a considerar a percepção como um dos temas para a avaliação dos riscos
da natureza. Embora os movimentos gravitacionais de massa, os escorregamentos de
encostas e os riscos sejam mais bem explicados pela Geologia, a percepção desses
fatos tem sido estudada com maior freqüência pela Geografia, que também
apresenta condições de entendê-la, o que justifica a realização deste
estudo.
Nesse sentido, o objetivo
geral desta pesquisa é realizar um estudo sobre os deslizamentos de encostas nas
favelas Britador e Vila Santo Antônio localizadas em Campos do Jordão-SP.
O conjunto desses estudos,
sob o ponto de vista da sociedade urbana de Campos do Jordão, permitirá a
elaboração de uma crítica mais consistente sobre as precárias condições de
moradia e o baixo padrão de vida dos moradores residentes nas favelas Britador e
Santo Antônio, localizadas em áreas de risco.
Esse estudo partiu do
pressuposto de que as pessoas, que sem opções na escolha do local de moradia,
acabam tendo que morar em áreas de risco, ficam vulneráveis aos escorregamentos
de encostas e colocam-se à mercê do acaso. Não sabendo quando irá acontecer um
deslizamento, ficam despreparadas para a ocorrência do fato. Além disso, essas
pessoas possuem pouca informação e poucos recursos quando se deparam com um
escorregamento. Somente a experiência adquirida com os escorregamentos
anteriores não os livra da exposição e das tragédias que um novo escorregamento
pode provocar.
Entretanto, embora vivendo
em áreas de risco de deslizamento os moradores das favelas Britador e Santo
Antônio permanecem no local, sendo possível identificar em suas percepções o
seguinte: a) não têm para onde ir; b) não têm condições de pagar aluguel; c) já
vivem nas encostas há muito tempo, possuindo raízes históricas no local; d)
pensam sempre que o risco ocorre com o outro e nunca consigo
mesmo.
O que se percebe então é
que os moradores das favelas não ignoram o risco, mas permanecem no local,
sobretudo pela imposição do quadro econômico com o qual lidam, e, também, devido
a laços afetivos que mantêm com o lugar.
Em Campos do Jordão, a
implantação de urbanizações extensas, num planalto inadequado, resultou em
problemas que se manifestaram, seja ao nível da qualidade ambiental, seja por
movimentos de terra, em riscos reais para a população.
O crescimento do núcleo
urbano seja através de sua população permanente, seja pela demanda gerada pela
população flutuante, consolidou algumas características de padrões de ocupação,
basicamente a expansão da malha urbana e o adensamento dos bairros de padrão
mais baixo.
Apesar da incerteza dos
riscos, a ocorrência de deslizamentos de encostas concentra-se mais na época
chuvosa, o que caracteriza um período de alerta para todos os
moradores.
Esse período, que se
estende de dezembro a março, contrasta com o período de estiagem e calmaria
relativa, que se estende de abril a novembro. Apesar dos riscos estarem
presentes por quase todo o município, eles acham-se mais concentrados nas
favelas localizadas nas encostas de alta declividade, como Britador e Santo
Antonio, onde vive uma população numerosa.
Através dos resultados da
pesquisa, este trabalho busca oferecer ao poder público municipal a percepção
geográfica dos deslizamentos de encostas dos moradores das favelas Britador e
Vila Santo Antônio, no sentido de contribuir para a busca de soluções para o
problema, além de estimular novos estudos sobre o tema.
Conhecida por muitos como a “Suíça brasileira”, Campos do Jordão, com
cerca de 45.000 habitantes, além de belos bairros residenciais, onde são
construídos palacetes pelas elites, tem também o seu lado triste, onde reina a
miséria, a fome e o desemprego.
Suas favelas abrigam muitas pessoas, entre crianças e adultos, que
necessitam, principalmente na época do frio, da nossa compreensão e ajuda
material. De acordo com Oliveira
(1991), aproximadamente 56% da população encontram-se na condição de favelados.
Para ele, antigamente, o povoamento das favelas em Campos do Jordão estava
associado aos migrantes em busca de trabalho, mas a partir dos anos 80, o
crescimento passou a estar relacionado mais diretamente com as demandas
requeridas pela economia.
As favelas em Campos do Jordão surgiram na década de 1940. Mas foi a
partir dos anos 70 que tiveram início as grandes invasões nas áreas verdes,
áreas de lazer dos loteamentos e áreas particulares, todas nos morros da
cidade.
Muitos
imóveis nos bairros de Vila Albertina, Morro das Andorinhas, Britador, Vila
Santo Antonio, Vila Maria e outros locais foram ocupados com o incentivo de
autoridades que deveriam ter coibido essas ações. Sérios e fatais deslizamentos
ocorreram e dezenas de vidas foram perdidas no bairro da Vila Albertina nos anos
de 1972 e 2002.
A figura 1 mostra os escorregamentos ocorridos na favela
V. S. Antônio em janeiro de 2000.
FIGURA 1:
Escorregamento ocorrido na V.S.Antônio em janeiro de 2000.Fonte: Sidnei
Silva.
Em
um levantamento realizado em dezembro de 2000, o Instituto de Pesquisa
Tecnológica, (IPT), apontou Campos do Jordão como uma cidade que possui mais
áreas de risco de desabamentos na faixa entre alto e muito alto. Nesse levantamento constatou-se que uma
população de 7000 pessoas e 1500 casas estavam sujeitas a acidentes. As áreas
identificadas estão no Morro do Britador, Vila Albertina, Santo Antonio, Vila
Nadir, Sodipe e Paulista Popular.
As favelas no
Brasil
As favelas
surgiram na paisagem urbana no final do século XIX, contudo, somente nos anos
30, elas começaram a marcar o espaço e a trajetória das cidades. As favelas em
seu processo de organização espacial, ao se localizarem em encostas devastam
florestas; em mangues, os transformam em pântanos; nas várzeas dos rios, alteram
o seu equilíbrio, poluem as águas e, principalmente, conduzem à degradação das
condições de existência de grandes segmentos populacionais, inclusive a da
própria população favelada.
O Brasil
terminou o século XX com 3.905 favelas, segundo reportagem da Folha de São Paulo
de 07/01/01-C5, um aumento de 22,5% desde o censo de 1991. O Estado de São
Paulo, com 1.548 favelas foi o Estado que mais teve esse aumento, concentrando
cerca de 39,6% desse universo.
Segundo o Estatuto da Cidade (2001) a rápida urbanização pela qual passou
a sociedade brasileira foi certamente uma das principais questões sociais
experimentadas no país no século XX. Enquanto em 1960, a população urbana representava
44,7% da população total - contra 55,3% de população rural; dez anos depois essa
relação se invertera, com números quase idênticos: 55,9% de população urbana e
44,1% de população rural. No ano 2000, 81,2% da população brasileira vivia
em cidades.
Essa transformação, já imensa em números relativos, torna-se
ainda mais expressiva se pensarmos nos números absolutos, que revelam também o
crescimento populacional do país como um todo: nos 36 anos entre 1960 e
1996, a
população urbana aumentou de 31 milhões para 137 milhões, ou seja, as cidades
receberam 106 milhões de novos moradores no período.
Para
Gonçalves (1995), o Estado investe prioritariamente na criação da
infra-estrutura de transportes, comunicações e energia, secundarizando
investimentos sociais em habitação e saneamento básico, fazendo com que as
cidades encenassem o triste espetáculo da favelização.
“O pleno exercício do direito a cidades sustentáveis compreende condições
dignas de vida, de exercitar plenamente a cidadania e os direitos humanos
(direitos civis e políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais), de
participar da gestão da cidade, de viver numa cidade com qualidade de vida, sob
os aspectos social e ambiental”. (Estatuto da
Cidade-2001)
A Tabela 1 mostra o crescimento das favelas nos principais municípios
brasileiros no último censo realizado em 2001. Nela observamos um aumento de
cerca de 20% das favelas no período de 1991 a 2000. Guarulhos foi o município
que apresentou o maior aumento no número de favelas, de 64 passou para 136, um
aumento de mais de 100% em suas favela.
Tabela 1- Listagem dos 15 municípios brasileiros com
maior número de favelas, segundo dados dos censos de 1991 e
2000.
Listagem dos 15 Municípios Brasileiros com maior número de
Favelas, segundo dados dos Censos de 1991 e de
2000. |
|
|
|
Municípios |
Número de favelas em
1991 |
Número de favelas em
2000 |
São Paulo |
585 |
612 |
Rio de Janeiro |
462 |
513 |
Fortaleza |
154 |
157 |
Guarulhos |
64 |
136 |
Curitiba |
87 |
122 |
Campinas |
74 |
117 |
Belo Horizonte |
101 |
101 |
Osasco |
95 |
101 |
Salvador |
70 |
99 |
Belém |
20 |
93 |
Diadema |
80 |
89 |
Volta Redonda |
42 |
87 |
Teresina |
44 |
85 |
Porto Alegre |
69 |
76 |
Recife |
62 |
73 |
|
Total em 1991= 2005 |
Total em 2000=
2461 |
Fonte: Nogueira (2002)
Org. Rosa Filho, 2005
Campos do Jordão: Características Gerais e
Localização
O município de Campos do
Jordão, com cerca de 269 km² localiza-se numa das áreas de interesse especial do
Estado de São Paulo: o planalto que se desenvolve no reverso da Serra da
Mantiqueira, elevando-se em escarpa abrupta sobre o Vale do Paraíba, que desce
suavemente em direção ao Estado de Minas Gerais. Limita-se com os municípios de
São Bento do Sapucaí, Santo Antônio do Pinhal, Guaratinguetá e Pindamonhangaba,
em São
Paulo, e com os municípios de Piranguçu, Wenceslau Brás e
Delfim Moreira, em Minas
Gerais.
Ocupação de Encostas no Município de Campos do
Jordão-SP
O Planalto de Campos do
Jordão, onde se situa a cidade de Campos do Jordão, é um dos planaltos
cristalinos que constituem o Planalto Atlântico no Estado de São Paulo. O Planalto de Campos do Jordão
apresenta terrenos dissecados e tectonicamente elevados em cotas
topográficas superiores a 1.600 metros de altitude. Nas
figuras 2 e 3 observamos a mesma favela: o Britador. Primeiro no evento ocorrido
em janeiro de 2000, e em seguida, cinco anos depois em julho de 2005.


As favelas
Santo Antônio e Britador atingidas pelos escorregamentos em 2000, e onde
ocorreram os acidentes mais graves, constituem as porções de encosta nas quais
predominam declividades superiores a 30 graus. Nesses trechos, houve uma grande
concentração de rupturas de grande extensão e alta energia de deslocamento e
impacto destrutivo. Os terrenos ainda não ocupados e que apresentam um
predomínio de encostas com declividade natural superior a 30 graus são,
portanto, bastante suscetíveis à ocorrência desses processos de instabilização
de encostas.
Para Souza Júnior (2002),
são nos bairros populares que a situação se apresenta mais graves, pois o
pequeno tamanho dos lotes leva a um processo altamente adensado de ocupação do
solo, com a sua conseqüente fragilização e desestruturação. As ruas têm grande
declividade, o que leva à formação de enxurradas perigosas, ainda mais porque
elas são, muitas vezes, de terra batida.
No caso de ocupações
extensas, associadas a assentamentos espontâneos, o risco de ocorrência de
acidentes de escorregamentos tem se mostrado historicamente elevado. São
freqüentes as ocorrências de rupturas de solo mobilizando volumes variados de
material em taludes de corte e aterro associados a eventos de chuva com tempo de
retorno relativamente não tão alto. Seriam eventos chuvosos associados a
acumulados de chuva de três dias entre 100 e 150 mm.
O acidente de
escorregamentos ocorrido no início de 2000 foi deflagrado por um evento chuvoso
de abrangência regional, atingindo diversos municípios na região do Vale do
Paraíba e Serra da Mantiqueira. Além dos escorregamentos, enchentes e inundações
causaram transtornos e sérios danos materiais nos municípios paulistas e também
em localidades no sul de Minas Gerais.
As Favelas,
“vilas operárias” de Vila Albertina, Vila Santo Antônio, Britador, Jardim das
Andorinhas, Vila Paulista Popular, Vila Nadir e Vila Sodipe: Características
Gerais.
Em Campos do Jordão, as favelas, também conhecidas como Vilas Operárias,
Vila Santo Antônio, Morro do Britador, Jardim das Andorinhas, Vila Albertina,
Vila Sodipe, Vila Nadir e Vila Paulista Popular, localizadas nas adjacências da
região central da cidade e caracterizadas por ocupação de encostas, foram
severamente atingidas pelos escorregamentos ocorridos em janeiro de 2000 e
constituem a maior parte das áreas de grau de risco alto na cidade de Campos do
Jordão.
Para o IPT (2002), em
Campos do Jordão, o problema habitacional para a população local de baixa renda
é semelhante a outras localidades urbanas brasileiras, haja vista a carência
nacional de ofertas efetivas de habitação popular. No caso específico da cidade
de Campos do Jordão, o problema habitacional incorpora outras desvantagens
importantes, como as condições adversas do meio físico e a especulação
imobiliária decorrente do turismo de alto poder aquisitivo.
Segundo o IPT (2002), os
acidentes de escorregamentos em Campos do Jordão são fortemente induzidos pelas
intervenções humanas, apesar do pano de fundo geológico e geomorfológico
responsável pela topografia acidentada e pela dinâmica energética dos processos
geológicos superficiais.
Por essa razão, a mudança
dos padrões atuais da forma de uso e ocupação dos terrenos a ser ditada pelo
poder público municipal deve propiciar melhorias na segurança e qualidade de
vida de parcela significativa da população jordanense que habita os morros da
cidade.
Riscos da
Natureza
Tendo-se em conta a dificuldade para a obtenção de definições universais
e, principalmente, que as noções de acidente e risco variam de local para local
em função de parâmetros culturais, sociais e econômicos, o IPT adota como
referencial geral os seguintes conceitos:
Acidente - Acontecimento calamitoso, em que foram
registradas perdas sociais e prejuízos econômicos.
Evento -
Acontecimento em que não foram registradas perdas sociais e prejuízos
econômicos.
Perigo - Ameaça potencial a pessoas ou bens.
Risco
- Possibilidade de eventos perigosos produzirem conseqüências indesejáveis.
É o perigo pressentido, mais avaliado, isto é, uma perda potencial avaliada.
No âmbito internacional e nacional têm-se adotado também as denominações
de "risco atual" e "potencial". O risco
atual corresponde ao risco instalado em áreas ocupadas e aponta os locais
que devem receber prioritariamente as medidas estruturais e não-estruturais
voltadas à redução desses riscos. O risco potencial caracteriza os terrenos
quanto à sua suscetibilidade para geração de novas situações de risco em áreas
ainda não intensamente ocupadas, fornecendo subsídios para a expansão e o
adensamento das diferentes formas de uso do solo.
RISCOS
GEOLÓGICOS
No Brasil, os acidentes geológicos registrados associam-se,
principalmente, a processos exógenos (escorregamentos e processos correlatos,
erosão e assoreamento, subsidências e colapsos de solo, solos expansivos) e,
subordinadamente, a processos endógenos (somente
terremotos).
O fenômeno de intensa
urbanização e o agravamento da crise econômica do Brasil tem reduzido as
alternativas habitacionais da população de mais baixa renda, que passou a ocupar
áreas geologicamente desfavoráveis, sem planejamento e infra-estrutura. Esse
quadro tem contribuído para o incremento das situações de risco associadas a
processos do meio físico.
Grande parte dessas
situações está associada aos escorregamentos e processos correlatos. Esses têm
provocado acidentes com graves danos sociais e econômicos em várias cidades,
além de danos diversos em obras civis e lineares (estradas, dutovias etc.) em
diferentes regiões.
No Estado de São Paulo são
significativas as zonas de média, alta e muito alta suscetibilidade a movimentos
gravitacionais de massa, tanto como fenômenos da dinâmica natural de evolução do
relevo ou como processos induzidos pela ocupação. Destacam-se, pela grande
freqüência de acidentes associados a escorregamentos, a região da Serra do Mar
(Baixada Santista e Litoral Norte), a Região Metropolitana de São Paulo e o Vale
do Paraíba, assim como a Serra da Mantiqueira (Campos do
Jordão).
FIGUEIREDO (1994) define áreas de risco como aquelas sujeitas às
ocorrências de fenômenos de natureza geológica-geotécnica e hidráulica que
impliquem na possibilidade de perda de vidas e ou danos materiais. Esses locais
são, predominantemente, ocupações de fundo de vales sujeitos a inundações e
solapamento, ou encostas passíveis de escorregamentos e desmoronamentos devido
às altas declividades.
Para TORRES & COSTA (2000), a idéia de risco implica, por exemplo, a
existência de um agente ameaçador e de um agente receptor da ameaça. Nesse
sentido, riscos ambientais são muitas vezes espacialmente distribuídos:
determinadas áreas próximas a fábricas são mais poluídas que outras mais
distantes; enchentes ocorrem normalmente em várzeas e em áreas onde a drenagem é
insuficiente.
E
concluem dizendo que características do mercado de terras, por exemplo, fazem
com que áreas de risco (próximas a lixões, sujeitas a desmoronamentos) sejam as
únicas áreas acessíveis a grupos de renda mais baixa, que acabam por construir
nesses locais domicílios em condições precárias, além de enfrentar outros
problemas sanitários e nutricionais.
Registros de Acidentes Associados
a |
|
Escorregamentos no Brasil:
1928-2005 |
|
Local |
Data |
N° de Mortes |
Santos (SP) |
Março de 1928 |
80 |
Vale do Paraíba do Sul
(MG/RJ) |
Dezembro de 1948 |
250 |
Santos (SP) |
Março de 1956 |
64 |
Santos (SP) |
Fevereiro de 1959 |
5 |
Rio de Janeiro (RJ) |
1966 |
100 |
Caraguatatuba (SP) |
Março de 1967 |
120 |
Serra das Araras (RJ) |
Janeiro de 1967 |
1700 |
Salvador (BA) |
Maio de 1969 |
15 |
Salvador (BA) |
Abril de 1971 |
10 |
Campos do Jordão (SP |
Agosto de 1972 |
10 |
Estância Velha (RS) |
Julho de 1973 |
10 |
Maranguape (CE) |
Abril de 1974 |
12 |
São Gabriel (SC) |
Março de 1974 |
15 |
Caruru (SC) |
Março de 1974 |
25 |
Santos (SP) |
Dezembro de 1979 |
13 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Dezembro de 1982 |
6 |
São Paulo (SP) |
Junho de 1983 |
8 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Março de 1983 |
5 |
São Leopoldo (RS) |
Agosto de 1983 |
6 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Outubro de 1983 |
13 |
Salvador (BA) |
Abril de 1984 |
17 |
Angra dos Reis (RJ) |
1985 |
5 |
Arame (MA) |
Fevereiro de 1985 |
20 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Março de 1985 |
23 |
Salvador (BA) |
Abril de 1985 |
35 |
Vitória (ES) |
1985 |
93 |
Lavrinhas (SP) |
Dezembro de 1986) |
11 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Março de 1986 |
12 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Fevereiro de 1988 |
82 |
Ubatuba (SP) |
Fevereiro de 1988 |
6 |
Cubatão (SP) |
Janeiro de 1988 |
10 |
Petrópolis (RJ) |
Fevereiro de 1988 |
171 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Junho de 1989 |
9 |
São Paulo (SP) |
Março de 1989 |
6 |
Recife (PE) |
Junho de 1989 |
8 |
São Paulo (SP) |
Outubro de 1989 |
14 |
Salvador (BA) |
Junho de 1989 |
31 |
Salvador (BA) |
Maio de 1989 |
67 |
Recife (PE) |
Junho de 1990 |
5 |
Recife (PE) |
Julho de 1990 |
10 |
São Paulo (SP) |
Outubro de 1990 |
10 |
Blumenau (SC) |
Outubro de 1990 |
14 |
São José (SC) |
Novembro de 1991 |
5 |
Teresópolis (RJ) |
Março de 1991 |
6 |
Petrópolis (RJ) |
Janeiro de 1992 |
6 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Março de 1992 |
7 |
Corumbá (MS) |
Março de 1992 |
9 |
Belo Horizonte (MG) |
Jan/Fev de 1992 |
10 |
Salvador (BA) |
Março de 1992 |
11 |
Contagem (MG) |
Março de 1992 |
36 |
Belo Horizonte (MG) |
Dezembro de 1993 |
5 |
Petrópolis (RJ) |
Março de 1994 |
6 |
Camaragibe (PE) |
Março de 1994 |
6 |
Recife (PE) |
Junho de 1994 |
8 |
Salvador (BA) |
Abril de 1994 |
10 |
Salvador (BA) |
Junho de 1995 |
58 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Fevereiro de 1995 |
5 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Fevereiro de 1996 |
59 |
São Paulo (SP) |
Dezembro de 1996) |
5 |
Salvador (BA) |
Março de 1997 |
9 |
Camacã (BA) |
Novembro de 1998 |
5 |
Salvador (BA) |
Maio de 1999 |
8 |
Campos do Jordão (SP |
Janeiro de 2000 |
10 |
Rio de Janeiro (RJ) |
Janeiro de 2000 |
13 |
São Paulo (SP) |
Fevereiro de 2000 |
13 |
Recife (PE) |
Julho de 2000 |
6 |
Dom Joaquim (MG) |
Janeiro de 2002 |
5 |
Estado do Rio de Janeiro |
Janeiro de 2003 |
35 |
Visconde do Rio Branco (MG) |
Janeiro de 2003 |
1 |
Estado de São Paulo |
Janeiro de 2004 |
27 |
São Bernardo do Campo (SP) |
Julho de 2004 |
3 |
São Bernardo do Campo (SP) |
Janeiro de 2005 |
9 |
|
|
Total de mortes:
3522 |
Com este trabalho
pretendemos, realizar um estudo sobre os deslizamentos de encostas nas favelas,
em áreas de risco no município de Campos do Jordão-SP,.onde destacamos as
favelas Britador e Vila Santo Antônio como objetos desse estudo topofílico,
enfocando a percepção e a atitude dos sujeitos em relação aos riscos da
natureza, por serem estas as áreas de maior risco de escorregamentos na referida
cidade.
Entendemos que essas
favelas configuram-se, sob a lógica da urbanização brasileira, como áreas de
segregação sócio-espacial, representativas das periferias das cidades turísticas
e/ou industriais.
Ao analisar a questão
inicial, por que essa população não deixa as áreas de risco, mesmo sabendo do
perigo, levantamos a priori, que a principal dificuldade em sair da área está na
decorrência da falta de outras perspectivas de lugar de moradia. Somamos a esta
hipótese inicial, outras reveladas pelo trabalho de pesquisa.
As condições precárias de
submoradias e o baixo padrão de vida dos moradores dessas duas favelas decorrem,
quase sempre, do baixo padrão de remuneração que obtêm em subempregos, da
localização das favelas, localização esta em relação à acessibilidade social, ou
seja, aos “benefícios” urbanos e, ainda, das políticas públicas que reiteram a
segregação sócio-espacial no município.
Observamos que essas
pessoas apresentam certa acomodação em relação ao seu local de moradia, chegando
a quase um estado de inércia, o que dificulta a remoção dos mesmos para outras
áreas. Há ainda a percepção do perigo distorcido, ou seja, o morador percebe que
o perigo pode acontecer com o outro e nunca consigo mesmo.
Alem disso, há fatores de
ordem econômica, cultural e histórica que corroboram para esse estado de inércia
desses moradores.
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